Escrutinar os negócios públicos

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Os recentes e sucessivos escândalos que envolvem significativas ajudas do Estado, quer no setor bancário quer no setor da aviação - com os recentes escândalos na TAP, empresa que contou com 3,2 mil milhões de euros de ajudas no âmbito do seu plano de reestruturação ou, ainda, a notícia de que na TAP a contratação de diretores tem vindo a aumentar e as remunerações pagas também - exigem que se acautele a opacidade generalizada relativa aos atos de governação pública.

Torna-se, assim, crucial escrutinar os negócios públicos. Desde logo, salvaguardando o imprescindível princípio da confiança na governação, uma vez, segundo o Eurostat, Portugal é, a seguir à Grécia e à Itália, o país da União Europeia com maior peso na divida pública em % do PIB. De facto, o desenvolvimento de um país e a promoção de uma boa governação devem assentar numa lógica de procura constante de promoção de confiança junto da opinião pública, considerando que não se pode reduzir a democracia a uma simples dimensão institucional, baseada na prática do sufrágio universal.

Num momento em que o nosso país enfrenta o desafio de implementar investimentos no âmbito do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) - relançando a economia - cabe robustecer a governação assegurando uma criteriosa afetação desses fundos e consequente monitorização. Além do mais, importa incentivar a participação democrática dos cidadãos na resolução dos problemas nacionais se poderá preservar uma democracia equilibrada e sã. É necessário atrair à participação política pessoas qualificadas e que respondam às exigências do interesse público, capazes de responder aos desafios impostos pela inerente dinâmica da democracia. Será também indispensável que grupos da sociedade demonstrem uma vitalidade política, assim como interesse pela ação política e pelo debate político.

Precisamos de um novo tempo, um tempo que exija maior escrutínio das decisões e dos negócios públicos. Para evitar o enfraquecimento da democracia, exige-se mais fiscalização dos negócios públicos, processos mais transparentes e decisões mais criteriosas e fundamentadas. A consolidação da confiança na governação é essencial pois, como alerta Joseph Stiglitz, se a erosão da confiança prejudica não só a economia como a política, pode ter danosos no funcionamento da democracia.

É identicamente fundamental para a economia que se promova políticas públicas mais adequadas ao desenvolvimento económico. E se o futuro do país está condicionado pela boa gestão dos fundos do PRR importa considerar que a resposta às crescentes desigualdades (sociais, económicas e territoriais) anda também associada à boa governação política. E quando em Portugal os cidadãos, sobretudo a denominada "classe média", suportam uma compressão salarial (dada a inflação dos preços dos bens alimentares e dos combustíveis) e uma fortíssima pressão fiscal, o maior desafio político que se coloca será o de responder a um crescente sentimento de falta de equidade social.

Professora universitária e investigadora

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