Dos cartazes de esperança à notícia da morte. As 300 horas à procura de Julen
Terminado o resgate de Julen com a descoberta do corpo do menino esta madrugada, ainda há perguntas sem resposta. Não se sabe ao certo quanto tempo a criança de dois anos que caiu a um poço a 13 de janeiro, em Totalán, Málaga, terá aguentado com vida ou se terá morrido logo devido à queda. E, afinal, quem é, aos olhos da lei, o responsável deste acidente e que castigo lhe ditará a justiça? O que é certo é que, à medida que os dias foram passando, as probabilidades de encontrar o corpo com vida estavam cada vez mais reduzidas - sem água durante quase 300 horas, 13 dias - e as suspeitas viriam a ser confirmadas na madrugada deste sábado.
"Infelizmente, às 1:25 desta madrugada, as equipas de resgate acederam ao ponto do poço onde se procurava Julen e localizaram o corpo sem vida do pequeno. Foi ativada a comissão judicial. As minhas condolências e pêsames à família". Assim foi dada a notícia, através de um representante do governo da Andaluzia, Alfonso Rodríguez Gómez de Celis, que partilhou na sua conta de Twitter o fim das operações de resgate.
O delegado do Governo garante que está agora a decorrer uma investigação para conhecer as circunstâncias exatas do acidente, mas já há várias teorias em cima da mesa. Acredita-se que Julen terá caído em queda livre até ao 71 metros dos mais de 100 do poço e que o corpo terá ficado imediatamente soterrado de terra depois de a criança ter caído. Em declarações aos jornalistas, esta madrugada, Alfonso Celis disse não poder adiantar mais detalhes da investigação, "já que o levantamento do corpo está nas mãos da Guarda Civil e do Tribunal de Instrução número 9 de Málaga".
No decorrer das operações, esta semana, o delegado admitiu que esta era "uma situação extrema, sem precedentes".
Mas ainda que a notícia da queda da criança tivesse abalado grande parte dos residentes em Málaga, que se iam juntando no terreno para oferecer mensagens de esperança através de cartazes, para os pais de Julen, refugiados numa vivenda de Totalán, esta não foi uma primeira vez. "Outra vez não!", gritaram assim que tiveram a confirmação de que o menino tinha sido encontrado e sem vida. O casal, José Roselló e Victoria García, vizinhos conhecidos no bairro de El Palo, no sopé das montanhas de Totalán, perderam o seu outro filho, Óliver, com três anos de idade, em 2017. A criança terá morrido repentinamente enquanto caminhava ao longo da praia com os pais.
Três anos depois, a família volta a passar por uma tragédia. O corpo de Julen foi localizado por uma equipa de emergência médica espanhola, que imediatamente acionou os procedimentos legais para o levantamento do corpo, de acordo com o jornal El Pais. Foi disponibilizada uma equipa para prestar apoio psicológico à família.
Às 13:57 do dia 13 de janeiro, em Espanha, o 112 recebe uma chamada de emergência sobre um menino que caiu a um poço, em Totalán. É Julen, que os pais diziam ter ainda ouvido falar depois da queda. Pouco tempo depois, chegam ao local os bombeiros, a polícia nacional e local, a Proteção Civil, entre outras entidades de resgate e emergência.
Durante 24 horas por dia, mais de 300 técnicos - grande parte destes profissionais da brigada de elite era originária das Astúrias, no norte de Espanha - participaram nas operações para conseguir chegar ao pequeno Julen. As primeiras previsões das autoridades não faziam adivinhar que até ao final os esperariam 13 longos dias, naquilo que o representante do Governo de Andaluzia caracterizou de uma missão "urgente", mas concretizada "com delicadeza".
"Foi uma corrida de obstáculos", disse Alfonso Rodríguez Gómez de Celis.
Ao longo das operações, a brigada de resgate mineira foi encontrando saliências rochosas no túnel horizontal que tiveram que escavar manualmente uma cavidade horizontal segura para chegar a Julen. As escavações tiveram que ser interrompidas, ainda esta semana, durante duas horas, para que os agentes do grupo especial de explosivos da Guarda Civil (TEDAX) pudessem provocar uma mini-explosão controlada - a quarta desde o início e já a poucos centímetros do corpo.
"A montanha manda", desabafava o porta-voz da Guarda Civil espanhola, Jorge Martin.
Os trabalhos foram entretanto retomados, com os mineiros a tentar escavar os últimos centímetros. Depois dos esforços, a madrugada deste sábado acordaria com a conclusão das operações.
Na conferência de imprensa a seguir ao levantamento do corpo, Alfonso Celis disse partir "com a certeza de que fizemos tudo humanamente e tecnicamente possível". "Que seja um exemplo de determinação e solidariedade para outras emergências que possam surgir", rematou.
A 21 de janeiro, oito dias após o desaparecimento de Julen, Totalán tornava-se um exemplo de solidariedade.
Junto às tendas das equipas de resgate, vários cidadãos espanhóis uniam-se para uma vigília, agarrando cartazes com mensagens de esperança. "Deus está contigo, Julen", podia ler-se. Também neste dia, a Associação de Mulheres de Totalán decidiu unir esforços para cozinhar panelas de comida para todos os trabalhadores envolvidos nas operações.
Mais foi Yolanda Alcaide, 44 anos, irmã de um dos coordenadores técnicos em terreno, quem se tornou um símbolo de solidariedade durante estas semanas.
Assim que tomou consciência da magnitude das operações, a residente de Totalán ofereceu a sua vivenda como posto de comando da operação de resgate. De acordo com o El País, a sua casa, as equipas puderam coordenaram os dois porões, realizar reuniões, mas também descansar. Também ali o presidente da Junta de Andaluzia, Juanma Moreno, se reuniu com os responsáveis da operação de resgate para, juntos, tomarem decisões.
Findada a missão, esta madrugada, o delegado do Governo, Alfonso Celis, deixou ainda um apelo a "qualquer pessoa que construiu um poço ilegal na Andaluzia e Espanha", para que os selem e assim garantam que "isto não acontece novamente".
Este sábado, a cidade deu início a três dias de luto, com um minuto de silêncio em memória do pequeno Julen.