Houve um tempo em que comer leite condensado era um acto sublime, cometido sem culpa nem remorso – sentimentos imprescindíveis à conquista da maturidade, dizem. No pódio das alegrias gastronómicas da infância, hoje revestidas de uma extraordinária simplicidade, o leite condensado Nestlé ocupa um dos lugares cimeiros, talvez mesmo o primeiro lugar. Entre outras coisas, porque implicava um confronto com a supremacia dos adultos e a certeza de que, como sempre, eram eles a ditar as regras. Podíamos atacar a lata de Milo ou a embalagem de Tulicreme sem deixar vestígios no local do crime, gozando o prazer da impunidade. Porém, como abrir uma lata de leite condensado sem passar pela dupla humilhação de pedir a ajuda dos adultos, seguida de um «não» esmagador? Porque saboreado com o privilégio de quem recebe favores dos deuses, o leite condensado Nestlé representou, para várias gerações, a sobremesa perfeita. E, num mundo ideal, o almoço, o lanche e o jantar perfeitos. «As crianças apreciam estas guloseimas; este livrinho, portanto, apresenta algumas receitas especialmente a elas destinadas», lê-se, na relíquia impressa dos anos 1950 reproduzida nesta página. Eis uma: «Barrar uma fatia de pão com uma fina camada de leite condensado açucarado Nestlé». Fácil, não?O método de evaporar a água do leite e acrescentar-lhe açúcar foi experimentado muitas vezes, mas quem ficou para a História como o inventor do leite condensado foi o norte-americano Gail Borden Jr., em 1876. Já se levantaram estátuas por razões menores.