Falso apedrejamento lança discussão nos media
A lei da concorrência e um mundo cada vez mais acelerado exigem da comunicação social uma resposta à altura. Porém, esta nova realidade leva muitas vezes a erros, que nem as grandes cadeias de televisão parecem conseguir controlar. Foi o que aconteceu com a recente notícia do apedrejamento de uma rapariga síria, a quem foi dado o nome de Fatoum al-Jassem, alegadamente condenada à morte por utilizar o Facebook. A informação, falsa, foi ilustrada com uma imagem do filme The Stoning of Soraya M., de 2008, e divulgada no iReport, a rede social da CNN que permite aos cidadãos publicar conteúdos online.
Pouco tempo depois, a "notícia" foi divulgada pelas edições digitais de vários jornais, como o britânico Daily Mail ou o espanhol ABC, sem que fosse devidamente confirmada, tornando-se na segunda história "mentirosa" a fazer, em pouco tempo, furor no Twitter, Instagram ou Facebook. Isto porque, há uma semana, a fotografia de um rapaz de quatro anos que parecia atravessar sozinho o deserto, em direção à Jordânia, também encheu páginas na internet, ficando-se a saber, mais tarde, que Marwan apenas se tinha desencontrado dos familiares durante a confusão na fronteira.
As notícias fictícias de Fatoum al-Jassem e Marwan exemplificam aquilo a que o norte-americano Dan Gillmor apelidou de "era da confusão informativa", referindo-se à desorientação gerada por uma produção cada vez maior de conteúdos. A este respeito, o diretor de Informação da RTP, José Manuel Portugal, admite ao nosso jornal que "a concorrência e o querer difundir, o mais rapidamente possível, informações que não são confirmadas leva a erros lamentáveis como esses".
Uma tendência que pode ser aproveitada para manipular notícias e, assim, influenciar a opinião pública. No caso da história da mulher apedrejada, que também foi noticiada pela agência iraniana Fars, especialistas em media árabes sugeriram ao Business Insider indiano que a mesma poderá ter sido lançada propositadamente, já que o Irão "tem problemas com o grupo militar acusado da falsa morte".
Matt Dornic, diretor de relações públicas da CNN, recusou responsabilidade por parte da estação norte-americana, que retirou a notícia do iReporter assim que um comentário de um utilizador a deu como falsa e explicou que a imagem pertencia a um título cinematográfico. Em declarações ao site The Blaze, Dornic referiu que tanto a informação como a imagem que a ilustrou não são da autoria de nenhum dos jornalistas da CNN, mas sim de um "repórter virtual", um utilizador do serviço que pode partilhar livremente informações, desde que respeite as condições de utilização do iReport.
Contacto pelo nosso jornal, o professor universitário e ex presidente da Entidade Reguladora para a Comunicação Social, Azeredo Lopes, acredita na que a notícia pode ter sido lançada como ato de manipulação. "Não me admiro que haja falsificação de imagens e notícias com intuito político. Recordo-me de um episódio de corpos de cristãos queimados na Nigéria, que não tinham nada que ver com isso, mas com uma explosão numa petrolífera", referiu, dizendo ainda que "é evidente que a marca CNN fica associada a essa plataforma, independentemente de ter intervenção jornalística".