Entretanto, na Oxford Street
Para combater a diminuição gradual do número de visitantes e a proliferação crescente de lojas descaraterizadas na Oxford Street em Londres, o Westminster City Council lançou o programa Meanwhile On: Oxford Street, que oferece arrendamento gratuito durante seis meses em diversas lojas de localização privilegiada, a par de um pacote de incentivos, incluindo design de interiores, orientação de consultores de retalho independentes e apoio de especialistas em relações públicas e marketing. Um programa ambicioso, que vai durar três anos, para que uma das vias de maior renome mundial possa atuar como incubadora de novas abordagens e com isso recuperar o prestígio de outrora.
Procuram-se candidaturas em áreas tão diferentes como inovação e tecnologia, ciência e invenção, inclusividade, métodos avançados de design e fabricação, sustentabilidade, comércio experimental e, também, cultura e entretenimento.
Atualmente a Oxford Street recebe uma média de 1,24 milhões de visitantes por mês, pelo que em seis meses serão mais de 7 milhões de pessoas que passarão por esses espaços. Agora, imagine-se que algumas dessas lojas são ocupadas com projetos culturais pop-up. Por exemplo, uma loja conceito de música clássica como descrita por Matt Belcher: um espaço para grupos de câmara ensaiarem, em que o público pode ver pela janela a música a acontecer e entrar para ouvir. Ou um espaço dedicado à língua portuguesa com debates, exposições e residências, uma montra desse novo conceito da cidadania da língua.
A ideia não é nova, um pouco por todo lado vão surgindo iniciativas que procuram ocupar espaços vazios com artes e cultura: espaços de criação de artistas visuais, ateliers de moda, instalações imersivas, projetos participativos ligados às memórias, ou centros de dança vibrantes.
Vivemos um tempo em que tudo flui rapidamente, num panta rei inevitável, em que tudo passa, tudo é móvel, transitório, passageiro. Mas também um tempo em que as fronteiras são muitas vezes subtis entre trabalho e hobbies, vida privada e pública, atividades online e offline. Talvez por isso os espaços pop-up sejam tão atraentes, pois proporcionam uma experiência gratificante, diferente, original, muito próxima e, ao mesmo tempo, efémera. São espaços que se destinam a chamar à atenção e depois a desaparecer.
Numa cidade, a presença de "espaços inúteis", "em transição" ou "temporariamente fora de uso" (públicos ou privados, grandes ou pequenos) é quase inaceitável, tendo em conta a forte procura de espaços abertos e públicos. Além de que espaços vazios têm um impacto negativo, atraindo atividades indesejáveis e vandalismo e criando uma impressão de abandono. Por isso, o seu uso temporário pode contribuir para uma abordagem mais contemporânea, flexível e espontânea do desenvolvimento urbano. A integração temporária dos espaços de espera na chamada "cidade intermitente", de que falam Farone e Sarti, 2008 e a sua utilização por utilizadores alternativos e menos evidentes, podem tornar-se verdadeiros viveiros de inovação urbana. Um bom exemplo em Lisboa é o Quartel do Cabeço de Bola onde a LARGO Residências criou, em 2022, um pólo cultural temporário num antigo quartel da GNR, até que o Estado o transforme em habitação. Outro bom exemplo é o Mercado P"LA ARTE que, desde 2021, ocorre todos os meses num parque de estacionamento no Prata Riverside Village em Marvila até este estar construído e a funcionar.
Continuamente artistas apropriam-se de espaços das cidades com a intenção de socializar a arte, sendo estimulante a perceção da urbe como um organismo vivo que possibilita as trocas de experiências individuais e coletivas, características inerentes às ruas e aos espaços públicos das cidades.
O pop-up é, pois, um modelo promissor de organização participativa que tem um impacto transformador um pouco por todo o lado. Não se trata de normalizar a provisoriedade, que pode trazer situações dúbias e ilegais, nem tornar regra arrendamentos de curta duração, mas encarar ocupações provisórias como uma opção urbanística pontual e estruturada assente na proximidade.
Naturalmente, nem todas as cidades abraçam a criatividade com o mesmo entusiasmo, nem todas as cidades conseguem conciliar estratégias de governança de alta cultura e atividades criativas disruptivas e nem todas as cidades encaram a utilização de espaços desocupados com a mesma perspicácia. Assim como há cidades mais conservadoras, tanto no que diz respeito ao público, como quanto à forma como são governadas, em que é mais difícil criar por iniciativa pública espaços pop-up, mas indiscutivelmente é um caminho a explorar.
Há dias, o jornal Expresso trazia um retrato da Baixa de Lisboa: um terço das lojas estão fechadas, mais de 100. Algumas pertencem a entidades públicas, nomeadamente, à Santa Casa da Misericórdia de Lisboa e à Câmara Municipal de Lisboa. Muitas razões existirão para este cenário tão diferente daquele que fazia da Baixa o grande centro comercial do país e será seguramente complexa a forma de inverter esta situação, mas importa encontrar soluções, rapidamente, juntar esforços, trabalhar em sintonia, estudar alternativas, decidir e atuar o quanto antes com eficácia, ousadia e criatividade. Deixar andar sem definir uma estratégia e prolongar o sofrimento é cómodo, mas não o que é necessário e se exige a Lisboa.
Jurista e Gestor Cultural. Curador da Associação Portugal Brasil 200 anos