Dinheiro sujo da Odebrecht supera PIB da Guiné-Bissau

Construtora movimentou 3,39 mil milhões de dólares em pagamentos ilícitos entre 2006 e 2014, diz ex-executivo da empresa.
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A Odebrecht, empresa de construção envolvida no milionário escândalo do Petrolão, movimentou 3,39 mil milhões de dólares (cerca de 3,2 mil milhões de euros) em pagamentos ilegais ao longo de oito anos, de 2006 a 2014. A revelação foi feita por Hilberto Mascarenhas Filho, ex-executivo da companhia, em depoimento à Justiça na noite de segunda-feira. O valor é superior ao do PIB de 2015 de 33 países, entre os quais os lusófonos Cabo Verde, Guiné-Bissau, São Tomé e Príncipe e Timor-Leste, segundo a lista elaborada pelo FMI.

Mascarenhas Filho falava com o juiz do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Herman Benjamin, que investiga suposto crime de abuso de poder económico e político na campanha da dupla reeleita nas presidenciais de 2014, Dilma Rousseff-Michel Temer. Do total desse dinheiro ilegal, 20% foram destinados ao financiamento de campanhas via caixa dois, a gíria brasileira para saco azul. O maior beneficiário individual desses montantes foi João Santana, publicitário oficial do Partido dos Trabalhadores, de Dilma, que só em 2014 recebeu 16 milhões de dólares (mais de 15 milhões de euros) por baixo da mesa.

Mas o Departamento de Operações Estruturadas, nome da área da Odebrecht encarregada das atividades ilegais, era responsável, além do financiamento de campanhas, por pagamentos diversos, como subornos para obtenção de obras ou até resgates de funcionários da empreiteira atingidos por conflitos armados ou grande violência urbana, contou ainda o delator.

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Mascarenhas detalhou também que com o avanço da Operação Lava-Jato, que investiga o escândalo de corrupção conhecido como Petrolão, a Odebrecht foi obrigada a transferir aquele departamento para a República Dominicana e a transacionar as verbas sempre em espécie para evitar rastreamentos bancários. Segundo o ex-executivo, um dos 78 delatores da empresa a colaborar com a justiça a troco de diminuição da sua pena de prisão, era Marcelo Odebrecht, o então presidente da construtora que leva o seu nome, quem negociava com os políticos de primeiro escalão de Brasília, incluindo o atual presidente Michel Temer, do Partido do Movimento da Democracia Brasileira, os montantes a serem transferidos ilegalmente para os partidos. Com Lula da Silva, o antecessor de Dilma, só negociava o pai de Marcelo, Emílio Odebrecht. O nome de código de Lula nas planilhas da empresa era "o amigo", precisamente por causa da relação próxima com o velho empresário.

As defesas dos principais implicados por Mascarenhas, como Lula, Dilma ou Santana, recusaram-se a comentar. Já os advogados de Temer preferem manifestar-se apenas após o fim das audições de todas as testemunhas da ação contra a dupla Dilma-Temer no TSE.

A ação foi interposta em dezembro de 2014 pelo Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB), cujo candidato Aécio Neves ficou em segundo lugar nas eleições de dois meses antes, com o intuito de derrubar Dilma e Temer por supostas irregularidades de campanha. Nesta fase do processo, que pode no limite levar à perda de mandato do atual presidente, pois a sua antecessora entretanto já foi destituída por impeachment em setembro do ano passado, o juiz Herman Benjamin ouve testemunhas. O mandato de Benjamin no TSE, porém, termina em outubro, o que pode levar à passagem de testemunho do processo para outro juiz e com isso adiar a sentença para lá do fim do governo liderado por Temer.

Curiosamente, o PSDB de Aécio é agora o maior dos aliados no governo de Temer, o político que a ação no TSE pode derrubar.

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