Entregues a nós próprios
Como ficou o mundo depois das eleições na Alemanha? Um pouco mais confuso e instável. Angela Merkel saiu debilitada, à procura de um governo com dois partidos com visões contraditórias sobre o presente e o futuro da Europa, ou seja, um governo que o Vasco Pulido Valente alemão poderia designar de "geringonça" e com uma oposição que envolve um partido de extrema-direita nacionalista. No outro pilar europeu, a França, temos um presidente com boas ideias e intenções, sem uma base de apoio consolidada, quer política quer socialmente, com forças sindicais poderosas dispostas a ter tudo para impedir as reformas modernizantes do presidente. Se estes dois países essenciais à reforma da União estão em situação debilitada, o resto da Europa que conta não parece poder ajudar ao fortalecimento da coesão interna e da afirmação da Europa no plano internacional.
O Reino Unido está de saída da União, não tem liderança à altura do desafio e tem uma oposição à esquerda esclerosada, sem ideia alguma das transformações em curso na economia global. A Itália à espera de eleições das quais não resultará um governo com voz forte no contexto europeu e a Espanha a braços com o problema insolúvel da Catalunha e sem um governo com apoio parlamentar prioritário. A Polónia e a Hungria seguem uma via autoritária em busca de um modelo político que se afasta do padrão democrático da União Europeia.
Ou seja, por todo o lado governos fracos com forças nacionalistas, senão xenófobas, a prosperar.
Se a situação na Europa não é famosa, os Estados Unidos elegeram uma personagem com traços psicóticos, apalhaçado, que não sabe distinguir um reality show televisivo com a presidência da maior potência mundial. O Brasil em decomposição das elites políticas e económicas, sem horizonte de futuro previsível, com um sistema constitucional que conduz à ingovernabilidade, apesar de alguns sinais positivos na economia.
Em contraste, a China tem liderança, estratégia e as táticas para prosseguir o seu caminho ascendente. A Rússia tem um czar com o know-how para explorar as fraquezas das democracias que governam a Europa e a América.
É este o contexto com que Portugal tem de contar. Entregue a si próprio! Não se espera que as instituições europeias que nos tutelam e vigiam mudem as regras a que temos de obedecer.
Nos próximos anos, ou diminuímos a nossa dependência com o exterior para tornar a dívida suportável, ou mais tarde ou mais cedo voltaremos ao "triste fado" que já conhecemos.
Mas parece que os partidos à esquerda que suportam o governo PS vivem num delírio que despreza a realidade. Percebo como é difícil suportar políticas para quem sempre defendeu o seu contrário. Daí o equilibrismo com que o governo tem atuado. A sorte, o esforço e a competência dos empresários que criam riqueza no turismo e nas exportações, a par de um alívio para os consumidores, têm permitido o surto de progresso que estamos a viver. A confiança retomada dos agentes económicos pode tornar o crescimento económico durável. Mas se a folga que o crescimento proporciona ao Estado for por este utilizado para mais despesa não reprodutiva, e não para alívio fiscal e amortização da dívida, não sairemos vencedores.
Por uma imprensa livre, responsável e independente
As minhas responsabilidades num grupo de comunicação social inibem-me de comentar com independência o comportamento de outros que exercem a mesma atividade.
Mas não posso deixar de me pronunciar sobre um facto que me entristece pelas repercussões que pode ter na credibilidade da imprensa de referência. Refiro-me ao destaque dado a um patético relatório atribuído a "secretas", que se verificou não ser de qualquer organismo oficial.
Quero acreditar na boa-fé de quem deu guarida a essa manipulação. Nenhum órgão de comunicação social está a salvo do erro, o que importa é identificá-lo quando acontece e estar disponível para o reconhecer.
A comunicação social só pode distanciar-se do "lixo" que invade as redes sociais e sobreviver com independência se mantiver uma permanente vigilância no respeito pela verdade, pelo rigor, pela distinção entre factos e opiniões e pelo contributo que der a um saudável convívio democrático. Só assim poderá ter a preferência dos cidadãos conscientes, que são seguramente a maioria.