Despesa fiscal com faturas e estrangeiros custou mais, mas Estado saiu a ganhar
Pedir faturas nos restaurantes, oficinas e cabeleireiros dá um bónus no IRS desde 2013. Mas foi em 2016 que o efeito desta benesse fiscal foi mais sentido. De tal forma que o Estado devolveu mais 19 milhões de euros às famílias do que esperava. A forte adesão dos estrangeiros ao regime dos residentes não habituais (RNH) também excedeu as estimativas de despesa fiscal em 37 milhões. Ao todo são 56 milhões. Apesar do custo destes benefícios na receita do IRS, ambos têm um efeito positivo nos ganhos de outros impostos, sobretudo no IVA.
O sistema fiscal contempla vários benefícios fiscais e a sua utilização por parte dos contribuintes é oficialmente designada por despesa fiscal. No caso do IRS, esta despesa (ou seja, aquilo que o Estado deixa de cobrar) foi avaliada em 574 milhões de euros em 2016. Foram mais 46 milhões de euros do que em 2016 e este acréscimo leva o Tribunal de Contas, no seu parecer à Conta Geral do Estado de 2016, a detalhar os motivos da "insuficiente contabilização da despesa fiscal".
Entre estes motivos está a forte adesão ao RNH (dirigido a pessoas que não foram residentes fiscais em Portugal nos cinco anos anteriores). Este regime, atribuído por dez anos, permite aos trabalhadores pagar uma taxa de 20% de IRS e isenta deste imposto os reformados estrangeiros. Esta particularidade fez crescer o número de pedidos de adesão - em 2016 aumentou em 66% e levou a que o ano fechasse com 10 684 beneficiários. Traduzindo em euros, este interesse no RNH acabou por custar mais 37 milhões de euros (ou mais 26,3% do que o esperado). Não há dados sobre o retorno da medida, ou seja, a receita fiscal que o Estado acaba por arrecadar a mais apenas porque estas pessoas vieram residir para Portugal, mas os fiscalistas e consultoras não têm dúvidas de que o saldo é positivo para o país.
Também a parcela do IVA (15%) que os contribuintes podem abater ao seu IRS em determinadas compras e gastos teve em 2016 um acréscimo significativo. Tudo porque, segundo a informação disponibilizada ao Tribunal de Contas, aumentou em 49% o número de famílias beneficiárias.
Este benefício foi criado em 2013 e para se ser por ele contemplado é necessário ir pedindo faturas em restaurantes, oficinas, cabeleireiros e (desde 2016) despesas com atividades veterinárias. Além disto é preciso que o consumidor peça para o seu NIF ser adicionado à fatura. Em 2016, o fisco recebeu 1,1 mil milhões destas faturas (uma subida de 13,6%). Resultado: em vez de 48 milhões de euros, este benefício devolveu aos contribuintes 67 milhões em IRS. Mas também aqui o acréscimo da receita em sede de IVA que o Estado arrecada por via de um maior controlo das faturas acaba por compensar a despesa. No ano em que o Fatura da Sorte foi lançado, o Ministério das Finanças estimava que o impacto desta medida, somado ao benefício em sede de IVA e ao novo sistema de comunicação de faturas, iria aumentar a receita do IVA em mais 600 a 800 milhões.
É habitual o parecer da Conta Geral do Estado ter uma parte dedicada a explicar os motivos e a contabilizar os efeitos da quantificação insuficiente da despesa fiscal. E as estimativas inseridas no Orçamento de 2017 arriscam a estar, de novo, subavaliadas, já que apontam para uma perda de receita de 572 milhões de euros no IRS.
O IRS é, ainda assim, uma pequena fatia do volume global despesa fiscal que, em 2016, ascendeu a 2,54 mil milhões de euros. As maiores beneficiárias foram as empresas, através de isenções e deduções em sede de IVA, IRC e muitos outros impostos. A isto há ainda a somar as isenções de IMI.