Evocar Sá Carneiro, prodígio da política
Francisco Manuel Lumbrales de Sá Carneiro, de seu nome completo, morreu a 4 de Dezembro, há 40 anos, em desastre aéreo com um "Cessna" nas imediações de Camarate.
Tenho, para mim, que se tratou de um acidente e não atentado. Mesmo nesta hipótese, pouco plausível, a esquerda não foi, certamente, porque, passados todos estes anos, já estaria incriminada.
Sá Carneiro foi um prodígio da política, quer antes, quer depois do 25 de Abril.
Através do António Patrício Gouveia, meu grande amigo pessoal, convidou-me para fundar o "Povo Livre", órgão oficial do então PPD, hoje PSD, e para director. Estando na tropa, achei que a minha condição de militar era incompatível com a direcção do jornal e, depois de o ter fundado, fiquei como Chefe de Redacção.
Ainda me recordo de ter ido ao COPCON entrevistar Otelo Saraiva de Carvalho - o "Povo Livre" era na altura dirigido por Rui Machete, que sucedeu a Manuel Alegria, o primeiro director. O título que pus na entrevista, em manchete - Haverá eleições livres - foi certeiro, porque houve mesmo eleições, se bem que uma ala do MFA não as quisesse.
O papel de Sá Carneiro na Ala Liberal, juntamente com Mota Amaral, Balsemão e outros, foi enorme contributo para a queda do antigo regime, que combateu por dentro, enquanto outros o fizeram por fora. Como advogado, natural do Porto, a cidade que o viu nascer, chegou a defender comunistas e tinha uma coluna no Expresso, fundado em 1973, um ano antes do 25 de Abril.
Considerava-se um social-democrata convicto, reformista, de centro-esquerda, a matriz política que imprimiu ao PPD, quando o fundou em 6 de Maio de 1974, com Balsemão e Magalhães Mota.
Na oposição aos primeiros Governos socialistas, costumava dizer que Portugal era um país provisório e sucessivamente adiado. Posteriormente, na Aliança Democrática(AD), foi primeiro-ministro, tendo como vice Freitas do Amaral, do CDS, também já falecido. Dizia, sempre, que primeiro era português, em segundo democrata e só por último social-democrata. Seria com este lema que enfatizou a sua governação.
Sá Carneiro, Mário Soares, Álvaro Cunhal e Freitas do Amaral, fundadores da nossa democracia, eram grandes senhores da política e a época inicial em que viveram é considerada, por muitos, como os anos de ouro do regime de Abril.
O ideário social-democrata de Sá Carneiro foi, infelizmente, desvirtuado no PSD, a partir de Cavaco Silva. O partido teve uma deriva direitista, com tiques de extrema-direita, razão pela qual me afastei dele. Ou melhor, foi o PSD que se afastou de mim. Quem é genuinamente social-democrata, como sempre me intitulei, vota hoje PS! O legado de Sá Carneiro revê-se melhor em António Costa do que em Rui Rio. Quem ocupa o espaço da social-democracia são os socialistas. Mas Francisco de Sá Carneiro perdura para sempre na minha memória. Dele, nunca me afastei!
Escreve segundo a norma anterior ao Acordo Ortográfico