E-toupeira. Sporting deixa cair acusação ao Benfica
O Sporting não recorreu da decisão da juíza de instrução criminal Ana Peres de não levar a julgamento no processo E-toupeira a Sociedade Anónima do Benfica para o futebol. O prazo para contestar o despacho de não pronúncia já terminou e só o Ministério Público e o ex-árbitro António Perdigão recorreram a alteração da decisão num caso em que foram investigados crimes de corrupção, favorecimento pessoal, peculato e falsidade informática.
Segundo o despacho da juíza Ana Peres a que o DN teve acesso o MP contesta o facto de a SAD benfiquista não ser chamada a tribunal, querendo que responda pelos 30 crimes de que era acusada: um de corrupção ativa, um de oferta ou recebimento indevido de vantagem e 28 de falsidade informática. Já o antigo árbitro e agora comentador do Porto Canal defende que o Benfica deve ser julgado por corrupção ativa.
Terminado o prazo desta fase do processo, na passada quarta-feira (dia 13), acaba por ser surpreendente o facto de o Sporting não ter contestado a decisão, principalmente depois de ter divulgado um comunicado a 21 de dezembro, quando foi conhecida a decisão da juíza, em que dizia: "A decisão anunciada, na medida em que partirá do princípio que os arguidos agora pronunciados atuavam por sua conta e risco, é, pelo menos aparentemente, incompreensível." Acrescentava ainda que a "Sporting SAD analisará os fundamentos da decisão, reservando o direito de recorrer do teor da mesma, sempre com o objetivo de repor a verdade desportiva".
Contactado pelo DN o clube respondeu com uma declaração do vice-presidente João Sampaio: "Em face do recurso interposto pelo MP, a SCP SAD não recorreu, já que as questões essenciais, que se encontram definidas de forma clara, serão discutidas no âmbito do recurso interposto pela acusação pública".
Segundo a acusação do MP, Paulo Gonçalves, enquanto assessor da administração da Benfica SAD, e no interesse da sociedade, solicitou aos funcionários judiciais Júlio Loureiro (que também não foi pronunciado) e José Silva (pronunciado) que lhe transmitissem informações sobre inquéritos, a troco de bilhetes, convites e merchandising do clube.
"A sociedade arguida [Benfica SAD] não diligenciou para que, no interesse da sociedade, utilizando os seus bens, os seus colaboradores e estrutura, não fossem praticados ilícitos por parte de colaboradores, neste caso, colaborador/subordinado, especial e imediatamente ligado à administração e ao seu presidente", pode ler-se no recurso do MP. Que acrescenta: "Paulo Gonçalves, ao atuar como atuou, fê-lo no âmbito (por causa) do objeto da sociedade - empresa de futebol, visando simultaneamente lucros e resultados desportivos."
Neste âmbito defende que a Benfica SAD incorre num crime previsto no artigo 11 do Código Penal - responsabilidade das pessoas singulares e colectivas - com especial ênfase na alínea b, quando cometidos "por quem aja sob a autoridade das pessoas referidas na alínea anterior em virtude de uma violação dos deveres de vigilância ou controlo que lhes incumbem.
Já António Perdigão considera que a SAD benfiquista deve ir a julgamento para responder por um crime de corrupção ativa em co-autoria com o ex-assessor jurídico Paulo Gonçalves. E justifica esta pretensão com o facto de a juíza ter mantido a pronúncia de Gonçalves por um crime de corrupção ativa que "não poderia também deixar de se concluir que a mesma implicaria, necessariamente, um idêntico juízo de imputação desse mesmo crime à arguida Sport Lisboa e Benfica - Futebol SAD, em nome e no interesse de quem o arguido Paulo Gonçalves sempre agiu".
Nos seus argumentos para pedir o julgamento da SAD, Perdigão frisa que Paulo Gonçalves era "o head management de um dos principais departamentos da sociedade arguida, prestando assessoria jurídica à Administração e reportando diretamente ao Presidente da Sport Lisboa e Benfica - Futebol SAD, Luís Filipe Vieira. Era qualificado como diretor de primeira linha e nessa qualidade superentendia a área jurídica relacionada com o futebol profissional e as relações institucionais da sociedade".
Daí defender que a SAD conhecia as suas decisões e movimentações: "Decidindo o Tribunal a quo pela existência de indícios suficientes quanto à prática, pelo arguido Paulo Gonçalves, de um crime de corrupção ativa, tal imputação terá de valer, necessariamente, também para a pessoa coletiva em nome e representação da qual sempre atuou."
Ou seja, defende que a Benfica SAD deve ser julgada pelo crime de corrupção ativa previsto no n.º 1 do artigo 374 do Código Penal: "Quem, por si ou por interposta pessoa, com o seu consentimento ou ratificação, der ou prometer a funcionário, ou a terceiro por indicação ou com conhecimento daquele, vantagem patrimonial ou não patrimonial com o fim indicado no n.º 1 do artigo 373.º".
Os quatro arguidos neste processo estavam acusados de:
José Silva - um crime de corrupção passiva, um de favorecimento pessoal, seis de violação do segredo de justiça e 21 de violação de segredo por funcionário, nove de acesso indevido, nove de violação do dever de sigilo, 28 de falsidade informática e um de peculato. A 21 de dezembro a juíza Ana Peres retirou-lhe uma acusação do crime de violação de segredo por funcionário e de favorecimento pessoal
Júlio Loureiro - Um crime de corrupção passiva, um de oferta ou recebimento indevido de vantagem, um de favorecimento pessoal, seis crimes de violação do segredo de justiça, 21 de violação de segredo por funcionário, nove de acesso indevido, nove de violação do dever de sigilio e 28 de falsidade informática. No despacho da juíza foi-lhe retirado o crime de corrupção passiva e o de oferta ou recebimento indevido de vantagem
Paulo Gonçalves - Um crime de corrupção activa, um de oferta ou recebimento indevido de vantagem, seis de violação do segredo de justiça, 21 de violação de segredo por funcionário, onze de acesso indevido, onze de violação do dever de sigilo, 28 de falsidade informática. No caso deste arguido foram retirados os crimes de falsidade informática e acesso ilegítimo e de oferta ou recebimento indevido de vantagem.
Benfica SAD - Um crime de corrupção ativa, um de oferta ou recebimento de vantagem e 28 de falsidade informática. Foi despronunciada em todos.