Extrema-direita perto de voltar a integrar um governo na Áustria

FPÖ aceitou negociar com Sebastian Kurz e diz querer a pasta do Interior. Experiência de há 17 anos levou a sanções da UE
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Bastaram três horas para que o líder do FPÖ, Heinz-Christian Strache, aceitasse o convite feito na manhã de ontem pelo dirigente do ÖVP, Sebastian Kurz, para que os dois partidos iniciem negociações com vista à formação do novo governo da Áustria. O que poderá representar um regresso da formação de extrema-direita ao poder, 17 anos depois.

"A Áustria merece a formação rápida de um governo estável", disse ontem Kurz, de 31 anos, o vencedor das legislativas antecipadas de dia 15 e que o irão tornar, quando tomar posse como chanceler, no líder mais novo de sempre da Europa.

A aproximação entre Kurz e Strache já era esperada mesmo antes das eleições e é agora apelidada pelos media austríacos como "coligação sushi", por causa da ementa do jantar privado que o líder de extrema-direita ofereceu em sua casa ao conservador três dias após as eleições. O ÖVP ganhou com 31,5% dos votos, o FPÖ foi o terceiro partido mais votado, com 26%, apenas 0,9 pontos percentuais abaixo do SPÖ, que liderava até agora o governo austríaco.

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Kurz disse esperar ter um acordo até ao final do ano, enquanto que Strache já deixou claro que o FPÖ tem "várias linhas vermelhas" para apresentar durante as negociações, pois não tencionam entrar numa coligação "a qualquer preço". Uma dessas linhas vermelhas é a pasta do Interior, que o partido de extrema-direita quer para si.

Estas negociações abrem caminho a um regresso do FPÖ ao governo, depois da contestada experiência de 2000. Nas legislativas do ano anterior, o partido de extrema-direita saiu vencedor, com 27% dos votos, batendo por uma pequena margem o ÖVP, que em fevereiro de 2000 aceitou fazer parte de uma coligação.

Num cenário normal, Jörg Haider, então líder do partido, ter-se-ia tornado chanceler, mas a sua personalidade controversa e as críticas internacionais levaram a que cedesse o cargo a Wolfgang Schüssel, do ÖVP, bem como abdicasse de qualquer cargo governativo.

A saída de cena de Haider, que nesse mesmo mês abandonou a liderança do FPÖ, não impediu que os outros 14 países da União Europeia aprovassem a aplicação de sanções à Áustria, pois a participação deste partido numa coligação governamental "legitima a extrema-direita na Europa". Estas acabaram por ser levantadas em setembro.

A mudança do FPÖ de partido antissistema para o governo criou forte instabilidade interna e levou ao descontentamento de muito do seu eleitorado, insatisfeito com o apoio dado a algumas reformas económicas levadas a cabo pelo ÖVP. Vários ministros do partido de extrema-direita também se demitiram durante a coligação governamental, que teve fim com as legislativas de 2006, nas quais perderam a maioria parlamentar.

Heinz-Christian Strache, o atual líder, assumiu as rédeas do partido em 2005, ano em que Haider abandonou o FPÖ. Com Strache, abandonaram a retórica mais inflamada - Haider chegou a elogiar as políticas de emprego de Hitler - definindo-se agora como um partido social e defensor da identidade austríaca. Esta suavização de discurso leva alguns media austríacos a defender que desta vez não se deve esperar uma ostracização por parte da UE.

Nas presidenciais de 2026, o candidato do FPÖ, Norbert Hofer venceu a primeira volta com 35,1%, a melhor votação de sempre do partido. Mas na segunda volta, Hofer foi derrotado pelo social-democrata Alexander Van der Bellen.

O presidente austríaco já avisou que seguirá atentamente a orientação pró-europeia do novo governo e que reservará para si o direito de vetar nomes de ministros.

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