E aos 118 anos chegou à idade da internacionalização
Na Travessa do Forno há cheiro a bolacha e biscoitos quentes. E na memória as caixas de cinco quilos de folha de flandres em que eram acondicionados e que, entretanto, deixaram de ser utilizadas. Os madeirenses conhecem bem esta referência visual e olfactiva, que também os turistas já há muito descobriram.
A Fábrica Santo António é uma das mais antigas fábricas artesanais portuguesas nascida no Funchal há 118 anos (1893) e que se manteve desde sempre na mesma família, já lá vão quatro gerações, estando hoje nas mãos de Jorge Bettencourt Sardinha e conta com 17 colaboradores.
Este poderá ser um dos segredos do sucesso, mas há outros. Manter as receitas originais, algumas com base em receitas inglesas, e melhorá-las com "uma aposta forte na qualidade superior dos produtos e pela diferenciação", refere o jovem gerente, Bruno Vieira, 30 anos, com formação em controlo de qualidade alimentar.
Aqui, tudo é feito à moda antiga, só o embalamento ganhou alguma modernização. O aspecto do estabelecimento tem cara lavada, mas mantém a matriz, desde o balcão corrido de madeira às prateleiras em que se expõem as iguarias. Sendo o ramo de negócio o fabrico de bolos de mel, biscoitos e bolachas Maria, redonda e quadrada, que ainda se vende a retalho - tal como acontece com a marmelada -, a verdade é que a empresa soube inovar ao longo dos anos.
Hoje, há muito por onde escolher. Desde os bolos de mel caseiros aos gelados de fruta, que irão brevemente surgir embalados nas grandes superfícies em doses duplas.
Neste momento, a Fábrica, que sempre forneceu o mercado regional, já saltou fronteiras. No Continente, através da empresa Albano, Almeida, Lda., localizada na Amadora, distribui os produtos gourmet no Corte Inglés de Lisboa e de Vila Nova de Gaia. Na capital, é possível encontrar estes sabores na Loja Portuguesa, na Casa Manuel Tavares e no Hiper Sá do Campo Pequeno, seja através das broas de gengibre, das tradicionais bolachas Maria e digestivas de aveia, broas de amêndoa e de avelã com farinha sem glúten, iguarias a que se juntam as compotas de frutos da Madeira, maracujá, banana e frutos silvestres, entre outros. A completar a oferta, seguem ainda os rebuçados de funcho e de eucalipto a que se juntou nova oferta com novos sabores, como o maracujá e o gengibre.
Há três meses que a Fábrica Santo António consegue exportar para Londres e o objectivo é conseguir conquistar a atenção de outros mercados europeus.
"A comunicação social tem feito mais pelo comércio tradicional do que a maioria dos responsáveis políticos. Sentimos falta de reconhecimento e de uma palavra de incentivo. O ADN de uma cidade passa pelo pequeno comércio. É por isso que os estrangeiros nos procuram. Hipermercados há em toda a parte", defende Bruno Vieira, que aponta falhas à globalização dos mercados, sobretudo na Europa.
"Actualmente, a grande percentagem do que se vende em Portugal é oriunda de outros países. Os produtos entram mas ninguém controla a qualidade. Encontramos bolacha mais barata do que o preço da nossa farinha. Como é que podemos competir perante isto?", questiona. Daí o apelo à sensibilização de quem governa: "Os nossos produtos, aqueles que nos dão uma identidade própria enquanto portugueses, que diferenciam culturas, deveriam ter protecção. Infelizmente, não se dá o devido valor ao que é nosso e genuíno."
O objectivo agora é dar a volta à crise. "O poder de compra baixou muito e nós, pequeno comércio, somos os primeiros alvos", refere o responsável. Portanto, se não há consumo interno, a solução passa por produzir para mercados externos.