Fechou uma universidade por ano na última década
Falta de viabilidade económica e financeira, perdas mensais de largos milhares de euros, degradação pedagógica, reduzido número de doutorados, cursos com escasso número de alunos. São razões transversais à maioria dos estabelecimentos que fecharam as suas portas. Na última década foram nove as instituições que viram a sua atividade chegar ao fim, sete delas entre 2007 e 2010. Todas receberam ordem de "encerramento compulsivo", em despacho assinado por Mariano Gago, o então ministro do Governo de José Sócrates com o pelouro do Ensino Superior.
A Universidade Internacional da Figueira da Foz e o Instituto Superior Politécnico Internacional foram as últimas a fechar (no final do ano letivo de 2009/2010). Juntaram-se à Universidade Internacional de Lisboa, que conhecera esse mesmo destino meses antes, ao Instituto Superior de Informática e Gestão, ao Instituto Superior de Administração, Comunica- ção e Empresa, à Universidade Moderna (alvo de processo judicial (ver edição do último domingo) e à Universidade Independente (onde Sócrates concluiu a licenciatura em Engenharia Civil).
A viragem do século foi, de facto, dramática para as privadas, que perderam três instituições de peso (Internacional, Independente e Moderna). Este processo de agonia das instituições, que obriga os alunos a transferirem-se para outros estabelecimentos - por norma, o Ministério da Educação reconhece os estudos já realizados e os despachos de encerramentos verificam-se antes do ano letivo começar -, foi "inaugurado", no pós-25 de Abril, pela Universidade Livre (UL).
A instituição, onde a atual ministra da Justiça se formou e chegou a lecionar, fechou em 1986, deixando para trás uma história pioneira e de mudança do ensino privado. "A Universidade Livre está na origem do sistema Universitário não público em Portugal", defende Adriano Moreira, antigo presidente do Conselho Nacional de Avaliação do Ensino Superior, que pertencia ao grupo de professores que arrancou com o projeto.
Nascida num período de mudança social, após a revolução de abril, a Universidade Livre é criada sem qualquer contexto legal, mas o seu desenvolvimento acaba por forçar o Governo a avançar com legislação para o ensino superior particular e cooperativo. Leis que seriam determinantes no aparecimento de muitas privadas, ainda hoje em funcionamento.
O grupo académico que formava o quadro de docentes da Livre integrava algumas personalidades ligadas ao anterior regime, que entretanto tinham sido saneadas de instituições públicas, como as faculdades de Direito e Letras da Universidade de Lisboa, e do Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas. Já o grupo empresarial, que constituiu a cooperativa, percebeu que estava perante uma atividade com grande potencialidade económica. E a junção destes dois grupos acabou por estar também na morte daquela universidade, face às lutas internas de poder que se verificaram desde o início da sua atividade.
O conflito institucional não impediu o crescimento. A Livre teve o seu apogeu entre 1981 e 1985, período em que reforçou o estatuto de principal instituição privada do País.
Adriano Moreira atribui parte do sucesso da Livre ao antigo primeiro-ministro Adelino Palma Carlos, o primeiro reitor. "Foi determinante no crescimento da Livre. Tinha grande prestígio como professor e advogado e por isso conseguiu recrutar um número considerável de professores de qualidade. A UL teve uma afluência extraordinária."
Mas as guerras de poder acabaram por afastar muitos professores, que abraçaram outros projetos. João Redondo, presidente da Associação Portuguesa de Ensino Superior Privado, recorda que "as três primeiras universidades [Lusíada, Portucalense e Autónoma] que nasceram na sequência desta crise surgiram por haver no seio da Livre quem defendesse o propósito mercantilista daquele projeto. O importante nestes projetos não é o lucro". Hoje, João Redondo faz parte de uma das universidades "filhas" da Livre: a Lusíada. Da cisão na UL surgiram ainda a Independente e a Moderna, que entretanto já fecharam.