Descida do IVA na eletricidade só chega à fatura em abril

O governo quer baixar de 23% para 6% o IVA da potência contratada e pediu autorização a Bruxelas. A poupança ainda não chegou à conta da luz dos portugueses mas já está avaliada em 85 cêntimos por mês (mercado regulado). Anualmente são menos dez euros.
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O Ministério das Finanças garante que já enviou o pedido para Bruxelas: pode o governo português, tal como prometeu, descer a taxa de IVA que diz respeito apenas ao termo fixo (à potência contratada) na fatura da eletricidade da taxa máxima de 23% para a taxa mínima de 6%? A pergunta está feita, falta a resposta, seja ela positiva ou negativa. "No Orçamento do Estado consta uma autorização legislativa que prevê uma consulta prévia ao Comité de IVA da UE, tendo o pedido sido já remetido a este comité", disse fonte oficial do gabinete de Mário Centeno, acrescentando que a bola está neste momento do lado deste comité da Comissão Europeia.

A mais de 2000 quilómetros de distância, fontes da União Europeia confirmaram ao DN/Dinheiro Vivo que já deu entrada este pedido por parte do governo português, mas avisam que o prazo de decisão varia muito. De acordo com as regras do Comité de IVA, a partir do momento em que é registado o pedido de consulta, Portugal poderá decidir avançar com a implementação da mudança da taxa de IVA.

Mas, se já era bastante expectável que em janeiro este desconto não seria ainda aplicado, resta agora saber quando poderá chegar a descida parcial do IVA à conta da luz dos portugueses? De acordo com especialistas ouvidos pelo DN/Dinheiro Vivo, o mês de abril será a data mais provável, mas admitem que também pode resvalar para o início do terceiro trimestre, em julho.

Até agora, a redução no preço por via desta alteração no IVA calcula-se em 85 cêntimos por mês para quem esteja no mercado regulado, de 6,15 para 5,3 euros. Já anualmente são cerca de dez euros. Já a consultora Deloitte diz que são "menos de dois euros por agregado familiar". No mercado liberalizado estes valores podem variar porque cada empresa é livre de cobrar valores diferentes pelas várias potências contratadas

Seja no mercado livre ou no regulado, o ministro do Ambiente e da Transição Energética, Matos Fernandes, já apelou repetidamente às famílias para mudarem a sua potência contratada para 3,45 kVA (a mesma que tem em sua casa, garante) para terem acesso a este desconto adicional. É que quem opte por uma potência contratada mais elevada (6,6 kVA) vai continuar a suportar o IVA a 23%.

Resposta da Comissão

Quanto tempo pode então demorar o Comité da UE a responder a Centeno? Afonso Machado Arnaldo, especialista em IVA da consultora Deloitte, garante que "poderá tomar a decisão em um ou dois meses, não sendo de esperar uma resposta negativa. De qualquer forma, não sei se o governo já solicitou essa autorização". Depois disso, explica, "uma vez que já está autorizado pela lei do OE 2019, caberá ao governo legislar, em decreto-lei, uma alteração ao Código do IVA, no sentido de introduzir a alteração". E deixa um alerta: "Esta autorização do OE 2109 para que o governo legisle neste sentido é apenas válida para 2019."

E embora não estejam obrigados a isso, salienta ainda, "normalmente os governos tentam que as alterações nas taxas do IVA entrem em vigor no início dos trimestres (por uma questão de facilidade de reporte). Nesse sentido, a minha expectativa é que entre em vigor a 1 de abril ou a 1 de julho. Dependerá de quão adiantado esteja o processo em Bruxelas. O processo em Portugal será relativamente rápido. Em conclusão, entendo que ainda estamos a tempo de ter a alteração em vigor no dia 1 de abril".

Hugo Salgueirinho Maia, especialista em IVA da consultora PwC, confirma o cenário: "Assim que o Comité do IVA emita parecer positivo, para que se efetive a alteração prevista no OE sob a forma de autorização legislativa, será ainda necessário um processo legislativo interno, que culminará com a alteração do Código do IVA."

Enquanto isso, os consumidores não podem usufruir deste desconto (ainda que pequeno), que será aplicado apenas a quem tenha uma potência contratada de eletricidade até 3,45 kVA e consumos de gás natural em baixa pressão que não ultrapassem os 10 000 m³ anuais. De acordo com a Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos (ERSE), 3,45 kVA é a potência contratada pela maioria dos consumidores: 2,8 milhões de portugueses. Num pedido recente de simulações de preços de eletricidade ao regulador, o mesmo confirmou que os valores apresentados "incluem taxas e impostos mas não consideram ainda a recente redução do IVA, que carece de legislação complementar".

"Enquanto não for publicada uma revisão do Código de IVA, nada está em vigor. Houve o anúncio do governo, há a expectativa, mas ainda não está em vigor. Esperamos que seja no primeiro trimestre ou quadrimestre, semestre ou mesmo no ano de 2019. Entre anunciar e o reflexo nas faturas dos portugueses vai uma grande distância de aprovações e aplicação da legislação", comentou ao DN/Dinheiro Vivo Pedro Silva, especialista em energia da Deco.

"Foi anunciado mas ainda não estão a sentir nada na fatura e continuam a pagar o IVA a 23%. Não sentiram em janeiro nem vão sentir em fevereiro. A descida não é para já imediata", rematou.

E, apesar de o Orçamento do Estado para 2019 referir a aplicação da taxa reduzida (6%) apenas à parte do montante certo devido pelo fornecimento de eletricidade e de gás natural e pago pela adesão às redes, e só até um certo limite, mantendo a taxa normal (23%) ao montante variável a pagar em função do consumo mensal, a verdade é que se trata apenas de uma autorização dada pela lei ao governo. O sim definitivo terá será sempre de vir de Bruxelas.

A obrigação de pedir autorização a Bruxelas prende-se com o facto de os produtos energéticos não constarem de uma lista anexa à Diretiva IVA de alterações que podem ser livremente adotadas pelos Estados membros sem necessidade de pedido de autorização prévia. "Foi este o motivo que levou o governo a não apresentar uma alteração imediata no OE 2019, mas antes uma autorização para se efetuar essa alteração [que apenas poderá ocorrer após autorização do Comité do IVA]", explica Afonso Machado Arnaldo, especialista em IVA da consultora Deloitte.

O analista da Deloitte sublinha que "esta possível opção de aplicação de duas taxas de IVA à energia elétrica e ao gás natural não é única na União Europeia, tendo-se o governo inspirado no caso francês, em que se aplica a taxa de 5,5% à componente fixa (independentemente da potência contratada) e 20% à componente variável de energia consumida". Desde 2011, qualquer Estado membro que queira aplicar uma taxa IVA reduzida à eletricidade tem forçosamente de consultar primeiro o Comité da UE. A Comissão Europeia apresentou uma proposta de reforma das regras do IVA para que todos os Estados membros possam ter mais liberdade e decidir mais livremente. No entanto, é necessária uma decisão unânime da EU para que esta reforma passe a lei.

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