Exigências de Cameron à UE: "Só isto?" perguntam eurocéticos

Proposta para limitar o acesso dos imigrantes mesmo vindos de outros países da União aos benefícios fiscais foi considerada como uma "discriminação direta" por Bruxelas
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Para Bruxelas, as propostas de reforma da União Europeia ontem apresentadas por David Cameron são "altamente problemáticas" uma vez que afetam "as liberdades fundamentais dos nossos mercados internos" e são "uma discriminação direta dos cidadãos da UE". Para os eurocéticos britânicos - mesmo os do Partido Conservador de Cameron -, os quatro pontos constantes da carta enviada pelo primeiro-ministro britânico ao presidente do Conselho Europeu, Donald Tusk, sabem a pouco. "É só isto?", questionou no Parlamento o deputado tory Bernard Jenkin.

Pressionado para apresentar reformas concretas, Cameron aproveitou um discurso no think tank londrino Chatham House para dar mais pormenores sobre as exigências que fez a Bruxelas. Apresentando-as como condição para fazer campanha pela permanência do Reino Unido na UE no referendo previsto para 2017, o primeiro-ministro afirmou: "Haverá sempre aqueles que, aqui e no resto da UE, dirão que embarcámos numa Missão Impossível. Não acredito nisso".

Da carta de Cameron a Tusk destacam-se quatro grandes exigências: a proteção do Reino Unido e de outros países de fora do euro contra a discriminação no mercado único; reforçar a competitividade traçando um objetivo para a redução da regulação excessiva, a famosa burocracia de Bruxelas; permitir ao Reino Unido ficar de fora da ambição de uma maior integração na União (ever closer union), dando mais poderes aos parlamentos nacionais na criação de leis europeias; cortar os altos níveis de imigração de cidadãos da UE, reduzindo o seu acesso aos benefícios fiscais.

Estas medidas, garantiu Cameron, correspondem ao que os britânicos querem e ao que "é bom para o Reino Unido e bom para a União Europeia". Mas admitiu que será preciso "muito trabalho" para que Bruxelas aceite estas exigências.

E a reação dos líderes europeus assim o deixa adivinhar. Através do seu porta-voz, o presidente da Comissão Europeia, Jean-Claude Juncker, considerou a carta de Cameron como "um bom ponto de partida para as negociações" e disse acreditar que num "acordo que seja justo para o Reino Unido mas também para os outros Estados membros". Mas Juncker denunciou algumas propostas, como a de restringir o acesso dos imigrantes da UE aos benefícios fiscais como "altamente problemáticos". Londres pretende quer todos os estrangeiros que cheguem ao Reino Unido tenham de "viver cá e pagar impostos durante quatro anos antes de poderem receber benefícios fiscais".

Na carta a Tusk, Cameron compromete-se a, se houver acordo com Bruxelas sobre as reformas que propõe, "fazer campanha com todo o meu coração e toda a minha alma para que o Reino Unido fique numa União Europeia reformada".

Desilusão e críticas

Dentro do Reino Unido, as críticas também não se fizeram esperar. Nigel Farage, o líder do partido eurocético UKIP, acusou Cameron de não estar à procura "de uma renegociação substantiva", uma vez que a sua carta não contém "a promessa de recuperar a supremacia do parlamento, acabar com a liberdade de movimento de pessoas ou reduzir a contribuição britânica para o orçamento da UE". Enquanto a campanha Vote Leave (Vota a Saída, numa tradução livre) considerou as exigências "triviais" e defendeu que a única forma de o Reino Unido recuperar o controlo das suas fronteiras é deixar a UE.

Já o ministro sombra das Finanças, o trabalhista John McDonnell, criticou o primeiro-ministro conservador por fazer "bluff" para "acalmar os eurocéticos no seu próprio partido". Além de Bernard Jenkin que, no Parlamento, perguntou: "É só isto?", referindo-se à carta de Cameron, também John Redwood, outro deputado tory, disse esperar "muito mais". E acrescentou: "É mais do que sobre fronteiras e imigrantes, é sobre quem governa".

Algumas notícias davam conta de que Cameron quereria antecipar o referendo para a primavera de 2016, mas a data de 5 de maio já terá sido descartada uma vez que coincidiria com as eleições na Escócio, País de Gales e Irlanda do Norte. Prevista para finais de 2017, a consulta popular sobre a permanência do Reino Unido na UE deverá mesmo realizar-se por essa altura, uma vez que Downing Street veio desmentir como "infundados" os rumores de que poderia ser antecipado para junho do próximo ano.

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