Esquerda parte para o Orçamento de costas voltadas

Reforma das florestas azedou o ambiente entre os partidos que sustentam o governo, mas todos recusam contaminação do OE
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O pacote legislativo sobre a reforma das florestas fez azedar o ambiente entre os partidos que sustentam o governo socialista. Numa altura em que as bancadas da esquerda têm pela frente as negociações do Orçamento do Estado para 2018 - praticamente paradas até agora - , as negociações dos últimos dias deixaram comunistas e bloquistas de candeias à avessas. E, muito embora um e outro lado garantam que o que aconteceu esta semana não terá repercussões na discussão do orçamento, o certo é que partem para o processo negocial mais distantes do que nunca.

Depois das reuniões de cúpula que, no final de abril (BE) e já em maio (PCP) marcaram o pontapé de saída para o OE 2018, as negociações pouco avançaram entretanto. Só na semana passada (no caso dos bloquistas) e já esta semana (no caso dos comunistas) foi retomado o diálogo no parlamento sobre as contas públicas do próximo ano.

João Oliveira, líder parlamentar comunista, já veio dizer que não há "dramatismo " face ao que aconteceu esta semana, e sublinhou que a discussão orçamental decorre num "quadro próprio", afastando qualquer contaminação. O mesmo diz fonte socialista ao DN, sublinhando que nenhum dos partidos tem interesse em que as negociações corram mal, uma posição corroborada no BE. Mas o ambiente atual promete, no mínimo, somar tensão ao complexo processo do orçamento. Até porque, mesmo com as negociações ainda numa fase incipiente, o OE para 2018 já fez notar divergências públicas entre BE e PCP. Se os dois partidos concordam na necessidade de revisão dos escalões do IRS, a fasquia posta pelo BE - que apontou para um alívio fiscal de 600 milhões de euros - já mereceu comentários críticos do PCP. "Discutir o IRS nesses termos não é vantajoso", sublinhou já João Oliveira.

Alternativa ao banco de terras

O historial de atritos entre BE e PCP nesta legislatura já conta vários episódios, mas poucas vezes assumiu os contornos que teve esta semana a votação do pacote das florestas, que se revelou um dos mais complicados dossiers negociados entre os dois partidos e o governo. O executivo chegou a dar as negociações como fechadas por duas vezes, as mesmas duas vezes que teve que reabrir o assunto. Que continua, aliás, por fechar: o governo está a agora a trabalhar numa alternativa ao banco de terras chumbado pelo PCP no último dia de votações, uma solução que, ao que o DN apurou, deverá ser apresentada já nas próximas semanas.

Primeiro foi o BE a ficar desagradado com o facto de o PCP ter imposto um acordo que fez tábua rasa do que tinha sido acertado entre governo e bloquistas sobre as terras sem dono conhecido. Um acordo que o próprio BE viria a chumbar (com o PSD e CDS) na votação artigo a artigo da lei. Reabertas as negociações, e acertado com o governo o recuo do BE face à votação da madrugada, foi com "surpresa" que os bloquistas viram o PCP chumbar o banco de terras (onde, na proposta do governo, seriam incluídas as terras sem dono conhecido). Pelo caminho, os comunistas acusaram o BE de se ter aliado à direita para aprovar "medidas que permitem a privatização de terras do Estado, o esbulho dos pequenos proprietários rurais". Críticas refutadas pelo BE, que recusa "anátemas" sobre a estatização das terras sem dono. "Não cola com a realidade. Ou é má fé, que acredito que não seja, ou o PCP não percebe as mudanças que estão a acontecer no mundo rural. O PCP tem uma visão atávica do mundo rural, não percebe que é um mundo em mudança e que isso está a levar ao abandono e ao empobrecimento", devolve o bloquista Pedro Soares.

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