Eleições no Brasil: Certezas nas incertezas
Seja qual for o Presidente eleito neste domingo, há dois vencedores desde já anunciados: o Centrão no plano interno e Vladimir Putin no externo.
O Centrão agrupa personalidades e partidos auto-declarados centristas que têm sido decisivos em todos os momentos de crise ou de tomada de posições cruciais. Lula no seu primeiro mandato e Bolsonaro tentaram prescindir dele e não conseguiram. Para garantir base parlamentar tiveram de se entender - e atribuir cargos - a figuras dessa faixa alargada. Uma das razões da queda de Dilma foi não saber gerir essa componente da sua base parlamentar.
Desta vez o Centrão tem forte presença nas duas candidaturas e, ao mesmo tempo, a composição do legislativo federal dá-lhe de novo grande valor estratégico. Não quer dizer que se articulem facilmente, pelo contrário, é frequente oporem-se por razões táticas ou afirmações pessoais de liderança mas, ainda assim, continuam incontornáveis.
Isto não se passa apenas a nível federal, ocorrendo também nas eleições para os governos estaduais. Ninguém, seja para Presidente, seja para Governadores, deixa de usar o adjetivo "centro". Uns ficam apenas com ele, outros são centro-direita ou centro-esquerda.
O Presidente russo em entrevista à "Folha de São Paulo" declarou ter relações igualmente boas com Bolsonaro e Lula. Não mentiu e, ganhe quem ganhar, Brasil e Rússia vão manter os BRICS vivos e provavelmente ampliar o grupo.
Apesar disso, a política internacional ficou quase fora dos debates, salvo breves referências de Lula acusando Bolsonaro de ter isolado o Brasil e ambos se acusando de apoiar ditaduras.
Não foi apenas em política externa que faltou debate e propostas. Faltou em quase tudo. Os dois candidatos procuraram defender os seus períodos no poder e explorar os pontos vulneráveis do adversário: a negligência bolsonarista perante a Covid 19 e os dois grandes escândalos de corrupção petista e aliados.
Campanha despolitizada, conforme diz a politóloga Maria Hermínia Tavares de Almeida. A elite política brasileira, de todos os discursos, mantêm o seu formato e composição estáveis desde há décadas. Não é desprovido de significado que, no debate da TV Globo na noite de sexta-feira, dos seis temas propostos para abordagem pelos candidatos o tema racismo tenha sido ignorado por ambos, embora atinja a maioria da população.
Outro desafio para o Brasil nos próximos quatro anos, sob qualquer Presidente, é que a situação mundial não é favorável como nos primeiros mandatos de Fernando Henrique ou Lula - indo mais para trás nem do mandato de Juscelino Kubitschek - e os ciclos de crescimento brasileiro dependem e têm grande parte da explicação no contexto mundial. Os potenciais do país permanecem em alto nível de desaproveitamento conduzindo a essa dependência, agravada pela política de criação de empregos com salários baixos, comum a todos os governos. Fica-se, na melhor das hipóteses, em sobrevivência mas o mercado interno é de capacidade inversamente proporcional ao volume demográfico e as desigualdades persistem.
Fator interessante é o surgimento de mulheres como novas figuras nacionais. Ao centro, a Senadora Simone Tebet e Raquel Lyra, até aqui favorita nas eleições estaduais de Pernambuco. À direita, Soraya Thornicke, neste caso se os caciques do seu partido não lhe criarem obstáculos. A esquerda tem de traçar caminhos que acompanhem este movimento, ou seja, mulheres em centros de decisão sem serem teleguiadas.
Em todo este quadro, Lula está à frente nas pesquisas de intenção de voto. Considerando as margens de erro, os dados avançados parecem revelar disputa dura. Se assim for, a decisão pode decorrer daqueles que acham ter motivo para se absterem ou votarem em branco.