do ducado de moscovo a grande potência

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São mais de cem nacionalidades e dezenas de etnias que constituem a Federação Russa num mosaico étnico-nacional que prolonga o caleidoscópio de repúblicas e povos da ex-União Soviética. E também muitos dos seus problemas e tensões. Etnia dominante, os eslavos constituem 85% da população russa, divididos entre russos e seus vizinhos bielorrussos e ucranianos. Estes são os eslavos orientais; outros grupos eslavos - os ditos ocidentais e do sul - são, por exemplo, os polacos os checos, os búlgaros, os sérvios, os croatas e eslovenos. Uma realidade que explica o interesse de Moscovo nos Balcãs e na Europa Central.

As restantes etnias da geografia russa vão dos cossacos aos tártaros, dos povos da Tuva aos evens e aos tungus, dos povos do Cáucaso aos mordovos, dos Qoriaques, de origem mongol, aos vepsios - todos integram aquele que é o maior país do mundo em área, com os seus 17 075 200 quilómetros quadrados.

A multiplicidade de etnias testemunha uma longa história, o avanço e reformulação de fronteiras ao longo de séculos, dos tempos do ducado da Muscóvia (no século XIII) à potência europeia que Pedro I, o Grande, forja no século XVIII com reformas militares, económicas e na organização política do Estado. É nesta época que se manifesta uma tensão ainda presente: a clivagem nem sempre coincidente entre modernistas e tradicionalistas, entre eslavistas e europeístas naquela que se tornou lugar comum designar como a batalha pela "alma russa". Assim se os argumentos da ONG Memorial estão próximos de posições europeístas, as reflexões de Alexandre Soljenitsyne estão firmemente ancoradas no plano tradicionalista e eslavista. Um discurso recuperado com a chegada ao poder de Vladimir Putin, e que este fez questão de demonstrar publicamente por palavras e actos no funeral do escritor em Agosto de 2008.

Um Putin que, como o seu sucessor no Kremlin, Dmitri Med- vedev, enfrentam um desafio não muito distante daquele com que se confrontou Pedro I. Têm de gerir a herança soviética, como Pedro I teve gerir a herança medieval, com a modernização da sociedade; ao mesmo tempo, não podem, ou te- mem, alienar referências históricas e culturais que fundamentam a identidade do país e a originalidade da "alma russa", aspectos indissociáveis da Igreja Ortodoxa, que se assume como sua guardiã.

A Rússia de Putin e Medvedev alcançou certa estabilidade política, económica e social, impostas por uma governação de cariz autocrático, como tem sido norma na história do país, das reformas de Pedro Stolypin e de Miguel Speransky, impostas a partir de cima e na perspectiva de um Estado autocrático, ainda que liberal numa perspectiva russa, como foi o caso dos projectos de Speransky. Hoje, como no passado, a importância da geopolítica, o controlo ou influência do perímetro de Estados vizinhos e o culto de uma certa aura militar continuam a informar o projecto de um Estado e de uma Nação que, ancorados na inevitabilidade geográfica e na memória da história (distante e recente), hesitam entre o projecto europeu e o eslavo.

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