Diferenças de género no trabalho dão Nobel
A norte-americana Claudia Goldin foi laureada com o Prémio Nobel da Economia aos 77 anos, tornando-se na terceira mulher galardoada entre os já 93 distinguidos em ciências económicas. Por ter descoberto os principais fatores das diferenças de género em contexto laboral e por "ter avançado a compreensão dos resultados das mulheres no mercado de trabalho" - afirma a Academia Real das Ciências da Suécia -, a professora de Economia em Harvard e codiretora do Grupo de Estudos de Género na Economia do National Bureau of Economic Research, conquistou o formalmente conhecido Sveriges Riksbank de Ciências Económicas em Memória de Alfred Nobel, que lhe vale uma medalha de ouro de 18 quilates, um diploma e o montante de 11 milhões de coroas suecas, o equivalente a um milhão de dólares.
A investigação levada a cabo por Goldin, que recolheu mais de 200 anos de dados relativos aos Estados Unidos da América (EUA), permitiu traçar a primeira descrição "exaustiva" sobre os rendimentos das mulheres e a sua participação no mercado de trabalho ao longo dos séculos. O que precipitou mudanças, mas também as principais causas da diferença de género que ainda subsistem, são fatores agora mais claros graças ao trabalho da professora.
As conclusões mostram que a participação feminina no mercado laboral não registou uma tendência ascendente ao longo do tempo, mas antes uma curva em forma de U, com a intervenção das mulheres casadas a diminuir na transição da realidade agrária para a industrial do início do século XIX.
Com o crescimento do setor de serviços, em princípios do século XX, a participação das mulheres aumentou, resultado de mudanças estruturais e da evolução da sociedade no que respeita ao papel feminino em casa e no seio da família. Ainda assim, e apesar da modernização, as disparidades de género no mercado de trabalho, nomeadamente no que diz respeito à remuneração, ainda persistem.
"De certa forma, há um lado bastante irónico e simbólico no facto de o comité Nobel resolver dar este prémio a Claudia Goldin quando ela tem precisamente este trabalho muito importante acerca da participação das mulheres no mercado de trabalho", comenta Susana Peralta, professora da Nova School of Business and Economics (Nova SBE), a propósito de Goldin ser apenas a terceira mulher galardoada com um Nobel em Economia.
De referir que a norte-americana foi, na verdade, a primeira mulher a receber o prémio a solo, depois das antecessoras Elinor Ostrom (2009) e Esther Duflo (2019), terem sido premiadas com o Nobel por trabalhos realizados em conjunto com outros colegas.
Ainda assim, e não obstante o simbolismo identificado, o impacto a curto-prazo na vida de outras mulheres cientistas, "muitas vezes relegadas para segundo plano", não será, provavelmente, "estrondoso", explica a professora. No entanto, sublinha, "é extraordinário o reconhecimento do papel de uma cientista que faz verdadeiras contribuições nestes domínios".
Referindo-se à investigação em concreto, explica ainda que a professora norte-americana identifica, a partir dos anos 70, a fase em que a participação da mulher no mercado de trabalho já não se faz numa perspetiva de "ganha-pão secundário de um agregado familiar".
Em vez disso, esta fase evolucionária identificada pela agora Nobel da Economia, mostra uma mulher que entra no mercado para construir carreira, fazendo isso também parte da própria construção identitária da mulher. A pílula contracetiva e o casamento mais tardio foram dois dos fatores que Goldin identificou como contributos para a libertação da mulher da economia familiar e para o seu assumir de um papel na sociedade através da participação no mercado laboral.
Susana Peralta, que se refere a Goldin como historiadora económica, sublinha ainda a "perspetiva de longo-prazo" da norte-americana, que na sua investigação identifica questões como a disparidade salarial, mas também a importância da maternidade, que leva a que as mulheres sofram "penalizações profissionais".
De facto, e apesar de as diferenças de rendimento entre homens e mulheres poderem ser explicadas por diferenças na educação e nas escolhas profissionais, a pesquisa de Claudia Goldin demonstrou que grande parte das desigualdades remuneratórias se verificam, atualmente, entre mulheres e homens que exercem exatamente a mesma profissão, disparidades que se acentuam particularmente com o nascimento do primeiro filho.
Também sobre a investigação da professora de Harvard, o presidente da Comissão do Prémio em Ciências Económicas, Jakob Svensson, afirmou que compreender o papel das mulheres no mercado de trabalho é "importante para a sociedade", e que "graças à investigação pioneira" de Claudia Goldin, sabe-se agora muito mais sobre os fatores subjacentes e sobre quais as "barreiras que poderão ter de ser ultrapassadas no futuro".
O prémio de Economia foi criado pelo banco central da Suécia, em 1968, e foi o último Nobel a ser conhecido depois do anúncio dos vencedores das categorias de Medicina, Física, Química, Literatura e Paz. As cerimónias oficiais de entrega dos prémios decorrerá em Oslo e Estocolmo, no mês de dezembro.