"Está um bocadinho melhor, mas num ano não se faz muito"
"Se estou contente com o que se passa? Mais ou menos. Não ligo muito à política." Paula, 50 anos, encolhe os ombros. Vive em Alcórrego desde os 23, por casamento, e confessa que mudou o sentido de voto por causa da família do marido. "A minha sogra é muito militante e foi por influência." Desempregada, trabalhou a contrato na única fábrica que resta na zona, a de legumes congelados." Acho que isto está um bocadinho melhor, mas num ano não se pode fazer muita coisa."
Isabel Lopes, 73, sentada ao lado de Paula num banco da rua da junta de freguesia da terra, também acha. Mas para já queria que acabassem com os duodécimos. "Gosto mais de receber tudo de uma vez, rende mais." Na verdade, não sabe o que está previsto para 2017 nesta matéria, apesar de o Orçamento de Estado ter sido votado no dia anterior ao da conversa - a sua reivindicação, de subsídio de Natal pago de uma só vez, só deverá ser satisfeita a partir de 2018. Ex--trabalhadora da Setenave, em Setúbal, mudou-se para aqui com o marido depois da reforma. Torce o nariz: "Isto é muito morto. A juventude foge toda daqui."
Não foi ainda o caso de Raquel Silva, 19 anos, que mora na casa ao lado e aparece para ver o que se passa. A mãe está desempregada ("Fazia tapetes de Arraiolos, não sei porque é que perdeu o emprego."), o pai é tratorista e ela, no 12.º ano de Ciências e Tecnologias, quer ser educadora de infância. "Gosto muito de crianças", justifica, apesar de defender, seguindo a opinião de uma das professoras, que quem trabalha com miúdos "devia poder reformar-se mais cedo, aos 50 ou assim, acredito que não tenham paciência para os aturar a partir de certa idade".
Votou pela primeira vez nas legislativas, e não quer dizer em quem, apesar de logo a seguir desfazer o mistério: "Só voto por causa da fama da terra, de resto não ligo nada. A minha mãe diz para eu votar porque se não votar não me posso queixar se correr mal." E se acha apenas este governo "melhor do que o que estava", gostava de "ver mais empregos e as reformas mais cedo."
Sobre o que deseja para si ainda não está certa se quer sair daqui ou ficar, "se arranjar aqui emprego": "Se eu quiser um sítio calmo este é o melhor."
Da mesma idade que Raquel, Bruno, do Couço, nunca votou. "Odeio política, odeio políticos", diz. A tradição vermelha da terra irrita-o, aliás: "As pessoas são hipócritas e estúpidas." Apesar de declarar sofrer discriminação por se ter assumido como homossexual há três anos, não relaciona isso com a política. "Gostava de viver longe daqui. Tudo o que seja longe disto é melhor."
Com a idade de Raquel e Bruno, Ortelinda Graça já era professora há um ano. Aqui mesmo, no Couço, desembarcada em pleno Verão Quente. "Vim para um sítio do qual nunca tinha ouvido falar, qual Linda de Suza de mala de cartão." Assistiu, conta, à mudança de vida dos seus alunos, que com a Reforma Agrária, garante, passaram a vestir-se melhor e a comer melhor. "Era uma altura em que as pessoas eram muito amigas umas das outras e todos tinham trabalho." Simpatizante da UDP no pós-25 de Abril, acabou por se encontrar com o PCP no Couço, sendo desde 2013 a presidente da respetiva junta de freguesia, a primeira mulher no cargo.
"Como vejo o acordo entre o meu partido e o PS? Como uma surpresa agradabilíssima. Sinto--me extremamente orgulhosa. Confesso que até me saltaram as lágrimas quando vi o Jerónimo dizer que o PS só não formava governo se não quisesse. Nunca pensei que isto pudesse acontecer, achei que havia de ser sempre estes partidos de linhas paralelas." Congratula-se com algumas conquistas: "Gostei muito do aumento das reformas, do descongelamento das carreiras, do repor das 35 horas e da gratuitidade dos manuais escolares."