"Espero que CDS e IL mostrem que são úteis a uma maioria de centro-direita"
O CDS parte para as legislativas antecipadas muito fragilizado?
Parte com estudos de opinião que não são positivos. E sobre as sondagens acho que elas não devem ser valorizadas nem desvalorizadas em excesso, são um instrumento de trabalho que os partidos devem utilizar. E neste preciso momento dão um resultado residual ao CDS. Mais do que esse perigo, acho que o CDS tem desafios nestas eleições. E os desafios são o de demonstrar que não está em terra de ninguém e de demonstrar aos eleitores que há utilidade no voto no CDS. Tem de demonstrar o seu papel como partido programático no espaço de centro-direita e que tem pessoas que são capazes corporizar as suas ideias. Tem de demonstrar que continua a ter uma rede social de autarcas, de militantes, de simpatizantes pelo país fora, coisa que os novos partidos ainda não conseguem ter. E num ou outro ponto vai ter de fazer um discurso disruptivo, diferente, que dê alento àqueles que são tradicionalmente eleitores do CDS. É preciso não esquecer que o partido já teve resultados que foram desde os 4,6% atualmente até próximo dos 20%. É um leque bastante grande.
Um acordo pré-eleitoral com o PSD, que o rejeitou, evitaria expor as fragilidades do CDS nestas eleições?
Objetivamente era uma não contabilização do peso eleitoral do CDS sozinho, o que viria na sequência do que já fez nas eleições autárquicas. Isso pode ser uma estratégia política, mas a acerta altura se essa estratégia é muito repetida, teria de se pôr uma pergunta, que é se o CDS tem ou não sentido de existência? Mas vejo mais as coligações como um espaço de esperança de vitória, um espaço que tem de estar baseado em elementos de natureza programática, que sejam completamente distintos de quem exerce o poder. Em relação a essa potencial coligação não estava a ver isso. Nada foi apresentado como uma ideia comum do PSD e do CDS distintivo da política do PS. A ser feita apenas em cima de eleições para distribuir uns lugares de deputados corria-se o risco do que foi referido na pergunta.
É mau o líder do partido partir para eleições nesta situação, sem ter sido relegitimado como foi, por exemplo, Rui Rio no PSD?
A Iniciativa Liberal fez uma convenção, o PSD fez diretas e congresso. Se olharmos para o espaço mediático, aquele onde se transmitem mensagens, os partidos que existiram desde novembro até ao momento em que estamos a falar foram precisamente a IL e o PSD e, é óbvio, que a dois meses de eleições os partidos têm de aparecer e de mostrar, até pelas suas diferenças, como sucedeu no PSD, com a disputa interna entre Paulo Rangel e Rui Rio, aquelas que são as suas opções para o país. E o PSD fez [a 17,18 e 19 de dezembro] o seu congresso e foi mais um momento de afirmação enquanto partido que é alternativa ao PS. A Iniciativa Liberal fez a sua convenção e é mais uma marcação de como é possível ser uma novidade e crescer no espectro político português. O CDS não fez. Se calhar até pode ser a boa estratégia, que tem caras assumidas: Francisco Rodrigues dos Santos, José Ribeiro e Castro, Filipe Anacoreta Correia. Veremos nas eleições se estavam certos nas suas ideias.
Nas listas de candidatos não fariam toda a diferença figuras como Cecília Meireles, Telmo Correia, Adolfo Mesquita Nunes ou até Diogo Feio?
O meu plano pessoal é pura e simplesmente dar a ajuda que me vai sendo pedida. Qualquer partido que quer ter sucesso eleitoral não deve, em tese, desbaratar aquelas que são as figuras que são mais conhecidas. Os partidos devem demonstrar união e então em momentos eleitorais ainda mais do que nunca. Eu preferia que o CDS em vez de estar a ser falado porque não fez um congresso, porque tem uma disputa por resolver, porque tem problemas nas suas listas, estivesse a ser referido pelas suas ideias sobre o sistema fiscal, a questão da segurança, o sistema nacional de saúde e os três grandes desafios destas eleições: economia, os aspetos sociais e as soluções de governabilidade que possibilitarem os vários partidos.
Figuras históricas como António Lobo Xavier, Luís Nobre Guedes, Filipe Lobo d'Ávila e até Paulo Portas ou Assunção Cristas não deveriam ajudar o CDS a não desaparecer nestas eleições?
Quando falei nisso achei que era uma boa opção e alistava-me nesse grupo se entendessem como necessário. Com sinceridade, essa conversa já é um bocadinho passada.
Já não vai ser possível mobilizá-los nem para a campanha eleitoral?
Até ao momento não tenho visto grandes sinais nesse sentido, essas coisas têm de se preparar com tempo. O caminho a seguir por quem lidera é agregar.
Se o CDS sair das eleições com dois ou três deputados, o partido desaparece como o conhecemos?
O CDS tem uma rede social grande pelo país fora, tem autarcas, tem participação nos governos regionais dos Açores e da Madeira, espero que mantenha um grupo parlamentar, a minha vontade neste momento é que tudo corra pelo melhor. Mas admitindo cenários em que tudo não corra pelo melhor, parece-me que há pessoas que já demonstraram disponibilidade para levar o CDS a patamares que já conheceu. E em relação a elas o que tenho é uma sensação de admiração e de agradecimento.
Além das prioridades que mencionou, que outras bandeiras deve levar o CDS para a campanha eleitoral e de distintivo em relação à IL, ao PSD e até ao Chega?
Seria importante que o CDS tivesse marcado durante bastante tempo o seu espaço distintivo.
Uma das críticas que o atual líder do CDS fazia à antecessora, Assunção Cristas, era precisamente a de que "ia a todas" e não afirmava o CDS pela sua marca identitária...
É um desafio que o líder do CDS tem pela frente nesta campanha eleitoral. Passámos um mês e meio com o PSD a assumir um discurso para o eleitorado, a Iniciativa Liberal também e da sua forma o Chega também, que fez o seu congresso. Sinto que há alguma desorientação no espectro da esquerda em Portugal e o CDS não assumiu aqui uma posição liderante. Passadas as festas e iniciado logo o dia 2 de janeiro e os debates eleitorais, tem 30 dias para o fazer. É uma tarefa hercúlea e não há como fugir a ela, estejamos mais otimistas ou mais pessimistas quanto ao resultado final desse esforço. É um esforço em estado de necessidade. E vai ter de assumir claramente aquelas que são as suas prioridades para que os eleitores tenham na cabeça que este é um tema que foi tratado pelo CDS. Se temos uma salada de frutas de temas e não conseguimos distinguir bem as suas cores temos mais dificuldades.
Que prioridades deve o CDS ter na campanha?
Por exemplo, em relação à matéria fiscal - onde neste momento a concorrência é mais feroz no plano dos discurso político do que era aqui há uns tempos, quer pela IL quer pelo PSD, que assumiu no seu congresso um objetivo quanto ao IRC - o CDS também deveria falar daquilo que é a relação da administração e os contribuintes, assunto de que falou durante muito tempo e no qual era reconhecido no seu esforço. O CDS deve assumir-se como aquela que é a verdadeira direita social, porque esse espaço existe, o espaço da democracia cristã. Portanto, o CDS deve ter um olhar estruturado e muito marcado sobre questões como o sistema nacional de saúde ou o funcionamento da segurança social, onde também tem de ser inovador. E depois tem de ser inovador também no modo como vai assumir o espaço político porque a situação que pode sair das próximas eleições pode ser politicamente muito complexa. E nós aí temos de perceber, o eleitor tem de perceber, quais são as ideias que o CDS tem sobre isso. E aqui está, se já tivesse feito o seu congresso... É natural que o CDS vá ser questionado durante muito tempo sobre a legitimidade com que se apresenta a votos e era perfeitamente desnecessário.
Sobre a governabilidade, se o PSD ganhar as eleições com maioria relativa também deve esclarecer o CDS se fará acordo de governo, de apoio parlamentar, ou até se aceita integrar um acordo com o PS se for preciso ou até com o Chega?
Essa explicação dada ao eleitorado é fundamental. Vivemos durante os últimos seis anos, mais quatro do que os últimos dois, com uma solução maioritária que não foi explicada inicialmente aos eleitores, apareceu depois como um facto consumado. Rui Rio foi quanto a essa matéria completamente transparente em relação àquilo que pretende fazer, na hipótese de ganhar as eleições, na hipótese de as perder e de as perder existindo uma maioria relativa do PS. Esse é um desafio também muito para o PS, que já está a fugir por todos os meios, mas é evidente que essa questão vai surgir nos debates eleitorais e no debate entre Rui Rio e António Costa. Acho que o PS só perde com a falta de clarificação em relação a essa matéria e também acho isso em relação ao CDS. E não só, também é importante explicar-se logo o que fazer em relação ao Chega. Tenho um ponto de princípio sobre a conversa sobre o Chega, mas quer o PSD quer o CDS ou a IL, se tivessem de gerar uma solução governativa, deviam pôr o Chega perante as suas responsabilidades se for necessário para uma qualquer maioria. Que é a de saber se no Parlamento vota ou não um programa de governo e de assumir o que fazer em relação aos orçamentos.
Mas através de acordos escritos?
Não, estou a defender uma clarificação de discurso em campanha eleitoral. Vamos cenarizar: tendo o PSD ficado à frente nas eleições não tem uma maioria absoluta de deputados e o Chega é necessário para essa maioria, acho que há uma obrigação por parte de PSD, CDS e IL de clarificarem como vão votar programa de governo e orçamentos e de dizer que esperam do Chega o mesmo patamar. Acho impensável o Chega participar em qualquer solução governativa, mas se um programa de governo ou um orçamento chumbar porque o Chega vota contra ou se abstém é uma responsabilidade que esse partido assume perante o eleitorado e isso só favorece o espectro político à esquerda. É preciso dar estes sinais de que as coisas serão tranquilas e previsíveis no centro-direita.
Acha que é mesmo possível inverter o ciclo político e uma maioria de centro-direita sair vencedora das eleições?
Acho que neste momento os ventos são muito favoráveis ao centro-direita. Existe exaustão em relação ao PS e em relação ao primeiro-ministro. Espero que Rui Rio e o PSD não entrem em euforia com esses sinais e que a IL e o CDS sejam capazes de demonstrar a utilidade na formação dessa maioria alternativa.
E se for o PS a reconquistar as eleições com maioria relativa?
Também acho que deve ser claro quanto às posições a tomar. Houve alturas em que em relação à pandemia defendi a existência de um acordo de um bloco central bastante alargado de partidos moderados quanto à possibilidade de deixar governar quem estava a combater a pandemia. Vamos ver como a pandemia evolui, mas há uma coisa que temos como certa é que após as eleições, nos seis meses seguintes, o Presidente da República não pode dissolver a Assembleia da República, portanto acho que devia haver um compromisso de responsabilidade no mínimo nesses seis meses.
Mas além dos seis meses, também há a questão da aplicação dos fundos comunitários...
Pois há, mas durante esses seis meses tem a votação de um orçamento e toda a preparação para o orçamento do ano seguinte, portanto 2023. Esse acordo de mínimos deveria ser claro perante o eleitorado.
Independentemente do governo que sair das eleições, o próximo ciclo é crucial para o crescimento do país. Em que prioridades esse governo deveria apostar?
Portugal tem um problema de crescimento grave. É um problema que o faz estar a ser ultrapassado por parceiros do Leste europeu, o que seria impensável há uns anos e o crescimento económico faz-se por via das empresas. Portanto, deve-se assumir que essa é a aposta clara e nesse sentido, no plano económico, os próximos tempos não vão ser tempos garantidamente de mais Estado, mas de diferente Estado e de mais empresas.
O eleitorado que não está ligado às empresas percebe essa mensagem?
O eleitorado que não está ligado às empresas também não sei qual é, porque as pessoas trabalham para as empresas, que se estiverem melhor possivelmente o salário dos trabalhadores também estará melhor. É preciso pensar no Estado reformulado e as empresas como motor do crescimento da nossa economia. Em vez de andarmos com a conversa teórica à volta de exportações, de alterações que é preciso fazer no Estado e apoios às empresas, isso tem de ser concretizado. Não esquecendo que o CDS, além disso, tem de ter um discurso quanto aos apoios sociais àqueles que mais dificuldades têm. Temos neste preciso momento fenómenos de pobreza que são verdadeiramente preocupantes e o CDS não pode de todo perder o seu lugar histórico em relação a essa matéria.
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