Escutas demonstram pressões sobre arbitragem

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O juiz Pedro Miguel Vieira arrasou, em toda a linha, os argumentos das defesas dos 24 arguidos do processo "Apito Dourado" que seguem para julgamento. A quase totalidade das 332 páginas do despacho do magistrado, a que o DN teve acesso, são preenchidas a analisar questões formais (validade das escutas, inconstitucionalidade da lei que pune corrupção desportiva e conceito de funcionário público). Quanto à matéria de facto, Pedro Miguel Vieira não teve dúvidas: as escutas telefónicas são "perfeitamente demonstrativas da pressão que era exercida pelos arguido Valentim Loureiro e José Luís Oliveira sobre o arguido Pinto de Sousa [ex-presidente do Conselho de Arbitragem da Federação Portuguesa de Futebol], no sentido de este actuar da forma pretendida". Isto é, nomear os árbitros que eram pretendidos para os jogos do Gondomar SC.

No processo são abundantes as conversas entre os três principais arguidos acerca dos árbitros que arbitraram os jogos do clube de Gondomar na época 2003/2004. Por exemplo, no jogo Gondomar-Paredes, José Luís Oliveira, presidente do clube da casa, mostrou-se junto do major agastado com a arbitragem: "Eles marcaram um penalty a acabar. Expulsou-nos um jogador. "Oh... Isto é o (...) Pinto de Sousa. Eu tinha-lhe pedido... Veio este de recurso. Porque era para vir... Eu tinha pedido o Pedro Sanhudo [também arguido que irá a julgamento] e o gajo não quis mandá-lo."

Valentim Loureiro respondeu: "Então mas esse filho da p... [Pinto de Sousa] também não faz nada que a gente... Tenho que me empertigar com o gajo, pá". A conversa terminaria com uma promessa do major: "Temos que marcar um encontro com esse gajo que eu tenho que lhe apertar as orelhas. Tenho que lhe apertar as orelhas."

Formalidades

Como todos os arguidos optaram por centrar a sua defesa ao despacho de acusação do Ministério Público em questões formais, tal reflectiu-se no documento do juiz de instrução. Pedro Miguel Vieira, porém, não aceitou nenhum dos argumentos invocados. Primeiro, considerou que as escutas telefónicas foram controladas pela juíza Ana Cláudia Nogueira que acompanhou a fase de investigação. O juiz chegou a construir uma enorme tabela, na qual elencou todos os dados das escutas a todos os arguidos: datas das escutas, validação das mesmas, auto de transcrição e despacho de certificação.

Outro dos argumentos "de peso" invocado pelas defesas prendia-se com a inconstitucionalidade da lei sobre corrupção desportiva. Apesar desta tese estar apoiada num parecer do constitucionalista Gomes Canotilho, o juiz entendeu que a lei cumpre todos os pressupostos.

A defesa de Valentim Loureiro apresentou ainda, "por uma ironia suprema", segundo um juiz, uma intervenção de Maria José Morgado quanto à não punição dos crimes de corrupção através do desporto. Mas a tese também foi rejeitada.

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