Decisões absurdas
1 Há quem se dedique ao estudo das decisões absurdas. Decisões absurdas não são necessariamente decisões erradas, ou decisões medíocres ou não decisões. Decisões absurdas são as que geram resultados contrários aos objetivos iniciais, efeitos perversos, isto é exatamente opostos aos que eram esperados. Decisões absurdas têm estado na origem de desastres muito graves. A explosão da nave espacial Challenger, em 28 de janeiro de 1986, é um dos acontecimentos mais frequentemente apontados como caso extremo de desastre resultante de decisões absurdas. A nave espacial foi lançada apesar dos avisos e das recomendações em contrário por parte de engenheiros envolvidos no projeto. Nos minutos seguintes, perante o desastre, a pergunta era: como foi possível?
2 O estudo dos casos extremos, como o da Challenger, permite identificar e compreender aspetos pouco visíveis presentes em todos os processos correntes de decisão, na política, nas organizações e na vida quotidiana, que levam pessoas a fazer exatamente o oposto do que era esperado. Hoje, graças ao estudo das decisões absurdas, compreende-se melhor como falhas na partilha de conhecimento e informação, falhas de coordenação em projetos complexos e falhas na definição dos objetivos e finalidades da ação concorrem para a tomada de decisões absurdas geradoras de efeitos perversos e, muitas vezes, de desastres.
3 As decisões políticas tomadas no Reino Unido no último ano podem caber na definição de decisões absurdas e constituir-se como mais um caso de estudo. Há mais ou menos um ano, David Cameron concretizou a sua decisão absurda de realizar o referendo sobre o brexit. Esperava reforçar a sua legitimidade interna com a derrota dos seus parceiros eurocéticos, mas obteve um resultado exatamente oposto: a vitória dos eurocéticos. Alguns meses depois, Teresa May concretiza a decisão igualmente absurda de antecipação das eleições. Esperava reforçar o seu poder e legitimidade para enfrentar as negociações com a União Europeia, mas obteve o resultado contrário: a perda da maioria absoluta e um enfraquecimento da sua posição negocial no plano europeu.
4 Esperemos, agora, que nas instituições da União Europeia, os responsáveis pela negociação das condições de saída não tomem novas decisões absurdas geradoras de efeitos perversos desastrosos. Para que isso não aconteça é importante não descurar a informação e o conhecimento, a coordenação e a clareza nos objetivos que se pretendem alcançar. E é este último ponto que pode ser crítico. O que se pretende das negociações que formalmente se iniciaram esta semana: que o Reino Unido e a União Europeia se mantenham tão próximos quanto possível? Ou pelo contrário, que se afastem um do outro?
O Verão ainda agora começou
O dramatismo da situação que vivemos desde sábado passado, individual e coletivamente, as perdas humanas, o desespero e o horror das mortes, os sentimentos de impotência, de desgosto e de luto não nos podem dispensar de pensar racionalmente e de agir. Não podemos ficar parados à espera do próximo fogo. Da mesma forma que os que estão na linha da frente do combate aos incêndios não podem parar para chorar, exigindo-se que continuem a combater os fogos e a apoiar as vítimas, também nós temos de agir, racionalmente, fazendo tudo o que possa ser feito para impedir que volte a acontecer, noutro ponto do país, o que aconteceu em Pedrógão Grande.
O verão ainda agora começou. Temos pela frente a previsão de muitos mais dias, semanas e meses em que haverá a possibilidade de ocorrência de condições atmosféricas idênticas às registadas nos últimos dias. Existe uma probabilidade séria de novos acidentes, pelo que a sinalização de situação de emergência tem de se traduzir em ações consequentes.
É certo que não podemos fazer em dias ou semanas o que não fizemos em meses e anos. Não podemos alterar as condições estruturais do nosso território, mas há certamente coisas que podemos fazer, desde já. Para lá de todas as reformas na gestão da floresta, do apuramento de responsabilidades e de eventuais alterações nos sistemas de coordenação e comunicação, a fazer no futuro, é urgente pensar no curtíssimo prazo. Há, certamente, coisas que podem ser feitas pelo Estado central e pelas autarquias, bem como por outras instituições de proximidade, nos domínios da vigilância, da comunicação e da proteção das pessoas.
São urgentes medidas que nos permitam enfrentar o verão com mais segurança.