"Felizes aqueles que tiveram oportunidade de ver o seu talento"

António Simões, Toni e José Augusto, que o defrontaram em campo, recordam a arte dentro e fora do relvado do génio holandês
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A morte de Johan Cruijff ontem aos 68 anos deixou em choque o mundo do futebol. "Perdemos, e ultimamente tem acontecido com alguma frequência, mais um rei. Como jogador foi exatamente um rei. Poucos existiram e já poucos restam. Mas este senhor foi também um general do futebol, tinha uma patente enorme como treinador do jogo bem jogado. Foi um dos homens que mais criaram, mais descobriram e inovaram na forma de jogar e ensinar bem", começou por dizer ao DN António Simões, um dos heróis da seleção portuguesa que estiveram no Mundial de 1966 e que defrontaram o genial holandês ao serviço do Benfica em 1969, numa segunda eliminatória da Taça dos Campeões, na qual os holandeses do Ajax acabaram por levar a melhor no jogo de desempate - Cruijff marcou duas vezes na Luz (onde os lanceiros igualaram o triunfo por 3-1 obtido pelos encarnados em Amesterdão) e uma em Paris, abrindo o score no prolongamento para o 3-0 final.

"É uma grande chatice quando esta gente se zanga no jogo. Ele resolveu zangar-se, infelizmente para nós... Mas com tanta arte e tanto talento que quem gosta de futebol só tem de lhe perdoar. Era um revolucionário. Lembro-me de termos jogado um particular com o Ajax quando ele tinha 17 ou 18 anos e, ao trocar impressões com o Eusébio, disse-lhe: "Atenção, que este vai dar que falar, vai ser do diabo". Era um jovenzinho que tinha aparecido nas escolas do Ajax e que nasceu com e para o futebol", acrescentou Simões.

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À frente do seu tempo
Também Toni se cruzou por essa altura com o craque holandês. "É mais uma lenda que desaparece e que deixou marca pelo perfume do seu futebol, pela sua qualidade técnica, pelos dribles, pelos golos e pelos passes para golo. Felizes aqueles que tiveram oportunidade de ver o seu talento em campo", referiu o ex-jogador e treinador do Benfica, recordando as vezes em que se cruzou com ele em campo:
"Defrontei-o em 1969 e em 1972. Já nesses primeiros jogos, ainda novo, demonstrava todo o seu talento. Ele não foi um príncipe, foi um rei, e esse talento manifestou--se muito cedo. Além disso, como treinador esteve sempre à frente do seu tempo e é o pai de muito daquilo que é o Barcelona de hoje."
Já José Augusto, outro "magriço", recorda ter conversado "uma ou duas vezes" com o antigo técnico do Barcelona. "Foi sempre uma figura simpática, além de ter sido um grande jogador de futebol, dos melhores adversários que defrontei. Era um jogador extraordinário, tinha um faro nato pelo golo, o que o tornou uma grande figura do futebol mundial", referiu, antes de acrescentar que Cruijff como treinador "marcou uma época, apesar de não ter exercido durante muito tempo": "Era um tipo independente, com uma personalidade forte."

Simões, que acabou por conviver mais de perto com Cruijff, falou também da pessoa. "Tive oportunidade de o conhecer melhor num curso que ele fez em Portugal e até recebi um prémio das suas mãos em Amesterdão. Embora de poucas palavras, sabia rir. Não era muito expressivo, mas era de afetos. Percebi que gostava de falar das coisas que fez e conseguiu, porque tudo aquilo tinha muita paixão dentro."

De Figo e Jesus a Maradona
As manifestações de pesar sucederam-se ao longo do dia. Jorge Jesus, que chegou a estagiar com Cruijff no Barcelona em 1993, fala de uma "grande referência em termos de arte e criatividade do jogo": "Mas o que me fez criar uma enorme estima por ele foi a ideia de jogo que tinha como treinador do Barcelona. Via o futebol de forma diferente da maior parte das pessoas. Não chegava ganhar, a equipa tinha de dar espetáculo. Também fui influenciado por essa ideia. Sou um grande defensor dessa ideia. Mas Cruijff só há um. Era uma grande figura, um dos grandes mentores e criadores do que é o futebol moderno."

Luís Figo, que chegou ao Barcelona pela mão de Cruijff, recordou o seu "primeiro treinador" no estrangeiro e "um dos melhores" que teve. Também Dani, que representou o Ajax, se mostrou "muito sensibilizado". Em declarações ao MaisFutebol, recordou que vestiu a mítica camisola 14 a pedido do próprio: "Disse que era parecido com ele na forma como eu jogava, como corria, como driblava, até pelo facto de sermos ambos altos e magrinhos."

Entre os maiores da história, Franz Beckenbauer mostrou-se "chocado" por ter perdido alguém que era "como um irmão", enquanto Diego Maradona garantiu: "Nunca te esqueceremos, Flaco."

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