Fim da era do betão levou construtoras a apostar no monopólio da agua
Longe vão os tempos em que as obras públicas proliferavam e a indústria da construção estava forte como o betão. Ao aperceberem--se de que os tempos de bonança não duravam para sempre, as grandes construtoras começaram, na última década, a procurar outras áreas de negócio e entraram num sector que durará para sempre, pelo menos enquanto houver humanidade: a água. Nos últimos anos, grandes construtoras como a Mota-Engil, Somague e DST não ficaram de fora e intensificaram a sua presença nesta área.
A coordenadora do Grupo de Trabalho da Água da Quercus explica o porquê do interesse das construtoras no sector: "É um negócio que não desaparece. A água é o negócio do futuro. Como a construção civil não está feliz, esta é uma boa oportunidade para procurarem outros rendimentos." Carla Graça recorda que a água é "um monopólio natural, onde praticamente não há concorrência" e lembra a quase imortalidade desta atividade: "No futuro havemos de conseguir sobreviver sem petróleo, mas sem água não é possível."
A Mota-Engil criou uma sub-holding, a Mota-Engil Ambiente e Serviços que, por sua vez, integra o grupo Indaqua. Embora a Mota-Engil tenha começado logo em 1994 com esta área de negócio, nos últimos anos intensificou a sua presença. Atualmente serve já cerca de 190 mil clientes num universo populacional de 560 mil habitantes, tendo a concessão de sete municípios e a presença numa pareceria público-privada numa empresa municipal.
O CEO do grupo Indaqua, Pedro Montalvão, diz que a empresa continua a acreditar no potencial deste sector, embora destaque que este é "para corredores de fundo, não para sprinters". Pedro Montalvão faz um balanço económico-financeiro deste negócio, explicando que "de uma forma geral, com exceção de algumas situações pontuais que devem ser reequilibradas, as concessões têm um valor razoável, mas são um negócio com retorno a muito longo prazo". Em 2012, por exemplo, a concessão do grupo que teve resultados mais positivos foi a de Trofa/Santo Tirso, com um lucro de 486 mil euros. Mas, num outro extremo, a Indaqua Matosinhos deu um prejuízo de 1,2 milhões de euros.
O presidente da DST, José Teixeira, também explicou ao DN que aquilo que fez a sua empresa entrar nesta área foi "olhar para o futuro". "Há 12 anos, o que pensámos foi: o que vai ser gerido no futuro? O negócio da construção vai girar em torno do quê? E percebemos que o futuro é a sustentabilidade e que tínhamos de entrar na cadeia de valor para não estarmos dependentes de obra pública."
A empresa teve assim consciência de que o tempo das grandes obras públicas estava a chegar ao fim. José Teixeira acredita que este é um negócio "claramente para crescer" e que a "descarbonização da economia vai ser uma grande oportunidade" para as empresas portuguesas.
Embora a DST espere que o negócio seja ainda mais rentável no futuro, este já dá frutos no imediato. Prova disso é a Aquapor, empresa vendida pelo grupo Águas de Portugal ao consórcio DST/ABB. "Pagámos 60 milhões de euros pela Aquapor que durante 12 anos deu prejuízo. Toda a gente disse na altura que demos um prémio muito alto, mas no ano passado já tivemos lucros, depois de impostos, de oito milhões de euros", revela o presidente da DST.
A Somague - outra das construtoras com um historial de obras públicas do País - também se empenhou neste negócio através da AGS (Administração e Gestão de Sistemas de Salubridade), que serve hoje cerca de 1,3 milhões de habitantes na área do saneamento e cerca de 110 mil no abastecimento de água. Hoje, o negócio destas empresas é muito mais do que construção civil.