Erdogan ignora críticas e avança com polémico Canal de Istambul
O presidente turco, Recep Tayyip Erdogan, deu este sábado os primeiros passos para a construção do projeto que é o seu "sonho" mas que o próprio apelidou de "louco": um canal de 45 km que ligará o Mar Negro ao Mar de Marmara e servirá como alternativa ao estreito do Bósforo, que atravessa Istambul e divide a Europa da Ásia. Previsto para custar 15 milhões de dólares (especialistas alegam que custará quatro vezes mais) o projeto é criticado pela oposição, que alerta não só para os problemas de financiamento mas também ambientais.
"Nós vemos o canal de Istambul como um projeto para salvar o futuro de Istambul", disse Erdogan na cerimónia em que foi colocado o cimento nas fundações de uma ponte de menos de um quilómetros, que permitirá cruzar o futuro canal e liga outros projetos de infraestruturas na zona. "Estamos a abrir uma nova página na história do desenvolvimento da Turquia."
Este não é o primeiro megaprojeto do presidente, que inaugurou o novo aeroporto da cidade de 16 milhões de habitantes em 2018, a maior mesquita da Turquia em 2019 e, antes disso, quando ainda era primeiro-ministro, em 2013, o túnel ferroviário sobre o Bósforo.
O objetivo do novo canal, que deverá ficar concluído dentro de seis anos, é aliviar o tráfego no Bósforo - todos os anos passam por lá 45 mil navios e as previsões do governo é que possam vir a ser 78 mil em 2050 - e evitar acidentes. O estreito, uma das vias comerciais marítimas mais importantes, tem fortes correntes, curvas apertadas e há ferries constantemente a fazer a ligação entre as duas margens. Ainda na semana passada, dois pescadores morreram quando um navio colidiu com o seu barco.
Mas os críticos - entre os quais o presidente da câmara de Istambul, Ekrem Imamoglu, da oposição - alertam para os custos do projeto, indicando que nenhum navio quererá pagar para atravessar o canal quando pode usar gratuitamente o Bósforo. Além disso, há riscos ambientais, com o canal a representar um risco para o ecossistema local, havendo também quem alerte para problemas em caso de sismos. Na prática, o canal criaria uma "ilha" até ao Bósforo, onde oito milhões de pessoas poderiam ficar presas, sendo que também está previsto mais desenvolvimento urbano ao longo do canal.
Depois há as questões militares. Ao abrigo da convenção de Montreaux de 1936, Ancara controla o estreito onde a passagem de navios em tempos de paz é gratuita, restringindo contudo a passagem de navios militares que não pertençam a países do Mar Negro (havendo ainda limitação à sua tonelagem ou às armas que podem transportar). No caso de países que não têm costa no Mar Negro, os navios só podem ficar 21 dias. Erdogan já admitiu que o novo canal não estaria sujeito a essas regras.
susana.f.salvador@dn.pt