Elétricas já devem 338 milhões ao Estado em taxas da energia

EDP juntou-se à Galp e recusa pagar contribuição extraordinária. Mais de metade do valor devido pela taxa está por liquidar
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As empresas do setor elétrico não pagaram ao Estado, nos últimos quatro anos, 338 milhões de euros devidos a título de Contribuição Extraordinária do Setor Energético (CESE). É mais de metade do valor total - 665 milhões - que devia ter entrado nos cofres públicos desde 2014.

Desde a implementação desta taxa, durante o governo liderado por Pedro Passos Coelho, que a Galp se tem recusado a pagar, tendo avançado para os tribunais contra uma obrigação que considera ilícita. Uma posição a que se juntou agora a EDP, que em 2017 também já não pagou a contribuição. A REN também avançou para os tribunais contra a CESE, mas não deixou de liquidar a taxa. A Galp, a EDP e a REN são os grandes contribuintes da CESE.

O valor de 338 milhões em falta é avançado pelo Ministério das Finanças, em resposta ao grupo parlamentar do PCP, que questionou Mário Centeno sobre este assunto. A maior fatia deste montante corresponde ao ano de 2017, que regista 156 milhões de euros pendentes para pagamento (um número que duplica o valor em falta no ano anterior) contra os 35 milhões que foram pagos pelas grandes empresas de energia no mesmo período.

O valor em dívida da Galp é de cerca de 250 milhões de euros. O que, face ao montante global avançado pelo ministério, significa que outra empresa deixou de pagar a contribuição. O DN questionou a REN e a EDP, tendo esta última respondido, através de fonte oficial, que "decidiu passar a exercer o seu direito de proceder à prestação das garantias necessárias e aplicáveis pela Lei" - ou seja, deixou de liquidar a taxa, sendo que a impugnação judicial obriga à provisão de garantias no mesmo valor. A empresa já tinha anunciado, no início de 2016, que ia avançar para os tribunais, contestando que a CESE, inicialmente apresentada como sendo de caráter temporário, esteja a ser renovada todos os anos no Orçamento do Estado.

A CESE foi implementa em 2014, apresentada como uma medida para ajudar à consolidação das contas públicas e estender às grandes empresas os sacrifícios que, em plena crise, estavam a ser pedidos aos portugueses. Desde então tem sido renovada anualmente. Outro foco de polémica prende-se com o destino do dinheiro arrecadado com a contribuição, que devia reverter, em um terço, para um fundo de sustentabilidade do setor energético destinado a baixar o défice tarifário, o que permitiria aliviar a pressão sobre os preços da eletricidade cobrada aos consumidores. A verdade é que boa parte dessa transferência não tem sido feita. Há pouco mais de um mês, no final da discussão do Orçamento do Estado, um "sucedâneo" da CESE levou a uma crise entre PS e Bloco de Esquerda - os bloquistas queriam implementar uma contribuição extraordinária também sobre o setor das energias renováveis, uma medida que começou por ser aprovada pela bancada parlamentar socialista que, dois dias depois, inverteu a decisão e votou contra.

PCP. "E se fosse uma pequena empresa?"

Na resposta enviada ao PCP o ministério das Finanças afirma que a Autoridade Tributária (AT), através da Unidade de grandes Contribuintes, "acompanha os processos que se encontram em fase contenciosa, tendo indeferido as reclamações graciosas, cuja competência decisória é sua". E garante que a AT "continuará a desenvolver todas as medidas que conduzam ao mais célere ressarcimento dos valores devidos".

Uma resposta que não satisfaz o PCP, que pela voz do deputado Bruno Dias argumenta que a resposta das Finanças vem confirmar a "preocupação do PCP de que havia contribuições que não estavam a ser pagas pelos grandes grupos económicos". Com uma resposta diferente da que é usada para a generalidade dos contribuintes, sustenta. "Se um pequeno empresário ficar em falta com o Pagamento Especial por Conta - com o qual estamos a tentar acabar - ou recorrer aos tribunais para contestar, todos sabemos o que acontece", aponta o parlamentar comunista, evocando a atuação "implacável" da Autoridade Tributária com as pequenas empresas.

"Há uma prática de abuso e de afirmação de poder destes grupos económicos", critica o parlamentar, questionando como seria se os clientes destas empresas "não pagassem por discordância".

Banca e farmacêuticas pagam contribuição

De acordo com a resposta do Ministério das Finanças enviada à Assembleia da República outros setores abrangidos por contribuições extraordinárias têm vindo a saldar esta obrigação fiscal. No que respeita à contribuição que incide sobre o setor bancário "não existe reporte de falta de pagamentos" das entidades visadas, refere o documento. Mas a banca também discorda desta imposição legal. Após a liquidação da taxa as instituições abrangidas têm interposto "reclamações graciosas e impugnações judiciais com o fundamento da inconstitucionalidade" da contribuição, diz o ministério liderado por Mário Centeno. Já quanto à mesma medida aplicada à indústria farmacêutica, a resposta enviada ao grupo parlamentar do PCP adianta que "não existe reporte de falta de pagamentos", não fazendo neste caso menção a processos judiciais interpostos contra o Estado.

Com Bárbara Silva

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