Esta semana estive de visita a Portugal, onde tenho grandes amigos e me sinto como em casa. O hotel Ritz de Lisboa é melhor do que o de Madrid. Tem um bar muito simpático onde se pode fumar cigarros e charutos, algo proibido em Espanha desde a época do socialista Zapatero. Só por isso e pela sua exuberante coleção de orquídeas merece consideração. A cidade tem excelentes restaurantes, alguns diminutos, como o Solar dos Leitões, situado num bairro pobre onde servem uns salmonetes excecionais, e outros mais bem localizados, mas igualmente orgulhosos de uma oferta surpreendente, como a do Pedro, na Horta dos Brunos, onde exibe uma desnorteante coleção de vinhos, entre eles alguns Madeiras imbatíveis. No entanto, o meu restaurante favorito de Lisboa continua a ser o Farta Brutos, no Bairro Alto. Não só porque ali se prova uma comida tradicional portuguesa muito respeitável - os rins são deliciosos, o coelho também, e o sável... quando está na época - mas também porque tem uma sala muito acolhedora para passar o tempo com os amigos e, sobretudo, para conversar com Oliveira, o proprietário, que é uma pessoa afetuosa que me distingue com a sua atenção e que visito inesperadamente quando estou na cidade somente para tomar uns copos, que nunca me cobra, e conversar sem pressas..Também me sinto em Portugal como em casa porque o país tem um governo socialista que, como é natural da dita inclinação, começou a criar problemas na Europa, e isto é o que com grande probabilidade vai acontecer brevemente em Espanha, pelo que me sinto muito solidário com os meus amigos lisboetas. Bruxelas continua a ser um muro de contenção para as experiências de esquerda, mas isso não evita que tudo se possa ir estragando progressivamente à conta de decisões erradas. De momento, o pressuposto do primeiro-ministro Costa voltará a ser analisado em maio para ver se as dúvidas sobre o seu eventual cumprimento - e os ajustamentos necessários a adotar - se dissiparam. O sistema financeiro português é muito frágil e é muito possível que necessite de uma recapitalização, que apenas poderia ser financiada pelas autoridades comunitárias, também assustadas pelos problemas bancários em Itália. Entretanto, o governo de Lisboa está imerso numa contenda com o banco central do país que é totalmente inconveniente, porque diz muito pouco sobre o respeito devido aos órgãos independentes, por muito discutível que seja a sua atuação. O quadro laboral de Portugal continua a ser demasiado rígido e ineficiente para lutar contra a chaga do desemprego. Enfim, o país encontra-se numa encruzilhada, como demonstra um prémio de risco em ascensão e umas agências de rating cada vez mais desconfiadas, da qual seria um milagre sair-se bem..Os riscos que Portugal enfrenta parecem evidentes para os empresários, para os que têm pequenos negócios, que são a maioria, e para qualquer observador que tenha um pouco de senso comum, mas as classes populares, os cidadãos comuns, têm, de momento, um sentimento diferente. Os funcionários, aos quais foi restituída parte do salário e entre os quais se vai implantar essa aberração que é a jornada de 35 horas semanais, estão encantados. Os pensionistas, aos quais foi subida ligeiramente a prestação, também. As pessoas normais, às quais foi eliminada a sobretaxa do IRS, vivem um momento de uma certa ilusão. Por isso sinto-me em Portugal como em casa. Porque o Partido Socialista, que provavelmente vai governar Espanha, também está a prometer medidas insensatas como aumentar o salário mínimo ou estabelecer um rendimento universal para todas as pessoas, e está decidido a introduzir mais espartilhos no mercado de trabalho reforçando o poder dos sindicatos, dos quais felizmente há tempos que não tínhamos notícias, mas que agora desejam voltar a recuperar um protagonismo completamente inoportuno..Sinto-me em Lisboa como em casa porque há um partido absurdo que se chama Bloco de Esquerda que é semelhante ao Podemos, a formação radical antissistema que é dirigida em Espanha por Pablo Iglesias. E digo que é um partido absurdo porque é bastante incompreensível que quase nas vésperas do centenário da revolução bolchevique ainda haja dirigentes políticos que professem as mesmas ideias - cujo fracasso está provado pela história - e, sobretudo, que haja tantos jovens, supostamente mais bem formados do que nunca, que apostem em receitas antiquadas que passam todas por dar mais poder ao Estado em detrimento da responsabilidade pessoal e da liberdade, que deveriam ser as linhas mestras de qualquer desenvolvimento político e individual. Apesar de a experiência ter validado as políticas que funcionam, um número cada vez maior dos nossos jovens pugna pelas contrárias. A mim parece-me irrefutável que reduzir os impostos sobre os indivíduos e as empresas aumenta os incentivos para trabalhar e investir. Também creio que há que ter as menores regulações possíveis, ou ver-se livre daquelas cujos custos são maiores do que os benefícios que trazem. Creio que abrir os mercados à concorrência internacional é sempre bom e que reformar os programas sociais é o correto se se quiser não só prevenir uma escalada insustentável da dívida como também estabelecer os incentivos oportunos para que os cidadãos deem o melhor de si mesmos e contribuam o mais possível para gerar riqueza em lugar de consumir a gerada pelos mais diligentes e aplicados. Um país onde se assegura o cumprimento dos contratos e se persegue como objetivo a estabilidade monetária e orçamental é um lugar onde as famílias e as empresas podem tomar as suas decisões com segurança, de acordo com um quadro previsível. Um país melhor..Mas temos em Portugal e em Espanha dois partidos gémeos, que são o Bloco de Esquerda e o Podemos, que trabalham por um cenário político diferente. Alternativo. Menos explicitamente no caso dos portugueses, que sempre são mais prudentes, ambos querem acabar com a economia de mercado e reforçar o papel do setor público. Ou seja, estão dispostos a arruinar o país, com a desgraça acrescentada de que têm muitos seguidores e uma capacidade de influência e de intervenção na vida pública mais do que notável. Não sei sinceramente como pudemos retroceder tanto e chegar até aqui, esta espécie de ponto de partida. No caso de Espanha, que é o único lugar de que posso falar com algum conhecimento de causa, creio que a razão é o sistema educativo, dominado desde sempre pela esquerda, ter sido contrário aos valores da concorrência, que tira sempre o melhor de cada um, hostil para com a empresa, que é o baluarte das sociedades, e antagónico às virtudes da disciplina e do sacrifício, que são as que forjam os grandes povos. E assim criámos gerações de jovens irresponsáveis, dependentes do Estado e permanentemente encolerizados com o mundo inteiro. Sobre tudo isto terei de discutir longa e detalhadamente com o Sr. Oliveira, no Farta Brutos, da próxima vez que regressar à minha querida Lisboa.