Exceção para Irlanda do Norte faz falhar acordo para o brexit

Juncker recusa falar em fracasso. May volta a Bruxelas amanhã, após unionistas de o DUP terem ameaçado votar contra acordo.
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Foi com uma gravata com o padrão da Burberry que Jean-Claude Juncker recebeu ontem Theresa May em Bruxelas. Mas nem a escolha da famosa marca de luxo britânica ajudou a desbloquear um acordo para o brexit, essencial para que as negociações possam passar à próxima fase após o Conselho Europeu de dias 14 e 15. "Não foi possível chegarmos a um acordo total hoje", confirmou o presidente da Comissão Europeia após um almoço de trabalho. Mas "não é um fracasso", sublinhou o luxemburguês antes de admitir que a primeira-ministra britânica é "uma negociadora dura".

Em declarações à imprensa sem direito a perguntas, May garantiu que ambos os lados têm estado a negociar de boa-fé, mas ainda há divergências "numa ou duas áreas". Com o futuro dos cidadãos da União Europeia que vivem no Reino Unido e dos britânicos que vivem em países da UE, bem como o valor que Londres terá de pagar pelo divórcio e o estatuto da fronteira entre a Irlanda e a Irlanda do Norte em discussão, as negociações só passam para a fase seguinte - a relação entre a UE e o Reino Unido pós-brexit, sobretudo o comércio - quando estas questões estiverem resolvidas.

Na semana passada, surgiram notícias de que Londres teria aceitado pagar 45 mil milhões a 55 mil milhões de euros - mais que os 20 mil milhões iniciais, mas menos do que os 86 mil milhões exigidos por Bruxelas. Mas terá mesmo sido a questão da Irlanda do Norte a travar o acordo. Tudo porque, segundo Laura Kuenssberg, editora de política da BBC, os unionistas do DUP - de cujos dez deputados o governo conservador de Theresa May depende para aprovar as leis - rejeitaram um acordo que implicaria a permanência da Irlanda do Norte no mercado comum mesmo após a concretização do brexit - prevista para março de 2019. Isto de forma a evitar o regresso dos controlos fronteiriços entre Irlanda e Irlanda do Norte. Uma realidade que violaria o acordo de paz de Sexta-Feira Santa assinado em 1998 e que pôs fim a três décadas de conflito.

"Temos sido muito claros. A Irlanda do Norte tem de deixar a UE nos mesmos termos do resto do Reino Unido. Não vamos aceitar nenhuma forma de divergência de regulação que separe a Irlanda do Norte económica e politicamente do resto do Reino Unido", disse Arlene Foster. Esta foi a posição que a líder do DUP comunicou a May quando esta lhe telefonou numa pausa do encontro com Juncker. "Durante a chamada foi dito claramente à primeira-ministra que o DUP tinha sérias preocupações em relação ao acordo em discussão que fazia concessões ao governo de Dublin", explica Kuenssberg.

Ficar sem o apoio do DUP seria apenas um dos problemas para May caso o acordo avançasse mesmo. Outro seria lidar com as reivindicações da Escócia, País de Gales e de Londres que, logo que se soube da exceção aberta para a Irlanda do Norte, exigiram as mesmas condições. Uma frente unida - Escócia e Londres votaram pela permanência do Reino Unido na UE no referendo de junho de 2016, enquanto Gales votou pelo brexit - que está a fazer ressurgir a teoria de que a melhor solução é Inglaterra deixar a UE e o resto do Reino Unido ficar.

Numa conferência de imprensa adiada mais de três horas, o primeiro-ministro irlandês, Leo Varadkar, mostrou-se "surpreendido e desapontado" por o governo britânico não ter aceitado o acordo. Varadkar garantiu contudo ainda confiar em Theresa May que, afirmou, está a negociar "de boa-fé". Recusando apontar culpados, o chefe do governo de Dublin afirmou querer passar à fase 2 das negociações, mas "não o podemos fazer enquanto não houver garantias firmes de que não haverá uma fronteira rígida na Irlanda".

Bruxelas já deixou claro que se a proposta de Londres for inaceitável para Dublin, será inaceitável para a UE. Ontem, o presidente do Conselho Europeu, Donald Tusk, após um breve encontro com May, afirmou ter tudo pronto para apresentar as principais linhas do acordo do brexit aos 27, mas aceitou dar mais tempo ao Reino Unido e à Comissão Europeia. O polaco sublinhou contudo que a margem é cada vez menor antes do Conselho Europeu. May volta a Bruxelas amanhã.

Corrigida às 10:12

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