Erros num adeus difícil e com lágrimas que vai obrigar a muita reflexão
O sonho terminou e as lágrimas de Cristiano Ronaldo a sair do relvado e a desmanchar-se no túnel de acesso aos balneários diziam tudo. Foi um adeus difícil, com Portugal a despedir-se do Mundial 2022 nos quartos-de-final com uma derrota frente a Marrocos, por 1-0, fruto de um erro do guarda-redes Diogo Costa. Mas o guardião portista não pode servir de bode expiatório. Houve outros lapsos. O jogo pedia outra abordagem, até porque havia o exemplo do desafio com a Espanha para tirar ilações sobre a forma de jogar dos africanos. Também faltou sorte, sobretudo nas várias oportunidades de golo quase sempre com João Félix como protagonista.
Twittertwitter1601623390112321541
Agora os próximos dias serão para balanços, a começar pela continuidade de Fernando Santos como selecionador (tem contrato até 2024) e se este pode ser o fecho de um ciclo na seleção - no regresso a Lisboa vão existir reuniões entre o técnico e o presidente Fernando Gomes. E também perceber quais foram as reais consequências do caso Ronaldo no seio do grupo, ele que este sábado voltou a sentar-se no banco de suplentes, entrando só na segunda parte.
Outra questão importante será descortinar até que ponto será ainda possível a coabitação entre CR7 e Santos na mesma equipa, pois ficou demasiado evidente a insatisfação do capitão com a condição de suplente. E, já agora, se a continuidade do selecionador no cargo poderá levar Ronaldo a abdicar da seleção nacional.
À partida, parece difícil que possam voltar a coabitar. Por mais que o selecionador tenha tentado fazer passar a mensagem de que a relação não saiu abalada, e que o grupo não se deixou afetar, os sinais foram demasiado evidentes. E se calhar nos próximos dias serão conhecidos novos episódios deste caso que nem sempre foi bem gerido pela comunicação da FPF
O futebol é também feito de erros e Portugal pagou caro um lance ao minuto 42. Attia Allah fez um cruzamento na esquerda e En-Nesyri cabeceou para o golo aproveitando uma péssima saída do guarda-redes Diogo Costa, num lance em que Raphaël Guerreiro devia ter marcado melhor o avançado africano.
Twittertwitter1601604682031538176
Mas as culpas não podem morrer só aqui. Longe disso! Portugal estava avisado para os perigos desta seleção marroquina e o jogo dos oitavos-de-final contra a Espanha era a melhor referência. Uma equipa que dá a iniciativa ao adversário, que joga num bloco baixo e que depois sai bem para o ataque com transições rápidas a tentar aproveitar os espaços.
Fernando Santos deve ter visionado várias vezes o jogo com a Espanha. Mas ou não passou bem a mensagem, ou os jogadores não a souberam interpretar. Na primeira parte, Portugal não conseguiu desmanchar a estratégia dos africanos. Faltou velocidade, intensidade e criatividade, apesar de João Félix ter tido três boas oportunidades. A primeira logo aos 4", num cabeceamento travado pelo guarda-redes Bono. Depois aos 31" tentou a sorte de longe e aos 39" num remate de primeira por cima. Em cima do intervalo, Bruno Fernandes atirou à barra com um remate estupendo.
Twittertwitter1601629074073403392
As estatísticas ao intervalo mostravam Portugal com muito mais posse (66% contra 34%), mas Marrocos mais rematador (7-5). Um indicador que de muito teria de ser feito em termos de estratégia para a segunda parte.
Santos não mexeu ao intervalo, mas não demorou a ir ao banco, até porque logo no reatamento Marrocos esteve muito perto do segundo golo. E aos 51" colocou em campo Ronaldo e João Cancelo, abdicando de Guerreiro e Rúben Neves. Portugal ganhou mais velocidade e instalou-se de vez no meio-campo marroquino. Mas se já era difícil desmontar a muralha africana, tornou-se ainda mais complicado com a equipa toda fechada atrás.
Gonçalo Ramos, aos 58", teve uma boa ocasião para fazer o empate, mas atirou ao lado. Aos 64" foi a vez de Bruno Fernandes errar o alvo. Santos voltou a mexer, lançando Rafael Leão e Vitinha no jogo. Era o tudo por tudo, numa tentativa de pelo menos chegar ao empate. Mas nesta altura o coração já falava mais alto. Portugal dominava, mas a forma como os marroquinos defendiam criava muitas dificuldades à seleção nacional. Aos 83", Félix voltou a ter o golo nos pés, mas desta vez o remate foi travado por Bono. Já nos descontos, Ronaldo permitiu nova defesa do guardião marroquino e aos 90"+7 Pepe quase marcou de cabeça.
O apito final chegou e o semblante dos jogadores portugueses contrastava com a alegria dos marroquinos, que se tornaram na primeira seleção africana a atingir as meias-finais de um Mundial de futebol. As câmaras direcionaram-se imediatamente para Ronaldo, que saiu cabisbaixo e já de lágrimas nos olhos. Mas foi no túnel de acesso ao balneário que se desmanchou. Uma imagem que vai permanecer durante algum tempo a ilustrar o fim de um sonho de uma das maiores gerações do futebol português, que no próximo Mundial vai contar com valores que já são uma certeza, mas que vai perder outros devido à idade, como são os casos dos capitães Cristiano Ronaldo e Pepe.
Não se pode classificar a campanha portuguesa de fiasco, mas se calhar soube a pouco, muito pelo facto de a eliminação ter sido aos pés de uma seleção teoricamente muito mais fraca. Agora o tempo é de muita reflexão. Mas parece certo que alguma coisa vai ter de mudar...