"Deploro o tempo de negócio em que nos mergulharam, que nos retira o direito ao ócio"
A sua virtude preferida?
O ouvido.
A qualidade que mais aprecia num homem?
O talento.
A qualidade que mais aprecia numa mulher?
O talento.
O que aprecia mais nos seus amigos?
Disponibilidade para ouvir, para falar ou para estar em silêncio.
O seu principal defeito?
Pouca resistência à tentação.
A sua ocupação preferida?
Compor.
Qual é a sua ideia de "felicidade perfeita"?
Caminhar à beira-Tejo, com sol, ou viajar em estradas secundárias pelo interior de Portugal, com chuva.
Um desgosto?
Perder uma ideia que estava na ponta da língua.
O que é que gostaria de ser?
Compositor com direito à preguiça. Deploro o tempo de negócio em que nos mergulharam, que nos retira o direito ao ócio e nos transforma, à viva força, em potros de competição dispostos em linha de montagem.
Em que país gostaria de viver?
Renúncia expressa de qualquer outro país. Começo a bocejar no preciso momento em que deixo o espaço aéreo de Portugal. Enfadado, só retorno à tranquilidade quando volto a pedir uma bica curta numa esplanada alfacinha, tripeira ou brigantina, tanto dá, com um coreto em Si bemol à minha frente.
A cor preferida?
A do Maio florido.
A flor de que gosta?
Angélica.
O pássaro que prefere?
Rouxinol na noite de Abril, a carriça na alvorada, o tordo no crepúsculo de Dezembro. O melro, primo do tordo? Esse, sempre.
O autor preferido em prosa?
Camilo.
Poetas preferidos?
Pessanha, Pascoaes.
O seu herói da ficção?
Davis, jurado número 8 em "12 Angry Men"
Heroínas favoritas na ficção?
Viridiana.
Os heróis da vida real?
Meus pais, meus irmãos, minha mulher e meus filhos.
As heroínas históricas?
Rainhas de Inglaterra, não, de certeza. Prefiro rainhas da vida real. Ocorrem-me duas senhoras sem direito a pompa, circunstância e toda a sorte de protocolos ajaezados, apenas no exercício do direito de resposta: Rita Machado, filha do escritor Dinis Machado (autor de "O que diz Molero"), na forma como acertou o passo a António Lobo Antunes ao defender a memória de seu pai e demais antepassados já falecidos. A dignidade da sua resposta é solar e sonora como um sino de bronze, a lembrar o tiro certeiro de David na testa de Golias. A outra heroína é uma leitora anónima de Setúbal que respondeu de forma mortal a Maria Filomena Mónica. A socióloga afirmara num dado artigo que "havia três pessoas cultas em Portugal, se tanto." A leitora confirmou na semana seguinte àquela publicação que eram mesmo três, sem qualquer dúvida. E enumerou-as: "Uma das pessoas cultas é a Drª Maria Filomena Mónica, pois claro. A segunda pessoa culta é o Dr. António Barreto, seu marido. E a terceira pessoa culta sou eu, evidentemente."
Os pintores preferidos?
Rego, Souza-Cardoso, Turner, El Greco, Parmigianino, Mantegna.
Compositores preferidos?
Pedro Faria Gomes, Lopes-Graça, Poulenc, Ravel, Debussy, Bach.
Os seus nomes preferidos?
Amélia e António.
O que detesta acima de tudo?
Pedantismo de queixo altivo, e, citando Debussy no seu questionário Proust de 16 de Fevereiro de 1889, les femmes trop belles.
A personagem histórica que mais despreza?
Frei Tomás de Torquemada, a representar todos os seres sinistros respaldados no poder instituído que, com base em efabulações e toda a sorte de banhas da cobra, se arrogam à autoridade moral de julgar os outros, apoucando-os, censurando-os, prendendo-os, torturando-os, assassinando-os.
O feito militar que mais admira?
Bafordo de Valdevez.
O dom da natureza que gostaria de ter?
Renovar-me e remoçar todas as primaveras como o freixo.
Como gostaria de morrer?
A rir.
Estado de espírito atual?
A sorrir.
Os erros que lhe inspiram maior indulgência?
Todo e qualquer desvio das linhas estéticas que vão bolçando da boquinha mimada e burguesa dos tempos que correm.
A sua divisa?
"Escreve música. Deixa lá a história".