"Estes resultados criam incerteza, insegurança e ingovernabilidade"
Que leitura faz dos resultados eleitorais?
Estes resultados criam incerteza, insegurança e ingovernabilidade. Vão ser muito negativos para os interesses dos cidadãos no seu dia a dia. Se a Espanha tivesse políticos com categoria os dois partidos maioritários deveriam pensar em fazer um acordo, como fizeram conservadores e sociais-democratas na Alemanha. Mas Espanha não é Alemanha nem pela cultura política, nem pela categoria dos seus líderes.
Quais são as opções para Espanha ter um Governo?
Um cenário é que aconteça como sempre aconteceu em Espanha: governa o partido mais votado. Como aconteceu com Aznar, Zapatero, Rajoy e Felipe González. Mas não vejo Pedro Sánchez com essa categoria. Outro cenário é Sánchez conseguir apoio de todos os partidos, menos do PP, Vox e UPN [União do Povo Navarro]. Mas, a acontecer, ia ter vários problemas. Estaria a negociar com um fugitivo à Justiça como é [o ex-presidente do Governo catalão Carles] Puigdemont e também com os pró-etarras do Bildu. Além disso, dentro de um ano Junts e ERC [Esquerda Republicana da Catalunha] vão disputar a Generalitat e PNV [Partido Nacionalista Basco] e Bildu lutarão pelo poder no País Basco.
Voltar a formar um governo Frankenstein resultaria num governo instável, com uma duração limitada no tempo pelas guerras internas e porque, constitucionalmente, seria complicado para Sánchez aceitar as exigências dos independentistas, como o referendo. Também dentro do movimento Sumar, quando for a hora de divisão dos cargos, vão começar a saltar faíscas. Imagino que Yolanda Díaz vai pôr a funcionar a sua grande habilidade de fazer o que for melhor para o seu interesse e deixar de lado quem esteve junto com ela. Internamente, Sánchez voltaria a ter um Governo com comunistas quando, no plano internacional, ia ter uma rejeição evidente. Os comunistas que estão dentro do Sumar são contrários à NATO e põem em questão o apoio da Espanha à Ucrânia. Este governo Frankenstein é complicado, embora seja o mais provável, sem respeitar a lista mais votada.
Qual seria então a melhor solução?
Repetir as eleições em novembro. Penso que umas eleições que não aconteçam num 23 de julho poderiam clarificar uma situação de incerteza e ingovernabilidade que vai ser muito negativa para os interesses de Espanha no exterior e sobretudo para atrair investimentos tão necessários para a nossa economia.
Há uma questão que se deve refletir, tendo em conta as expectativas que despertaram as sondagens. A política tem os seus tempos, precisa de maturação. Nenhum líder político foi presidente do Governo à primeira tentativa. Feijóo conseguiu em ano e meio mais 47 deputados, foi muito bom, mas para ganhar a confiança dos cidadãos precisas de tempo. A maioria absoluta de Juanma Moreno na Andaluzia e Isabel Díaz Ayuso em Madrid ainda não se traduz em votos para Feijóo. Em Madrid há quem vote em Ayuso e, depois, nas Legislativas, vote no Vox e isso é um problema para o PP.
Feijóo fez uma má campanha?
Nas campanhas eleitorais é preciso jogar até ao último segundo. Depois do debate com Sánchez houve excesso de otimismo, como se tudo já estivesse feito. E Sánchez mudou, voltou aos comícios eleitorais para conseguir esses deputados que podem definir o Governo.
Foi um erro de Feijóo não participar no debate a quatro?
A realidade demonstrou que a RTVE chega até muitas casas, sobre tudo de gente de mais idade, e Feijóo perdeu a oportunidade de chegar a eles, de se reafirmar ou se consolidar. No início pensei que podia ter sido um acerto, mas a verdade é que os eleitores querem que os candidatos suem a camisa. As cadeiras vazias pagam-se.
O PSOE ficou no primeiro lugar na Catalunha. Esta região foi decisiva para o resultado final?
É uma das comunidades mais relevantes. Os catalães votam em função do tipo de eleição (Municipal, Autonómicas e Legislativas). Sente-se um desgaste dos partidos independentistas e os catalães estão a pedir eficácia na gestão e uma mudança. O que querem as pessoas é que os problemas sejam resolvidos. A perda de quase metade dos deputados da ERC é um exemplo. E o PP também subiu bastante nesta região. Parece-me uma sobrerrepresentação e sobrevalorização dos votos dos nacionalistas com respeito ao resto do país. É necessária uma mudança da Lei Eleitoral, porque não podemos estar a depender de partidos independentistas que querem quebrar a Espanha. A democracia deve ser defendida. A Lei Eleitoral deve ser atualizada para que os nacionalistas bascos e catalães não condicionem a governabilidade de todos os espanhóis, por muito importante que estas regiões sejam.
Que leitura internacional faz da queda de Vox?
É uma mensagem. A solução dos problemas está mais no centro do que na radicalidade. O problema está sobretudo na forma de lançar as mensagens. Há reformas que se fossem apresentadas de outra forma podiam ser mais bem recebidas. As vezes até têm uma parte de razão, mas provocam rejeição. A mobilização do eleitorado de Esquerda, que não existiu nas Municipais, produz-se para evitar o Gverno do PP e Vox. Há pessoas que votam nas Legislativas só para evitar a sua entrada. Os populismos de Extrema-Direita têm umas linhas vermelhas que os cidadãos perceberam e não estão dispostos a ultrapassar. Com a Extrema-Esquerda está mais assumido o seu passado ligado ao estalinismo, comunismo, etc.... mas o passado nazi da Extrema-Direita provoca rejeição, medo e mobilização.