Entrevista Paulo Lobo Antunes: "O meu apelido pode causar inveja"
Chegou, viu e venceu na TVI?
Pois, foi assim muito repentino. Lembro-me de que foi aqui neste estúdio [Valverde] que vim fazer um casting para o Deixa-me Amar, não tinha qualquer expectativa, não sabia o que era, nem o texto. Cheguei, fiz, saiu toda a gente... no dia seguinte ligaram-me para me oferecer o papel. Foi mais ou menos isso: chegar e conseguir. O engraçado é que foi logo a primeira protagonista numa novela da TVI... E vejo isto como um reconhecimento pelo meu trabalho. Penso que, de certa forma, já tinha trabalhado durante tanto tempo como actriz que, se calhar, já estava na altura de ser conhecida. Correu de uma forma muito justa.
Até Deixa-me Amar só tinha feito uma participação numa novela portuguesa, Floribella. A Lara de Deixa-me Amar e a Salomé de Flor do Mar chegaram mesmo na altura certa...
Chegou tudo na altura certa. Aproveitei a oportunidade que me deram, mostrei que trabalhava bem, fiz com que gostassem do meu trabalho e da minha maneira de ser, da minha disponibilidade e profissionalismo. Das coisas que mais me orgulho é de ter uma ética de trabalho bastante rigorosa e eficaz.
Mas já tinha feito outros castings para a NBP, hoje Plural?
Já, há uns anos. Mas nunca tinha entrado.
Então o que é mudou?
Acho que era o papel certo [Lara]. Eles procuravam uma maria-rapaz que tivesse alguma força, que pudesse ser uma kickboxer. Se calhar, o papel estava destinado para mim. (risos)
E as novelas é o registo que mais lhe agrada?
É um registo diferente. Não consigo dizer se me agrada ou não. Eu gosto muito de trabalhar... o que me importa é aquela altura do "acção" e do "corta". Gosto muito de criar a personagem, do que acontece à volta. E depois é tudo ao primeiro take, é muito espontâneo... exige uma enorme concentração e uma preparação tremenda, que é o que faço. Mas claro que em teatro temos outra experiência. É fazer todas as noites aquela peça. E depois é aquela coisa indissociável do teatro: todas as noites não se sabe o que vai acontecer.
Está a parecer-me nostálgica quando fala de teatro. Está a "ressacar"?
Sim, um bocado. (risos) É que fui duas vezes ao teatro há duas semanas e cada vez que entro num teatro fico com arrepios. Sinto a adrenalina. Fiquei com uma sede de fazer... mas não fiquei ressabiada.
Está a correr-lhe bem a vida na TVI, portanto...
Está.
Esperava que lhe corresse tão bem?
Nunca pensei nisso, porque quando estou a fazer um trabalho foco-me no que estou a fazer e não penso, mesmo agora, no que vou fazer depois. Isso seria dispersar-me do trabalho.
Tem contrato de exclusividade com a TVI?
Dessas coisas não gosto de falar. (risos)
Nem de quando termina o seu vínculo?
Dessas coisa não gosto mesmo de falar.
Em Deixa-me Amar era a heroína. Em Flor do Mar é uma vilã da pior estirpe. Veio mesmo a calhar duas personagens tão antagónicas...
Vieram. E, sim, é bom podermos mostrar o nosso leque de personagens. Calhou mesmo no momento certo. Nunca tinha pensado em fazer vilãs ou antagonistas... Só quero é fazer papéis bons, personagens consistentes, bem definidas. E esta personagem [Salomé] é excelente. No início lembro-me de dizer: "Ela não é vilã, não pode ser porque não existem pessoas assim tão más."
Onde é que foi buscar tanta crueldade para interpretar Salomé?
(risos) Está escrito.
Mas não se inspirou em ninguém?
Vi muitos filmes e há um em particular que tem uma actriz norte-americana que me deu muitas ideias, mas não posso divulgar porque é segredo. Talvez o faça no final [da novela]. Mas quando o texto está escrito, as coisas saem-me naturalmente.
Diz. Mas sente...
Sinto. Tudo o que faço ou digo a representar vem de dentro. Na Salomé o que mais sinto dentro dela é uma injustiça. E é nisto que me concentro. Os pais mentiram-lhe, ela não sabia quem era, só há pouco é que descobriu. Foi por esse lado da injustiça que a construí. Ela quer vingança, mas quer ser feliz.
Quer dizer que ela não é tão má como parece?
É óbvio que as coisas que ela faz são maldosas, agora ela fá-las porque sente necessidade. Ela quer justiça. Ela não mata por frieza, por paixão. Ela matou ou por raiva ou revolta ou injustiça. É por sobrevivência.
Entre a Lara e a Salomé ainda teve a Adélia de Equador, uma pseudopuritana. Mais um registo desafiante...
Já fiz muitos trabalhos de época, por isso estava muito confortável. Agora, nunca trabalhei para que fosse cómica. Trabalho sempre na verdade das personagens e o que faz as pessoas rir são as desgraças das personagens quando são verdadeiras: porque ela está com aqueles calores, com aquele sofrimento... é cómico. Lembro-me de ter falado com o André Cerqueira e ele disse-me: "Vai até ao limite." Mais uma vez, é o que está escrito e basta sermos fiéis para se tornar naturalmente cómico. Pelos vistos, as pessoas estão a gostar imenso da Adélia e eu divirto-me imenso com ela. (risos)
Consegue eleger a personagem que mais a desafiou?
(pausa) Acho que foi a Lara, porque tinha de conquistar o público. Era o meu primeiro papel e a primeira novela intensa. Depois tinha os treinos de kickboxing. Mas é claro que cada uma tem particularidades diferentes. Como a Lara foi a primeira foi a que, se calhar, me desafiou mais. Agora, com a Salomé, lembro-me da minha melhor amiga me dizer: "Cuidado com a Salomé." E é verdade, isso pode ser complicado, porque posso estar a fazer 20 cenas e toda a gente estar a dizer mal dela... e eu sempre a aguentar como se nada fosse com ela. Não mata, mas mói. E quando vou para casa dou por mim a dizer "Eu não sou assim tão má."
Sente-se contaminada pela Salomé?
Às vezes sinto.
É difícil desligar o botão e ser a Paula?
Consigo desligar. Basta simplesmente tirar a roupa e os saltos da Salomé que mingo. No outro dia aconteceu que estava arranjada para entrar em cena e andei assim pelo estúdio. De repente, senti um poder que disse para mim: "Estou invencível como a Salomé." Depois quando me despi e voltei à Paula senti-me logo mais vulnerável.
A versatilidade é o que distingue uma má de uma boa actriz. Sente que já provou que é uma boa actriz?
Cada vez que me apresentam um papel novo, eu invisto muito nele. Dou tudo: sangue, suor, lágrimas. Se isso faz de mim boa actriz, não sei... as pessoas parece que gostam.
Tem noção de que o seu ainda curto percurso na TVI é invejável?
Acho a inveja tão feia.
Nunca se sentiu invejada?
(pausa) Prefiro nem pensar nisso, porque é negativo e afasto-me. Sei que existe, também não sou completamente ingénua. E já ouvi coisas não muito agradáveis, mas passa-me ao lado. Não sei como é que a palavra inveja não está no hino nacional, porque é um sentimento geral do português. (risos)
E não se sente a menina dos olhos de José Eduardo Moniz?
Eu sou a menina dos olhos do meu pai. (risos) Reconheço que ele [José Eduardo Moniz] aposta em mim, acredita no meu trabalho e até já me disse, tal como o fez publicamente. Sinto-me lisonjeada e orgulhosa. Mas ele tem tantas meninas, há tantas actrizes fantásticas na Plural.
Então sente-se uma menina dos olhos dele?
Sinto que faço parte da família das actrizes que ele tem e com quem gosta de trabalhar. Ele percebe que sou uma pessoa séria.
No início da sua carreira usava o nome da sua mãe. Era a Paula Plantier. Porque é que mudou para Lobo Antunes?
É o apelido da minha mãe e nessa altura estava em Londres. Em Inglaterra e nos EUA, se aparece um currículo com um nome que eles não conseguem pronunciar, põem logo de parte. Nessa altura pensei em várias opções e Paula Plantier soou-me bem e eles gostaram. Depois mudei, mas não foi porque quis. Quando vim para Portugal e fiz o meu primeiro trabalho para a RTP, João Semana, estava no nome artístico Paula Plantier, nome legal, Paula Lobo Antunes. E perguntaram-me qual queria para aparecer na ficha técnica. Eu disse que o meu nome artístico era Paula Plantier. Mas quando saiu a primeira notícia numa revista eles aproveitaram o Paula Lobo Antunes porque é mais mediático. E assim ficou. E descartei-me porque ficou fora das minhas mãos. E depois é o meu nome, não tenho de ter vergonha.
Acredita que o apelido Lobo Antunes lhe abriu alguma porta?
Acho que pode abrir e pode fechar. Como pode causar inveja. Mas como é um nome de grande mérito. Se abriu ou não, lá está, é uma coisa em que não gosto muito de pensar. Gosto de pensar que o mérito é meu, o nome também é meu. Nós merecemos os nomes que temos, o que nós fazemos deles é o que importa. E acho que o tenho segurado bem.
Mas acha que vive à sombra do nome da família Lobo Antunes?
Não. Até porque já aconteceu o meu pai [o neurocirurgião João Lobo Antunes] receber doentes que lhe perguntam: "Você é alguma coisa à actriz Paula Lobo Antunes?" (gargalhada) E eu acho lindo. E já me ligou uma vez a dizer que estava lá uma menina que queria falar com a Lara. E eu: "Ó pai, que vergonha." (risos)
Como é que o seu pai e o seu tio [António Lobo Antunes], que têm carreiras estáveis, vêem o seu percurso numa profissão instável?
O meu pai sabe que eu trabalhei e sofri muito quando estudei em Londres. E sabe que esta profissão é complicada. Mas ele diz-me sempre a mesma coisa, aproveitar cada trabalho que tiver para fazer o melhor que posso. Lembro-me bem de quando ele foi ver a minha primeira peça em Londres, Electra, que estava muito nervoso, ansioso. No final, ele disse-me: "Agora já posso respirar, afinal não é má actriz. Ainda bem que fez o curso." E fiquei orgulhosa. Mesmo assim, ele continua a insistir que devia ir para Medicina. Ainda continua com essa imaginação muito fértil. Mas não, se fosse para ser já tinha sido há muito tempo.
Chegou a exercer biologia médica?
Não. Estava nos últimos exames do curso e estava a pensar ir para Medicina . E estava a ver os livros de várias universidades quando vi uns cursos de teatro. E surgiu-me a ideia: "Ah, e se eu fosse para um curso de teatro?" E fi-lo, sem dizer aos meus pais.
E como reagiram na altura em que descobriram?
A minha mãe ficou muito orgulhosa. Nessa altura vivia em Edimburgo e viajava de comboio até Londres para ir aos castings. E a todos a que fui a minha mãe veio ter comigo. No primeiro lembro-me de que estava tão nervosa que a minha mãe me segurava no cabelo e me fazia festas nas costas enquanto eu vomitava. (gargalhada) A minha mãe é a minha fã número um. O meu pai ficou receoso, estava na dúvida. Mas sei que eles estão muito orgulhosos, porque investiram em mim e tiveram o retorno.
Com 33 anos, e tendo vivido em tantos lugares, sente-se uma mulher do mundo?
Sinto-me uma pessoa bem vivida, com uma cultura vasta. Mas claro que posso ser muito mais. Sinto que tenho uma grande experiência. Já viajei muito, já vivi em vários sítios e tive muito a ganhar com isso. Portugal é um país fantástico, mas é pequenino. E o mundo é enorme.
E gostava de continuar a trabalhar cá ou testar-se noutros registos lá fora?
Para já estou muito bem cá. Se surgir oportunidade de ir lá para fora, claro que sim, nunca digo não. Num futuro próximo penso que Portugal é o meu alvo.
Ir para outro lugar do mundo podia atrapalhar o seu namoro com Jorge Corrula... Acredita no amor à distância?
Amor, quando é amor, é amor. Como actores sabemos as nossas prioridades, que é basicamente o trabalho. (pausa) Mas não sei porque isso nunca se proporcionou. Já estivemos a trabalhar longe um do outro. E mesmo agora a fazer a mesma novela é quase como se estivéssemos distantes.
Pensei que trabalhando na mesma novela estivessem mais tempo juntos...
Não, porque os nossos horários nem sempre coincidem. E como novela é um trabalho tão intenso o meu foco é muito à volta dele. Por isso temos menos tempo para nós, para a família e para os amigos. É quase como se estivesse a trabalhar noutro país. O que queremos é trabalhar e estar bem no trabalho porque se isso acontecer estamos bem connosco próprios e com quem está à nossa volta. Se isso acontecer, depois vê-se. Mas, se o amor existe, resiste.
E que planos têm para o futuro... Vamos poder vê-los a casar-se nos próximos tempos?
Não sei. Nós vivemos o dia-a-dia. Já foi escarrapachado em todo o lado que fomos casados, já tivemos essa vacina.
Já namorava com o Jorge Corrula quando uma revista escreveu que a Paula ainda era casada com Oliver Burns. Nessa altura disse que estava em processo de divórcio. Nunca houve constrangimentos da parte dele ou do seu ex-marido?
Claro que não. Até porque isto é um assunto privado e eu não falo sobre isso. As pessoas não têm nada a ver com isso e essa notícia foi uma incógnita. Dá-me vontade de rir. O que sai nas revistas está fora do meu controlo e nem vou chatear-me nem alimentar essas coisas. Nós somos actores, sérios, temos uma relação, sim, as pessoas sabem e não há mais nada a dizer.