Escócia
Uma ilha? Claro. É uma ilha, a Grã-Bretanha. Uma grande ilha com três países unidos pela mesma coroa. E no Norte dessa ilha fica a Escócia, que continua a reclamar a independência perdida em 1707. Os escoceses gostam de vir a Portugal pelo sol, que têm pouco, e pelo golfe, que inventaram. Nós elegemos a Escócia porque a ocasião era especial e os indicadores aterraram ao mesmo tempo nessa parte do mapa. Sem praias de palmeiras nem hordas de turistas a arrastar chinelo pelas esplanadas, era o destino mais que perfeito.
Numa manhã de Novembro, rumámos a Edimburgo com dez dias na bagagem e aquela vontade, de anos, de querer conhecer tudo. Havemos de voltar para o resto, garantido, mas o que a Escócia nos deu não cabe nas fotos, nos cadernos de viagem e, muito menos, neste texto.
Bem vistas as coisas, nem faz grande sentido estar a escrever isto. Como se explica o primeiro impacto com o castelo de Edimburgo e a agitação da Royal Mile, que o liga ao palácio real de Holyroodhouse? Como se descreve a velhota que entorta a igreja para nos colocar direitos no retrato? Como se fala daquele arzinho frio que faz corar e do sol a dourar a Princes Street e do silêncio oco da neve a cair sobre os torreões de Stirling e o vale do Spey?
Que será feito do Andrew, o reformado de Pitlochry, que de tão contente pelas visitas não parava de tirar dos bolsos mãos-cheias de moedas? "Bebam mais um copo. Peter, dá aí um de Islay, que é a ilha onde nasci. Os portugueses são como nós, sim, temos os ingleses e os espanhóis atravessados como espinhas."
E as escadas para salmões? E o australiano de apelido Wallace que só queria ver o monumento ao seu "antepassado"? Há palavras que exalem o odor da turfa e do malte a destilar e do uisge beatha ("água da vida", belo nome) a envelhecer em pipos de carvalho embebidos de sherry ou Porto antes de lhe chamarmos whisky? Puro malte, please, embora de Strathisla saia um dos mais famosos blended do mundo.
Banff, e aquele Bed & Breakfast fabuloso. O estufado de caça em MacAduff. As vilazinhas piscatórias em direcção a Elgin. Inverness, capital das Highlands, o castelo e a ponte pênsil a abanar com as bicicletas. O Loch Ness, imponente. Eles fingem que têm um monstro, nós fingimos que acreditamos. As ruínas encantadas de Urquhart (na foto). A sopa na abadia de Fort Augustus, divina.
O Ben Nevis rodeado de munro's, meras colinas ao lado da Estrela ou do Marão. Oban, com as ruas íngremes e o "coliseu" de McCraig, mais um porto de ferries para as ilhas. Dunstaffnage, outro castelo assombroso. O salmão grelhado do almoço com vista para o Loch Lomond e os barcos de recreio. A fervilhante Glasgow, capital da indústria e de artistas, com aquela planta em forma de pizza recheada de ruas e casinhas, mesmo em frente à catedral.
A saudade anunciava-se à despedida, por lembranças feitas de Radio Scotland, estradas despovoadas, paisagens glaciares, cascatas, ovelhas de cabeça negra, lendas, clãs e histórias sangrentas, museus, gaitas de foles, kilts de domingo, pequenos-almoços heróicos, lanches de chá com scones e jantares tranquilos. Havemos de voltar para o resto, garantido.
Sugestões? Um bom guia (Lonely Planet, Michelin ou American Express, por exemplo), ouvido apurado para o sotaque e algumas libras extras no bolso é tudo o necessário para delinear uma rota, alugar carro e esquecer datas e horários. Conduzir pela esquerda não é nenhum drama: cinco minutos depois o cérebro está adaptado. Os hotéis e Bed &Breakfast estão em qualquer parte do caminho e a hospitalidade é ponto de honra - mas atenção aos fins-de-semana em Edimburgo, porque a cidade enche com a romaria de escoceses vindos de toda a parte.