Diogo Santos: "Quase 60% das empresas portuguesas não tinha políticas de teletrabalho"
Quando a pandemia, em meados de março, provocou a migração maciça dos funcionários dos escritórios para os apartamentos, cerca de três quintos das empresas portuguesas não tinham políticas de teletrabalho implementadas ou sequer definidas. Os dados, revelados por Diogo Santos, associate partner da Deloitte, mostram que o setor empresarial e industrial não estava preparado para o confinamento. "E, ainda assim, a capacidade de adaptação foi extraordinária", afirma o especialista que esta terça-feira foi o convidado da entrevista PMS para debater "Os Novos Caminhos nos Serviços de Mobilidade".
O teletrabalho e o distanciamento social, entretanto, passaram a ser o "novo normal", mas provocaram impactos "gigantes" na mobilidade com mudanças não apenas nos fluxos de trânsito, agora diluídos ao longo do dia, mas sobretudo na forma como são feitas as deslocações urbanas. Antes, decisão estava centrada na relação entre custo, conveniência e impacto ambiental: "Hoje, o que as estatísticas mostram é a introdução de uma nova variável - a perceção de risco e de segurança sanitária."
Essa é a mudança que, segundo o responsável pela área de mobilidade na Deloitte, levou as pessoas a mostrarem-se disponíveis a pagar mais ou a abdicar de alguma comodidade para minimizar os riscos de saúde. Esta é a lógica agora dominante e os transportes públicos foram os primeiros a sofrer com a mudança. E não é apenas porque a sua capacidade disponível ficou reduzida, mas também pelo investimento que se viram obrigados a fazer em limpeza, material e medidas de segurança.
"Tudo isso são custos acrescidos em cima de um sistema que já estava sob pressão", explica Diogo Santos, relembrando que o modelo económico, assente na grande escala, sofre de forma "imediata" com "toda e qualquer" redução da procura.
Se hoje o metro, o comboio ou os autocarros servem principalmente a população que não tem alternativa, o certo é que este cenário, a médio e longo prazo, não é sustentável, adverte o especialista: "É financeiramente inviável e nem sequer há espaço físico, dimensão ou cidade que consiga sobreviver com o transporte público a servir unicamente os desfavorecidos e os restantes a usarem o transporte individual", defende o partner da Deloitte. Daí a urgência de encontrar entre operadores, Estado e utentes um equilíbrio no financiamento para assegurar a sustentabilidade no sistema.
O transporte público não é o único setor da mobilidade "profundamente" afetado pela crise pandémica. As soluções partilhadas também tiveram um "forte recuo". Carsharing ou carpooling não estão entre as escolhas mais populares: "Ao olharmos para os dados da procura na Europa, mais de 50% da população perspetiva que, nos próximos três meses, evitará este tipo de serviço."
Assumindo que a Covid-19 irá continuar a condicionar a mobilidade, Diogo Santos só vê uma solução: "Individualmente não terão escala para sobreviver, mas através de um processo de consolidação poderão fazer face a esta queda na procura." Ainda assim, a capacidade de adaptação será mais fácil e mais rápida do que nos transportes públicos: "Se há setor que inovou e apresentou novas soluções de negócio foi este." O seu modelo, contudo, terá de ser revisto e adaptado às exigências da pandemia: "A perceção de segurança na mobilidade é, neste momento, uma área chave da inovação e determinante para captar passageiros que os transportes públicos perderam."
Do mesmo modo, os serviços de micromobilidade terão de usar também o trunfo da inovação. A vantagem é que as trotinetes e, as bicicletas em particular, já têm a sua sobrevivência "assegurada". O desafio - conclui Diogo Santos - é encontrar "formas criativas" para superar os obstáculos criados pela Covid-19 para continuar a crescer: "É uma questão de manterem o drive de inovação para conquistar a confiança dos utilizadores e aumentar a sua procura."
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