Do túnel a Luisão na Luz à loja de conveniência em Maputo

Carreira do antigo lateral do Sporting ficou marcada por lance num dérbi. Radicado em Moçambique, a falta de profissionalismo do futebol obrigou-o a mudar de vida
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Falar de Paíto é recordar um famoso túnel - ou cueca, como se diz na gíria - a Luisão num dérbi entre Benfica e Sporting, a 26 de janeiro de 2005, no Estádio da Luz, para os oitavos-de-final da Taça de Portugal. O lance, que começou com uma cavalgada pelo corredor esquerdo e terminou com um potente remate para o fundo das redes de Quim, de pouco valeu aos leões, que acabaram eliminados no desempate por grandes penalidades depois de um 3-3 no final do prolongamento, mas ainda hoje é recordado quando se fala do lateral moçambicano dos leões.

"Marcou a minha carreira, sem dúvida. Acaba por ser o meu cartão-de-visita. Quando se fala em Paíto, associa-se a Luisão. E sempre que as pessoas em Moçambique falam de Luisão, falam de mim. Todos me recordam desse golo ao Benfica, mas gostava de ser recordado por ter conquistado dois ou três campeonatos no Sporting, não por um lance", revelou o antigo defesa, 35 anos, ao DN.

Agora, já com as botas penduradas e de volta a Maputo, a magia de Martinho Martins Mucana, seu nome verdadeiro, é utilizada a gerir uma loja de conveniência, embora com o regresso ao mundo do futebol em ponto de mira. "Decidi regressar ao meu país porque senti que estava a chamar por mim. Ainda fiz uma época no clube que me viu crescer, o Maxaquene, e estou a preparar-me para regressar ao futebol, porque não sei fazer outra coisa. Quero ensinar o que aprendi a fazer. Gostava de ser treinador, mas sei que esse processo leva tempo", contou o ex-internacional pelos mambas (38 jogos).

Para esse processo culminar numa carreira como técnico já não falta tudo. "Tenho o segundo nível, mas estou a preparar-me para num futuro próximo viajar para Portugal e dar continuidade ao curso. Quero trabalhar com crianças e tenho um projeto de abrir uma escolinha. Acho que o meu país precisa da experiência que fui adquirindo, e estas crianças precisam de ser acompanhadas", atirou o antigo futebolista leonino, consciente de que "em África o desporto não rende muito". "Não se consegue viver do futebol, ou então consegue-se, mas por pouco tempo. Tem de se ter um negócio à parte. Os diretores das equipas de futebol não ganham dinheiro suficiente para viver do futebol. O desporto é um part-time para eles e isso prejudica o funcionamento do nosso futebol. O jogador tem preocupações, mas chega aos gabinetes e não encontra ninguém, o que não o deixa concentrar-se apenas em jogar futebol", acrescentou.

Por o futebol moçambicano estar assim, Paíto viu-se obrigado a abrir uma loja de conveniência e prepara-se para "abraçar o ramo da restauração". "Ser jogador de futebol é a melhor profissão do mundo. Fazes o que gostas e ainda te pagam. Até para os treinos ia a sorrir, menos nas pré-épocas, que eram mais complicadas. Agora, não posso dizer que estou apaixonado pelo que estou a fazer, mas foi a forma que encontrei para dar continuidade à minha vida", confessou, longe dos filhos e da mulher, que vivem em Portugal.

Hilário levou-o para o Sporting

Para trás, ficou uma carreira em que foi "difícil fazer amizades", porque as mudanças de clube foram "constantes". Ainda assim, destaca a "grande amizade" com o central angolano Kali, com quem jogou nos suíços do Sion. "Também falo muito com Miguel Garcia, Nani e Edinho", aditou.

O trajeto de Paíto no futebol começou no Maxaquene, "o antigo Sporting de Maputo, um clube com ligação ao Sporting", que o projetou para os leões de Portugal. "O Sporting enviou o Hilário para nos vir treinar. Eu era júnior, mas ele chamou-me aos seniores. Depois, ele foi demitido, voltou para o Sporting e indicou o meu nome. Entretanto, o Sporting B foi fazer um torneio a Moçambique, com jogadores como Carlos Martins e Quaresma, e como eu joguei bem contra eles, disseram logo que estava preparado. Contudo, o processo burocrático ainda durou alguns meses", recordou o antigo lateral, que começou pelos juniores dos verde e brancos e passou duas temporadas na equipa B antes de integrar a tempo inteiro o plantel principal do emblema de Alvalade, entre 2003 e 2005.

Deu nega a Pinto da Costa

Sem espaço no Sporting, grande parte do tempo na sombra de Rui Jorge, Paíto foi cedido ao V. Guimarães, clube que o marcou. "Quem passa por aquele clube não o esquece. Não conhecia aquela realidade, tem gente muito apaixonada. Foram seis meses fantásticos. Descemos de divisão, mas não me recordo de um plantel do V. Guimarães tão bom como o que tínhamos. Nunca pensei que pudéssemos descer, porque os jogadores eram fantásticos e davam garantias", considerou, em alusão à temporada 2005-06.

Depois da aventura no Minho, o defesa terminou contrato com o Sporting e recebeu uma proposta do FC Porto e outra dos espanhóis do Maiorca. Aceitou a segunda. "O Maiorca oferecia-me o dobro, e olhei para o dinheiro em vez do projeto. Pinto da Costa queria-me muito. Mais à frente, apercebi-me de que cometi um erro", lamentou, até porque não chegou a estrear-se pelos maiorquinos, que o emprestaram ao Sp. Braga. Seguiram-se aventuras nos suíços do Sion e do Neuchâtel Xamax, nos romenos do Vaslui e nos gregos do Xanthi, antes de encerrar a carreira no país natal, há dois anos.

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