É a Portela, estúpido

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Pensa-se que o minimalismo é coisa de países nórdicos, da Suécia, da Noruega, da Dinamarca, a Finlândia não conta tal a tristeza que me invade de lá ter de voltar um dia, Deus me perdoe e os finlandeses, não é nada contra em especial, tudo em geral. Mas, dizia, pensa-se que vem do norte o minimalismo, mas não, o país mais minimalista do mundo é Portugal, o país que tem fobia a ser rico, que fenece perante qualquer coisa que o possa fazer crescer, que odeia dinheiro, que teme o sucesso.

Quando finalmente íamos ter um novo aeroporto, eis que se desenterra uma lei que diz que quem diz se pode ou não haver aeroporto são as câmaras - e sim, há alguns irrigores jurídicos na frase anterior, mas deixem-me gozar esta hora de folga de rigores e precisões jurídicas. E isto não faz qualquer sentido, nem para quem tem defendido sempre mais poderes para os municípios. Obras de interesse nacional, atividades de mobilidade que possam passar as fronteiras municipais, investimentos de grande impacto, manda quem pode obedece quem deve, a atribuição da competência claramente desproporcional. Como se sai desta alhada? Pois.

Custa a crer, até porque não creio, que se tenham esquecido da lei, como aquelas pessoas que são surpreendidas pelo Natal sempre ali para o final de dezembro, ó Tó parece que há uma lei que diz que não podemos fazer o aeroporto sem as câmaras da envolvência dizerem se sim ou se não. Para tudo, rebenta a bolha, posições iniciais. E isto é Portugal, um país que não quer ser rico, que não quer crescer, que não gosta do lítio nem pode discutir o petróleo ou o nuclear. Porque temos de sobra, e portanto deixa estar, não te dês ao trabalho, está-se bem, é fevereiro e não chove e o Ronaldo é nosso e isso é importante para a Marca Portugal. E tanto haveria a dizer sobre a Marca Portugal.

Como acho que ninguém se esqueceu da lei, o que me parece é que alguém que tinha a incumbência de negociar com as autarquias comunistas falhou, não soube dar o que haveria para dar, no Orçamento ou fora dele. Tão amigos que nós éramos, mas talvez seja bom perceber que não ensina lições de estratégia política ao Partido Comunista quem quer, antes de nascerem já Álvaro tinha ensinado como se faz.

E enquanto se fala de Montijo, Alcochete, Alcochete Jamé, Ota, dois mais um, em todo este tempo esquece-se que o grande aeroporto de Portugal é e continuará a ser o aeroporto da Portela. Que já existe, que cresce a cada hora, onde há voos noturnos e horários flexibilizados. O que importa é saber o impacto ambiental da Portela, muito mais do que o do Montijo, ou pelo menos antes do do Montijo, que é na Portela que aterram e levantam os aviões que estão hoje a entrar nos nossos ouvidos e pulmões, dia afora, noite adentro.

Enquanto se discute se o casal de nórdicos que aterra no Montijo chega a Lisboa de barco ou de comboio, esquecemos que temos uma linha de metro que leva os turistas do aeroporto ao Saldanha passando por Moscavide e Chelas, talvez numa homenagem a décadas de taxistas a enganar turistas. E, claro, a linha circular não é necessária. Porque o que é necessário é conversar, discutir, adiar, planear, tudo com calma. E se se fizer, que seja também com calma, como o aeroporto de Beja, que não polui nada nem chateia os pássaros. Somos minimalistas e nem percebemos que o minimalismo é um luxo dos ricos.

Advogado

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