H á pouco mais de uma década, um site na internet funcionava como um meio de comunicação tão unilateral quanto um jornal ou um livro. Se alguém queria responder ou trocar alguma informação, teria de fazê-lo por telefone ou e-mail . Depois apareceu aquilo a que se costuma chamar a internet de segunda geração - a Web 2.0, cunhada pela empresa americana O'Reilly Media para designar uma internet em que o utilizador é parte ativa no processo de partilha e recebe informação com a mesma facilidade com que a fornece. Os conteúdos ganharam uma dinâmica ímpar: explodiram serviços de relacionamentos sociais e páginas de vídeo, a internet cresceu como horizonte de oportunidades, a rede tornou-se de partilha dinâmica, aberta às interações entre utilizadores. Nasceu um mundo novo, a funcionar paralelamente ao real, mas onde as empresas e serviços passaram a atuar. A comunicação profissionalizou-se. . Foi neste ponto que se tornou necessário encontrar novos especialistas em redes sociais, gente capaz de produzir conteúdo relevante nos tempos que correm, pessoas que saibam como interagir com os internautas e fidelizá-los através de novas ações. O mercado de trabalho não precisa só de advogados, médicos, economistas e professores. Pelo contrário, começaram a aparecer os arquitetos da informação, analistas de mediaonline , analistas de pay per click , consultores em e-commerce , especialistas em otimização de sites , especialistas em social media , web developers , profissionais de suporte e tantos outros. E há (ciber)espaço que chegue para todos. . David Pinheiro começou a sua empresa em outubro de 2009, depois de ter aprendido a mexer em Google na Empregos Online - «uma empresa que respirava este universo digital» - e de trabalhar no departamento de marketing da Inosat, onde era responsável pela dinamização de todas as campanhas online da empresa. Licenciado em comunicação empresarial, não sabia então que viria a trabalhar quase 24 horas por dia para gerir campanhas pelo mundo todo, Brasil incluído (uma das vantagens do virtual é permitir trabalhar onde quer que se esteja, sem barreiras físicas). Nem que se tornaria brilhante a desenvolver estratégias de marketing online à medida do produto e dos valores do cliente. . «No início era difícil explicar a essência do nosso trabalho», revela o empresário de 33 anos. Ainda hoje é: David é diretor da empresa Sales Engine Online e especialista em search engine marketing , uma extensão do marketing empresarial que torna os sites visíveis nos motores de busca na internet. O seu trabalho, explica, consiste em fazer análises de mercado para conhecer o comportamento do consumidor, permitindo que os seus clientes tenham noção de qual o melhor público para cada um dos seus produtos, maximizem transações e possam aumentar as vendas desde o momento em que a campanha fica online . «Dado que trabalhamos imenso com redes sociais e motores de busca, é também crucial a análise às palavras-chave que estão, ou não, a converter, bem como uma análise comportamental dos utilizadores que visitam as nossas páginas.» . Hoje, David fala de igual para igual com as empresas que o contratam sobre custo por clique, custo por mil impressões ou custo por lead , mas foram conceitos complicados de passar. «Felizmente o mercado tem crescido imenso, o que facilita a interiorização. O próprio panorama das redes sociais evoluiu bastante: se há uns anos poucos sabiam o que era o Facebook, hoje é raro conhecer alguém que não tenha perfil na rede. Até a minha mãe, que é reformada, tem», nota. No fundo, a interação rápida entre as pessoas veio potenciar aquilo para que o marketing sempre existiu: o papel de medir e prever o comportamento dos consumidores. . Também para Bruno Figueiredo, de 37 anos, partner da Ideias e Imagens, a lógica passa muito por perceber de pessoas, dinâmicas de consumo e utilização dos espaços na rede. Desenha sites há 18 anos. Começou a trabalhar na Tinta Invisível, primeira empresa de web design em Portugal, e cresceu com a internet. Atualmente é user experience designer , outro trabalho aparentemente difícil de definir, mas bastante óbvio: Bruno tem de assegurar que os produtos digitais, páginas e aplicações são fáceis de usar e se adequam às necessidades dos públicos-alvo. . «Comecei na universidade a discutir o tema da usabilidade com outros interessados e especializei-me gradualmente, com material de estudo encontrado em sites , conferências, workshops e uma ida para Londres em 2006, onde colaborei com as maiores agências digitais europeias para adquirir experiência internacional», adianta o empreendedor. Formado em arquitetura e presidente da Associação Portuguesa de Profissionais de Usabilidade, no segundo ano do curso apaixonou-se pelos computadores com acesso à internet com que equiparam o centro de informática da Faculdade de Arquitetura da Universidade Técnica de Lisboa. No ano seguinte estava na Tinta Invisível e começou a interessar-se pelo planeamento e a área da experiência de utilização. Uns anos mais tarde, quando foi docente na faculdade onde estudou e teve de gerir o site da instituição, já dominava os princípios da usabilidade, uma das funções mais bem pagas deste universo digital. . «É uma atividade muito importante em termos de competitividade dos sistemas de informação produzidos em Portugal. Temos programadores e designers excelentes, mas os produtos ainda têm problemas de usabilidade e interação e, chegados ao mercado internacional (e até nacional), não conseguem competir no mesmo patamar e são preteridos pelos estrangeiros», conta Bruno. «Atualmente há imensa procura de user experience designers e muito poucas pessoas disponíveis. Tanto, que lá fora são os mais bem pagos na área de new media , chegando a receber mais do que programadores - podem ganhar dez mil euros por mês, quando cá alguém muito experiente leva até 2500 euros.» . Ivo Gomes, de 34 anos e arquiteto de informação, é outro tipo de profissional que percebe a importância de se trabalhar para melhorar a acessibilidade. Em cada projeto, começa por ajudar a escrever as especificações do website ou da aplicação: que funcionalidades vai ter, como funcionarão de forma genérica, o que é possível a um utilizador fazer no site / app . Depois começa a desenhar protótipos, a papel e lápis para rabiscar à vontade, antes de fechar os esboços e passar aos protótipos de alta resolução chamados wireframes . Esses servem de guia para a equipa de design criar o layout gráfico, sabendo em que zona do ecrã devem estar certos elementos e quais as opções disponíveis. Por fim, valida o resultado das propostas gráficas, o resultado do HTML produzido (a linguagem de marcação de hipertexto, caso seja um website ) e a página já em funcionamento. Resume-se tudo a facilitar as experiências de acesso ao digital. . «O objetivo é estudar e desenhar interfaces simples, que sejam fáceis de usar por todo o tipo de utilizadores, dos mais experientes aos que têm necessidades especiais. Cada vez mais se desenha para as pessoas, apesar de até há bem pouco tempo não haver grande preocupação com a experiência do utilizador. Simplesmente criavam-se os interfaces , por engenheiros a pensar em como outros engenheiros usariam o sistema, e esquecia-se a componente humana.» Ivo é licenciado em ergonomia pela Faculdade de Motricidade Humana, especializado em ergonomia de sistemas de informação e lidera o departamento de qualidade e usabilidade do portal SAPO/Portugal Telecom, onde ajuda a desenvolver soluções centradas no utilizador em várias plataformas ( web , mobile , IPTV) para todas as empresas do grupo (PT, SAPO, MEO e TMN). Para ele, a mudança de perspetiva deve-se muito ao facto de as redes sociais terem evoluído. . «Estão bem construídas, dão uma excelente experiência de utilização», diz. As próprias pessoas estão mais atentas. «Com quase mil milhões de utilizadores, qualquer alteração na página é sempre seguida de uma chuva de queixas. As pessoas são naturalmente resistentes à mudança e manifestam-se quando isso acontece. Porém, a vitória do Facebook é disponibilizar interfaces fáceis de usar: passados poucos dias as queixas terminam e mesmo aquelas pessoas que não costumavam usar o computador - os nossos pais e até os nossos avós - continuam a fazê-lo com alguma naturalidade.» .Humanizar relações virtuais. Paulo Morais está no epicentro do novo mundo criado por blogues e redes sociais, que antes eram vistos como coisas de adolescentes. Gestor de marketing , de 30 anos, é agora marketing manager na empresa m4business. Gere o lugar das empresas nas redes e comunidades. É a voz delas, tenta passar as suas personalidades, precisa de saber o que os consumidores pensam delas. Nesse sentido, refere Paulo, o trabalho de um gestor de comunidades passa sobretudo por identificar oportunidades de negócio e melhorias, gerir crises, humanizar a marca, monitorizar o buzz em torno da marca por parte do mercado e da concorrência, privilegiar a interação e o relacionamento, manter presença em diversos canais de comunicação, articular a missão da empresa com os interesses da comunidade, analisar comportamentos de consumo, identificar tendências e muito mais. . «Ainda estamos a dar os primeiros passos mas, ao pressuporem que os utilizadores são potenciais clientes, as grandes marcas estão a investir bastante nesta especialização.» Paulo explica que um gestor de comunidades tem de saber atuar em diversos ambientes, sem se restringir ao digital. «Para muitas marcas não está em causa se devem estar nas redes sociais, a questão é como deve ser a sua presença. Continuam "obcecadas" com a quantidade de seguidores e likes em vez de se focarem na qualidade, na interação, no relacionamento e no retorno desse investimento.» E é aqui que o marketing , incluindo a gestão de comunidades, pode fazer a diferença. . «A gestão difere muito da marca que se está a orientar, do risco e do compromisso, além de que a internet não é um espaço físico: está ativo 24 horas por dia, sete dias por semana.» O que fazem então os community managers deste mundo? Falam dos clientes em blogues, fóruns, Facebook, Twitter e outros espaços web ; gerem as páginas de fãs do Facebook, os feeds do Twitter e todas as comunidades das marcas que administram ; animam esses espaços com conteúdos editoriais, ofertas, concursos, respostas de qualidade aos utilizadores, trocas; monitorizam a marca dentro e fora da comunidade; verificam a presença de palavras difamatórias contra a empresa nos espaços comunitários. É fundamental controlar o ambiente das marcas que se representa e acompanhar a evolução da rede. . Marco Teixeira, business developer , trabalha na área do comércio eletrónico na empresa SmartUp Portugal e também está atento a esta evolução. «Se achar que uma empresa com ou sem presença online tem potencial para melhorar os seus resultados através da internet, entro em contacto com ela de modo a transformar oportunidades em projetos», diz o especialista, de 28 anos. Outro canal importante são os sites e blogues próprios, que fazem chegar muitos pedidos de informação, de ajuda na resolução de problemas ou de parcerias. «Hoje a informação passa a uma velocidade diabólica entre dispositivos. Quando é séria, é muito bom.» Mas o oposto também acontece. «Várias empresas têm tido problemas devido a uma ou outra opinião menos favorável de clientes nas redes sociais, o que demonstra o poder da evolução da web nos últimos anos», diz. . Um estudo divulgado pela Marktest no final de 2012, intitulado Os Portugueses e as Redes Sociais , indica que passamos em média 88 minutos diários nos social media em horário pós-escolar/laboral. Sobretudo no Facebook: 91,3% dos inquiridos consulta-o todos os dias, contra os 3,9% do Hi5 (em tempos a rede social mais popular no país) e 2% do Twitter. As fotos são o tipo de conteúdo mais partilhado e 62% dos inquiridos seguem marcas nas redes sociais. Mais de três quartos visitam ainda estes espaços pelo menos uma vez por dia e quase metade (46,2%) consulta as redes sociais várias vezes. Perceber as pessoas e os seus hábitos naturais é meio caminho andado para chegar até elas e, neste ponto, Rui Lourenço garante que o seu background na área das Humanidades e como carteiro contribui para o êxito como news media specialist . . «O meu trabalho está relacionado com redes sociais, análise e monitorização em tempo real, defesa e proteção dos clientes, preparação nas plataformas para maximizar resultados e análise dos mesmos, estratégias de comunicação, conteúdos de qualidade e inteligência competitiva», explica Rui, que aos 37 anos percorreu um longo caminho de noites em claro frente ao computador: nos CTT desde 1998, criou projetos em redes sociais, como o de luta contra a pobreza e exclusão social, o Pai Natal Solidário ou a Bolsa de Emprego dos CTT. A partir de 2006 especializou-se em Second Life, Youtube e Facebook, por crer que as multiplataformas são a melhor solução. De 2009 a 2011 dirigiu a empresa MTVERSE, desenvolvendo estratégias integradas e planos de promoção em ambiente web . Ainda hoje rouba horas ao sono para alimentar o exército de pessoas que usam as redes diariamente. . «As antigas agências de marketing estão a falhar em toda a linha com as suas tentativas de apenas copiarem o que já se fazia noutros meios de comunicação. Existe muita coisa por fazer, tudo está ainda a gatinhar», sustenta o profissional, para quem parar é morrer. É essa a razão que o leva a trabalhar em diversos projetos em simultâneo no mundo virtual, sempre atento ao que o rodeia e com um pé em várias frentes: nas redes sociais, desenvolve as páginas dos Xutos & Pontapés, Tim, Rodrigo Leão, Baile Popular, Carminho, Luís Represas, João Gil e Rádio Comercial. Dirige a empresa Popular Jump, focada em serviços de inteligência e monitorização para a web social à medida dos clientes. Foi ainda o autor da ilha da Presidência da República no Second Life. Rui não se surpreende que sejam cada vez mais os utilizadores e as horas despendidas nas redes, cada vez mais as plataformas e os dispositivos de acesso. . «O mobile tem feito os comportamentos alterarem-se, as redes sociais passaram a fazer parte natural das nossas vidas», constata. Na altura em que começou na multimédia, em 2006, pouca gente acreditava que a comunicação daria esta volta, apesar de plataformas como o Second Life (um mundo virtual e tridimensional, em que os utilizadores podem socializar, simular realidades e viver uma espécie de segunda vida) tornarem evidente que as redes sociais seriam o futuro. «Estando sempre em mutação, não é algo que se aprende e já está», ressalva o news media specialist . «A este nível de profissionalização, além da especialização técnica, já tenho de ser criativo, instintivo e pensar social, de forma a conseguir dar sempre o máximo a quem confia nos meus serviços.» . Rui Lourenço sabe que um bom especialista pode ser a diferença entre o sucesso e o insucesso de uma empresa. E sendo assim, confia que podemos servir-nos das ferramentas multimédia para ajudar Portugal a sair da crise. «As redes sociais são um dos meios mais baratos de promover qualidade e os portugueses, quando bem dirigidos, são uma máquina brutal na promoção do nosso país e dos nossos produtos. Acredito haver aqui uma oportunidade de crescer em turismo e exportações. Mas terá de ser bem aproveitada e até hoje, infelizmente, tem sido um fiasco, ou porque não é bem utilizada, ou porque não se usa de todo.» É mais um passo a dar na aventura digital. .Carreiras a fazer furor.Analista funcional - Tem como função analisar o funcionamento de novas aplicações informáticas, de modo a poder oferecer ao público o máximo rendimento possível. .Pay per click analyst - O nome difícil para analista de anúncios em links patrocinados, que normalmente se encontra em agências de marketing digital. Trabalha sobretudo com links patrocinados do Google, Yahoo e outros motores de busca: escolhe as palavras-chave mais adequadas, compõe o texto dos anúncios, acompanha o seu desempenho e define estratégias. .Trafficker - Profissional encarregado de gerir, implementar e controlar o tráfego de uma página na web . .Analista de palavras-chave (search engine optimization) - Define estratégias eletrónicas para colocar uma determinada página entre as primeiras que surgem nas pesquisas feitas em motores de busca. .Especialista em ferramentas de inovação - Cria sites e aplicativos para identificar desejos e necessidades dos consumidores. Desenvolve novos produtos a partir dos resultados obtidos. .Apps developer - Especialista que planeia, programa, executa, distribui e faz a manutenção de aplicativos para telemóveis e tablets .