Estado da Nação não satisfaz presidente moçambicano

A bancada da Renamo abandonou o parlamento em protesto contra o governo de Filipe Nyusi. Dhlakama diz que em março assume governo das cinco províncias que reivindica
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Durante uma hora e meia, o presidente moçambicano, Filipe Nyusi, apresentou ontem ao parlamento do país o Estado da Nação e disse, antes mesmo de começar a ler, que não está satisfeito com ele. "Se me perguntarem se estou orgulhoso do que foi feito, respondo que sim, estou orgulhoso. Se me perguntarem, se estou satisfeito, a resposta verdadeira e sincera é não, eu não estou satisfeito. Ainda não estou satisfeito", afirmou.

Discursando pela primeira vez, como chefe do Estado neste pódio, num clima político caracterizado pelo boicote da Renamo, Nyusi afirmou que só se sentiria satisfeito caso tivessem sido resolvidos em definitivo o que chamou de "problemas básicos da pobreza, da exclusão e da paz". No seu entender, chegou o momento de os moçambicanos escolherem onde querem estar nos próximos anos. "Chegou a hora de escolher que país queremos deixar como herança para os nossos filhos e netos."

[citacao:Se queremos um futuro diferente, temos de saber como questionar o presente que estamos a viver]

"Se queremos um futuro diferente, temos de saber como questionar o presente que estamos a viver", defendeu. "Há questões que temos de colocar que dizem respeito à construção da paz e da unidade. Outra pergunta é esta: vamos continuar a viver com as ameaças ou desentendimentos internos? Colocar moçambicanos contra outros moçambicanos?" "Permaneceremos com as convulsões que arruínam o presente e comprometem o nosso futuro comum?", perguntou, ovacionado pela bancada da Frelimo, no poder desde 1975.

Nyusi perguntou ainda se há dois futuros diferentes para os moçambicanos que, por qualquer razão, têm diferentes pontos de vista. O presidente moçambicano deixou no ar a pergunta: "É tão difícil optar pelo bom senso e unirmo-nos no propósito comum de construir uma nação que é a casa de todos os moçambicanos?"

O presidente não respondeu a nenhuma destas perguntas e preferiu dizer que os moçambicanos unidos em torno de um propósito, uma agenda aceite e adotada por todos são capazes de superar "barreiras aparentemente intransponíveis para consolidar a paz, a democracia e o desenvolvimento".

Quanto ao fenómeno da inclusão que tem defendido nos seus discursos políticos, diz que não é apenas uma questão de relações entre partidos políticos. "Pelo contrário, significa repensar continuamente tudo o que nós somos, como indivíduos, grupos e como uma só nação, una e indivisível."

"A responsabilidade de pensar e transformar Moçambique pertence a todos nós, sem exceção", afirmou Nyusi, acrescentando que "É por isso que sou a favor de um ciclo de governação em que a inclusão é a nossa bandeira. A forma da inclusão é a justiça social e bem-estar para todos", defendeu.

[citacao:Todos sabemos que não vamos resolver os problemas culpando outras pessoas]

"Os grandes desafios estão à frente de todos nós. Todos sabemos que não vamos resolver os problemas culpando outras pessoas. A atitude de culpar os outros não ajuda no que é essencial, que é mantermo-nos unidos e focados nas grandes prioridades da construção da nossa nação", afirmou.

Amnistiados

No fim do seu discurso, Nyusi declarou amnistia a favor de mil reclusos (moçambicanos e estrangeiros) condenados por vários crimes. Numa atitude pouco vulgar nos últimos dez anos, o chefe do Estado agiu em conformidade com a Constituição que lhe confere poderes para indultar penas na qualidade de "alto magistrado da Nação".

A amnistia abrange presos que padecem de doenças graves e terminais, idosos e jovens que apesar de terem cometido crimes, cumpriram metade ou quase metade da pena imposta e que se mostram reabilitados e prontos para regressar ao convívio social. Eles serão soltos no dia 24.

Oposição dececionada

O maior partido da oposição, a Renamo, não quis sequer acompanhar o discurso de Nyusi por considerar que ele e o seu governo são ilegítimos. Ivone Soares, chefe da bancada, diz que quem devia governar era Afonso Dhlakama que, segundo ela, foi a escolha do povo moçambicano nas eleições de outubro de 2014. Diz que a Renamo não está confortável com a forma como os processos eleitorais têm acontecido no país.

Por seu turno, o Movimento Democrático de Moçambique (MDM), a terceira maior força política do país, na pessoa do polémico deputado Venâncio Mondlane, diz-se dececionado com o informe por ter deixado de lado assuntos como a derrapagem do metical até níveis históricos.

"Não vimos numa perspetiva clara e honesta sobre diversas situações que o país enfrenta como é o caso do endividamento, do recente relatório do Índice de Desenvolvimento Humano que coloca o país como um dos piores lugares para se viver", disse.

Dhlakama em teleconferência

Ontem, ao início da tarde, a notícia era Afonso Dhlakama. Na tentativa de abafar o Estado da Nação apresentado pelo presidente, os seus colaboradores diretos organizaram uma teleconferência em que fez violentas ameaças, dizendo que em março vai governar as cinco províncias do centro e norte de Moçambique onde ele levou vantagem nas eleições de 2014, em comparação com Nyusi.

Dhlakama afasta qualquer possibilidade de regresso à guerra, mas avisou que se as forças armadas o impedirem de executar os seus planos, ele e os seus homens vão responder.

Quanto aos seus homens armados, cuja existência diz que está coberta pelo Acordo Geral de Paz de 1992, defendeu que ninguém vai desarmá-los alegadamente porque as mesmas armas podem ser usadas para o matarem. O líder da Renamo disse ter organizado a teleconferência para dizer ao povo moçambicano que "estou bem" e que regressará à vida política ativa a seguir ao Natal e fim de ano.

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