Para o melhor e para o pior, os três grandes festivais de cinema - Berlim, Cannes, Veneza - influenciam os parâmetros de programação de quase todos os certames do género. Não admira, por isso, que encontremos na secção competitiva do LEFFEST dois dos títulos mais admiráveis este ano revelados em Cannes: Frost, do lituano Sharunas Bartas, e Tesnota/Closeness, do russo Kantemir Balagov.
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Sharunas Bartas encena uma "fuga sem fim" no coração da Europa, seguindo a odisseia de um casal de jovens lituanos que leva uma carrinha de ajuda humanitária para a Ucrânia. À medida que avançam, não são apenas os sinais de guerra que se multiplicam de modo inquietante; dir-se-ia que todos os mapas se tornam falíveis, com as fronteiras dos países a darem origem a uma infinita no man"s land - Frost filma a angústia europeia num espaço/tempo em que se torna cada vez mais problemático definir e pensar o conceito de "Europa".
Algo de simbolicamente semelhante se poderá dizer a propósito de Tesnota, drama de uma pequena comunidade judaica do Norte do Cáucaso, em 1998, centrado na personagem de Ilana, 24 anos, cujo irmão é raptado em vésperas de se casar, sendo a família confrontada com a exigência de um volumoso resgate. Para além do vibrante realismo à flor da pele, registe-se o nome de Darya Zhovner, intérprete de Ilana, prodigiosa atriz.
Quem quiser percorrer as muitas memórias que o festival propõe, vale a pena ter em conta, por exemplo, A Cidade dos Anjos, de Robert Aldrich (não confundir com o título homónimo de Brad Silbering, versão americana de As Asas do Desejo, de Wim Wenders). Trata-se de uma produção de 1975 (título original: Hustle), realizada por Robert Aldrich, reinventando com insólita contenção as regras do policial clássico através do mais inesperado dos pares: Burt Reynolds e Catherine Deneuve (uma das raras incursões da atriz francesa na produção de língua inglesa). A não esquecer também esse delicado objeto de cinema que é As Irmãs Brontë (1979), de André Téchiné, retrato íntimo de um universo literário e passional, com Isabelle Huppert, Isabelle Adjani e Marie-France Pisier - exibido na segunda metade da década de 80 na RTP, nunca foi lançado nas salas portuguesas.