Demónios à solta no Coliseu de Lisboa

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Demónios à solta no Coliseu de Lisboa

Concerto dos Moonspell encheu a centenária sala de espectáculos

Quem passasse junto ao Coliseu de Lisboa na noite de 31 de Outubro, podia pensar que aquela multidão se tinha mascarado toda de preto apenas para festejar o Halloween. Mas para os fãs dos Moonspell é Noite das Bruxas todo o ano.

Logo à entrada, um adolescente de botas da tropa e com a cabeça rapada pintada de branco - à laia do tio da família Addams - passeava-se por entre o público, que aproveitava o tempo antes do primeiro concerto para beber umas cervejas. Logo atrás, uma mulher enorme exibia uma tatuagem com caveiras que lhe ia do ombro até ao cotovelo. Pouco depois chegava o "diabo": um jovem de 18 anos, com quase dois metros e a cara pintada de vermelho, exibia uns chifres no alto da cabeça. O "príncipe das trevas" aproveita para se pavonear com um ar felicíssimo, ao sentir-se o centro das atenções.

Mas afinal o que leva alguém a gostar de heavy metal e destes concertos tidos como violentos? Coisa de miúdos, dirão muitos. João António tem 30 anos e já não se considera propriamente um rapazinho, portanto o que o "atrai no metal é mesmo a qualidade musical". A explicação para outros passa por este ser um género adequado para pessoas violentas. Jorge Morgado, 27 anos, apesar de "metaleiro", defini-se como uma pessoa calma, de esquerda, que até vê no mosh- um tipo de dança, em que a audiência se empurra ou pontapeia - uma demonstração de camaradagem pois, "por exemplo, numa roda, se alguém cai, é logo levantado".

Enquanto a conversa decorre, os Kalashnikov sobem ao palco. A música da banda do cómico Jel é uma caricatura dela própria, bem servida por refrões apocalípticos e politicamente incorrectos, como é o caso de "Tiananmen, kill another yellow man" (mata outro homem amarelo).

Para a maioria das pessoas, são estas letras e a dureza das músicas que fazem do metal um género maldito, "que não passa de barulho". Miguel Almeida está a concluir um mestrado em Ciências Musicais e discorda completamente deste preconceito. "Grande parte destes músicos têm uma óptima formação técnica e tanto conseguem tocar numa banda de metal como noutra de jazz". No bar, um rapaz de óculos muito graduados explica à assistência as razões porque se considera satânico, o que dá o mote perfeito ao início da actuação dos Root, uma banda que, apesar de checa, diz ter vindo directamente do Inferno. Estes veteranos, que influenciaram os próprios Moonspell, tocaram durante cerca de 50 minutos, num estilo que balança entre o black metal e o doom ou bandas como os Candlemass e os Celtic Frost.

Quem já não precisa de ser comparado com ninguém são os Moonspell. Às 23.00, já com o Coliseu quase cheio, a banda portuguesa iniciou um concerto que o vocalista Fernando Ribeiro haveria de considerar "especial e inesquecível". Depois de quase duas horas de concerto, houve ainda tempo para tocar Vampiria, com direito a dedicatória especial a todos os possíveis vampiros na audiência. E, na verdade, o chamamento teve muitas respostas.

A noite acabou em transe colectivo ao som de Full Moon Madness, já depois de Fernando Ribeiro pedir a ajuda do público para evocar Lúcifer, através das mãos levantadas em forma de chifres. Perto das duas da manhã, todos saíam felizes do Coliseu. Mas sem grandes sorrisos, como convém a um gótico.

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