Do Dakar ao negócio dos barcos como empresário náutico

Carlos Sousa não compete desde janeiro de 2016 e admite não mais o fazer apesar dos convites para regressar. Vive entre Portugal e a Colômbia e trocou os carros pelos barcos
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Carlos Sousa fez história no desporto automóvel, sobretudo em provas de todo-o-terreno a nível nacional e internacional. Mas de repente, e sem aviso prévio, saiu do radar. "Logo a seguir ao Dakar 2016 rebentou o escândalo Petrobras que levou ao fim da equipa em que competia, a Mitsubishi Petrobrás (Brasil). Sem o patrocínio da petrolífera não era possível manter o projeto para 2017 e também já não havia tempo ou paciência para outros projetos", explicou ao DN o piloto, que assim disse adeus a 30 anos de carreira e duas décadas de Dakar (1996-2016).

O adeus ainda está fresco e "até há bem pouco tempo" ainda não sabia se ia ser definitivo: "Tive uma sondagem que me fez pensar em voltar a pegar no volante, mas estou a ver os timings a apertar e não me parece que vá acontecer. Neste ano não corri e por isso é muito difícil aceitar um convite, teria de treinar, coisa que não tenho feito... ninguém vai para o Dakar acabado de receber a chave do carro."

Talvez por o regresso ainda ser uma possibilidade, mesmo que remota, ainda hesita em titular-se como ex-piloto. "Não sei se já sou ex-piloto, mas estou desligado da alta-competição, sim. Também não deixa de ser verdade que tive alguns convites para participar em provas, mas nesta fase já não é qualquer convite que me faz sair da minha zona de conforto", confessou o agora empresário náutico, sediado em Vilamoura.

Foi um grave acidente, no Dakar 2000, que o fez pensar num plano B para o automobilismo. "Foi complicado, parti a coluna e tive de ser operado, tive de colocar parafusos e cheguei a pensar que era o fim. Não foi. Recuperei mais depressa do que o previsto e vivi os melhores anos profissionais depois disso, mas esse foi o momento em que soube que a competição não iria durar para sempre e tinha de ter um plano B", contou ao DN Carlos Sousa, que entrou no negócio dos barcos em 2001 e, aos poucos, se tornou empresário náutico.

Durante 15 anos conciliou o desporto automóvel com o negócio de venda e aluguer de barcos e trabalhou entre Portugal, Angola, Panamá e Colômbia - país onde, desde 2012, vive a maior parte do ano, por culpa dos negócios e do amor a uma colombiana. "Estou a tentar reinventar formas de ganhar a vida depois de um período difícil por que Portugal passou e que se sentiu no negócio dos barcos, mas a economia recuperou e há boas indicações para o futuro", admitiu, recordando que um atleta de alta--competição, "tirando se for do futebol e de uma ou outra modalidade, nunca pode dizer que acaba a carreira e não precisa de fazer mais nada na vida". E a transição nem sempre é fácil: "Passamos de atletas, campeões e figuras públicas para pessoas normais, que têm de trabalhar pois não temos reforma."

Agora, conduzir só no dia-a-dia. "Sou um condutor moderado, não sou muito nervoso e procuro ter uma condução defensiva. Tenho as minhas multas de excesso de velocidade, não vou dizer que não, mas não me lembro de ter tido um acidente na estrada. Tenho um problema com os limites de velocidade na autoestrada (120 km/hora), acho que não faz sentido, a 120 eu adormeço", brincou Sousa, que continua a achar que conduzir nas estradas "é mais perigoso" do que em competição.

Nos carros pela mão do tio

Sobrinho do piloto Vítor Sousa, Carlos acompanhava o tio às provas, até que, "um belo dia", uma desistência do familiar o lançou no mundo do desporto automóvel. "Venci a classe II com o Peugeot do meu tio e tomei-lhe o gosto", contou, e a partir daí viu a carreira ganhar rumo internacional quando, em 1993, foi contratado como piloto de testes da Nissan.

Um ano depois mudou-se para a Mitsubishi, marca em que foi campeão nacional de todo-o-terreno da categoria T1 (1995) e fez a estreia na mais importante prova de todo-o-terreno no mundo, o Paris-Dakar, com um "honroso" 12.º lugar. Seria a primeira de muitas participações marcantes em duas décadas de Dakar (1996-2016) entre África, onde "era mais duro e mais perigoso" e a América Latina, que agora recebe "um evento mediático, com boa energia e público a assistir".

Entre vitórias em etapas, liderança do rali, acidentes, atentados terroristas e cheias, a melhor e a pior memória são da edição de 2000: "Por ter vencido a minha primeira especial e conseguir mostrar que era um piloto rápido para estar nas melhores equipas do mundo. Andei anos e anos a sonhar com o Dakar e a olhar para os grandes pilotos e naquele momento estava ao lado deles e a poder entrar no clube dos melhores. Mas também pelo acidente. Foi muito mau. Subíamos uma duna a cerca de 170 quilómetros por hora, quando apareceu um declive com 15 metros de altura... capotámos e tivemos de ser retirados [o navegador, João Luz, ficou paraplégico]. Uma tremenda má memória."

Nessa altura chegaram a dizer--lhe para parar, mas uma segunda opinião fez Carlos Sousa voltar a sorrir. E em vez de demorar um ano a recuperar como previam os médicos, demorou apenas quatro meses e meio até se sentar de novo ao volante e conseguir os melhores resultados desportivos da carreira. Dois anos depois, em 2003, ficou à beira do pódio no Dakar (4.º) e foi campeão mundial de todo-o-terreno "à boleia dos melhores contratos com as melhores equipas e estruturas que havia".

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