Ex-ditador tirou a farda e chegou a presidente

Ex-sargento de 64 anos teve de fazer as pazes com o antigo inimigo, que foi o seu guarda pessoal antes de liderar a guerrilha, para chegar pela terceira vez ao poder no Suriname.
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Depois de conquistar duas vezes o poder através das armas, Desi Bouterse chega pela terceira vez à presidência do Suriname, mas desta vez pelo voto. O ex-ditador toma posse a 3 de Agosto, após ter conseguido angariar os votos de 36 dos 51 deputados. O partido de Bouterse ganhou as legislativas de Maio, mas sem maioria, e foram precisos quase dois meses de negociações para que conseguisse o apoio do seu antigo guarda pessoal que se tornou no seu inimigo, Ronnie Brunswijk.

O futuro presidente nasceu a 13 de Outubro de 1945, em Domburg. Estudou na Escola de Comércio em Paramaribo, tendo trabalhado no Ministério dos Transportes. Em 1970, casou-se com Ingrid Figueira, que tinha conhecido quando era adolescente e cuja família se tinha mudado para a Holanda. Bouterse foi atrás dela, aproveitando para ter treino militar - o Suriname só conquistou a independência em 1975.

O casal, que viria a ter dois filhos, mudou-se entretanto para a base militar de Seedorf, na Alemanha, tendo Bouterse ascendido ao posto de sargento. O regresso ao Suriname deu-se poucos meses antes da independência, sendo depois o militar convidado a ajudar a formar o novo exército do país.

A 25 de Fevereiro de 1980, 16 sargentos afastaram num golpe militar Henck Aron (o primeiro chefe do Governo do país), e Bouterse acabou por ser nomeado líder do Conselho Nacional Militar. Apesar de haver um presidente, o poder fica de facto nas suas mãos até 1987 - quando se afastou devido à pressão internacional. Por essa altura já o seu antigo amigo, Ronnie Brunswijk, lhe tinha voltado as costas e liderava um movimento de guerrilha. Apesar da oposição, Bouterse voltou a fazer um golpe em 1990, mantendo-se no poder até 1991.

Os seus anos no poder ficaram contudo marcados por denúncias de vários crimes, incluindo tráfico de droga e a morte de opositores. Em 1999, o ex-ditador foi condenado à revelia a 11 anos de prisão pelos tribunais holandeses por tráfico de cocaína. Ainda hoje está de pé um mandado de captura internacional, tendo Amesterdão avisado que Bouterse só é bem-vindo à Holanda se for para cumprir a sua sentença.

Além desta condenação, o ex-ditador ainda tem pendente um processo no Suriname pela morte de 15 opositores a 8 de Dezembro de 1982. O julgamento começou há três anos e Bouterse, que entretanto foi eleito líder do Partido Nacional Democrático, recusou sempre estar presente. Os seus críticos dizem que só se candidatou à presidência para evitar responder em tribunal. O ex--ditador sempre negou ter sido sua a decisão, mas em 2007 pediu desculpas públicas e aceitou a responsabilidade política pelo massacre.

"Este é um momento histórico", disse o futuro presidente, depois de conhecido o resultado da votação no Parlamento. "Estendo a minha mão a todos os opositores. Estendo a minha mão a todos os surinamenses, porque precisamos de todos para construir juntos este país. Deixemos para trás os temas que nos dividiram nestes últimos 50 ou 60 anos. Nós somos os legítimos donos desde país e não os estrangeiros", acrescentou.

O ex-sargento, que diz ser socialista e usa T-shirts com o rosto do Che Guevara, reinventou-se como um defensor dos pobres e já disse que vai abrir os braços à Venezuela, China e Brasil. Uma das suas apostas é o investimento na educação, tendo prometido um computador para cada criança no Suriname.

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