Quando em 1840 o tenente escocês Henry Yule desembarcou do comboio em Calcutá, na Índia, levava como termo da sua jornada desde as Ilhas Britânicas, uma região no nordeste do país asiático. Na Índia, Yule apontaria o seu caminho ao território do atual estado de Meghalaya com a missão de estabelecer ali um sistema eficaz de transporte de carvão desde as regiões montanhosas até às terras baixas a sul. Henry Yule não teve sucesso nesta sua empresa, embora não tenha oferecido ao desperdício os meses em que explorou a região. O homem que fizera uma tradução para inglês dos relatos do viajante veneziano do século XIII, Marco Polo, destacou-se como geógrafo, orientalista e diligente cultor do estudo de escritos Persas. A missão a Meghalaya ofereceu a oportunidade a Yule de descrever o quotidiano do povo Khasi e de se tornar o primeiro europeu a relatar uma prática centenária entre aquela população, a de construir pontes vivas, em contínuo crescimento, a partir de raízes aéreas..Nas suas Notes on the Khasia Hills, and people, extenso relato publicado no Journal of the Asiatic Society of Bengal, em 1844, Henry Yule traça palavras vívidas sobre as suas primeiras incursões nos territórios Khasi: "A ponte que atravessámos é digna de descrição, pois acredito que nenhum relato de qualquer coisa semelhante foi ainda publicado. No topo de uma enorme pedra, à beira do rio, cresce uma grande Figueira da Índia agarrada à rocha na sua multiplicidade de raízes. Duas ou três destas raízes, maleáveis, foram esticadas sobre o córrego e as suas extremidades presas na margem oposta e aí enterradas na terra. Raízes secundárias foram amarradas às primeiras (...) O comprimento da ponte supera os 80 pés (25 metros) e a sua altura, a cerca de 20 pés (seis metros) acima da água na estação seca"..O que Henry Yule detalha na sua escrita é um elemento da paisagem que se mantém, hoje, presente no quotidiano do povo Khasi, a paciente construção de pontes suspensas a partir das robustas raízes aéreas da falsa-seringueira ou árvore-da-borracha (Ficus elastica). Conduzidas à mão entre duas encostas íngremes, as jovens raízes primárias da figueira servem de suporte ao crescimento de novas raízes num processo lento de robustecimento de toda a estrutura. Uma ponte viva exige a paciência de quem a labora, por vezes até 15 anos antes de permitir a passagem em segurança a peões. Estruturas que para os Khasi assumem contornos de empreendimento geracional e comunitário. Uma ponte viva pode suportar o peso conjunto de 50 indivíduos, apresentar até dois vãos e resistir perto de 200 anos, assim se mantenha saudável a árvore que lhe serve de suporte..A modelagem de árvores com o propósito de servir atividades humanas não é uma realização exclusiva dos Khasi, com outros exemplos no estado indiano de Nagaland, e na Indonésia, nas ilhas de Sumatra e Java..Uma prática, a de construir a partir de matéria vegetal viva, que, na segunda metade do século XIX atraiu a atenção de dois pioneiros nos Estados Unidos, John Krubsack e Axel Erlandson. Krubsack banqueiro e empresário agrícola no estado do Wisconsin, nascido em 1858, revelava-se um homem engenhoso no que respeitava à construção de móveis. No virar do século XIX para o século XX, Krubsack tomou a decisão de construir o móvel mais robusto até à data trabalhado por mão humana. No caso vertente, uma peça em madeira que lhe viria a ocupar 11 anos de vida e que ganhou a posteridade com a designação "a cadeira que cresceu". E assim foi. A cadeira de Krubsack irrompeu do solo na cidade de Embarrass, fruto de um processo que se iniciou em 1903. Nesse ano, John selecionou e plantou perto de 30 sementes de sabugueiro. Dois anos volvidos, os rebentos mereceram transplante, dispostos num padrão geométrico, antevendo a estrutura da futura cadeira. Na primavera de 1908, as jovens árvores foram reorientadas, enxertadas em pontos críticos, de forma a proporcionar assento, braços e costas. Krubsack cuidava do solo, regava as plantas diariamente, podava-as e tratava potenciais maleitas. Seis anos decorridos, o "pai" da "cadeira que cresceu" a partir do solo, cortou-a nos quatro pontos que a ligavam à terra, cuidou da madeira e fez-se à estrada num périplo de exibições que correram os Estados Unidos, nomeadamente a Feira Mundial de 1915, em São Francisco..Na década de 1890, um jovem do estado da Califórnia, filho de imigrantes suecos chegados aos Estados Unidos no final do século XIX, perdia-se nos campos da sua terra natal fascinado pelos mistérios da natureza. Axel Erlandson recordaria mais tarde o espanto que lhe causara o enxerto espontâneo entre dois plátanos. Momento que definiria as décadas seguintes da sua vida, dedicadas a moldar árvores, primeiro como passatempo, mais tarde com a perspetiva de um negócio que nunca augurou rentabilizar. Axel laborava em segredo, recorrendo a bétulas, freixos, olmos, salgueiros, num afã que lhe exigia paciência para retirar de árvores que cresciam lentamente formas como laços, corações, escadas, anéis, gaiolas, molduras, cadeiras. Em 1947, Axel e a família inauguravam o seu Tree Circus, mostra que sintetizava o trabalho de décadas, um circo de árvores que, contudo, manteve-se longe das rotas turísticas. As aspirações de Axel minguaram e a sua mostra de árvores esculpidas por mão humana renderam ao seu criador parcas centenas de dólares. Nas décadas seguintes, as esculturas vivas de Axel Erlandson feneceram na terra árida, o terreno foi alvo de projetos imobiliários, o sonho passado de um parque de diversões em perpétuo crescimento morreu. Atualmente, o American Visionary Art Museum, em Baltimore, conta na sua exposição permanente com uma das últimas árvores moldadas por Erlandson, a "cabine telefónica"..Quanto à centenária cadeira viva de John Krubsack, após anos em exibição no interior de uma caixa de acrílico, numa fábrica de mobiliário, decora atualmente uma divisão da casa de um descendente do homem que quis plantar móveis..dnot@dn.pt