De preso político a político preso: Dirceu condenado a 23 anos
José Dirceu, do Partido dos Trabalhadores (PT), foi ontem condenado a 23 anos e três meses de prisão por corrupção passiva, lavagem de dinheiro e organização criminosa no Petrolão, esquema de corrupção em torno da Petrobras, investigado na Operação Lava-Jato da justiça federal brasileira. Detido desde agosto do ano passado na 17.ª fase da operação, batizada de Pixuleco por ser o termo usado pelo tesoureiro do PT João Vaccari Neto para se referir às comissões recebidas no escândalo, o antigo ministro chefe da Casa Civil de Lula da Silva foi condenado pela primeira vez no processo liderado pelo juiz Sergio Moro.
Moro determinou a condenação de mais dez pessoas, entre as quais o próprio Vaccari Neto, por corrupção passiva, a nove anos, e Luiz Eduardo de Oliveira Silva, irmão de Dirceu, a oito anos e nove meses por lavagem de dinheiro e organização criminosa. Os outros condenados são quadros da Petrobras, dirigentes das construtoras envolvidas no Petrolão e operacionais do esquema.
Dirceu já fora, em 2012, o mais mediático dos condenados do escândalo de compra de votos de parlamentares conhecido como Mensalão. A meio da pena de sete anos e 11 meses por corrupção passiva, o antigo presidente do PT passou a cumprir regime semi-aberto, com permissão para trabalhar fora da cadeia. Na sentença. Moro considerou "perturbador" o facto de Dirceu continuar a receber comissões do Petrolão enquanto decorria o julgamento do Mensalão.
Sonho de emigrar para Portugal
Quando em agosto foi detido pelo envolvimento na Lava-Jato, Dirceu viu o sonho de emigrar para Portugal adiado - talvez para sempre. Segundo a Folha de São Paulo, o ex-ministro de Lula ansiava mudar-se para Portugal já em 2016, quando pudesse beneficiar de um indulto concedido anualmente pela Presidência da República. Segundo o jornal, o antigo ministro-chefe da Casa Civil sentia que tinha as portas fechadas para viver e trabalhar no Brasil.
Estigma
José Dirceu passou de "preso político" na ditadura militar do Brasil, com toda a autoridade e romantismo que a condição confere, a "político preso" na sequência do escândalo do Mensalão, um estigma reforçado pela sua detenção e agora condenação na Lava-Jato.
O Petrolão estragou os planos de Dirceu de recuperar a sua força no PT e no país. Em janeiro deste ano, o ex-número dois do PT já se tinha reunido em sua casa com 30 deputados, sete senadores e forças políticas de diversos estados do Brasil para reentrar com força na vida pública como crítico interno de Dilma Rousseff, a mulher que após a divulgação do Mensalão lhe sucedeu no cargo de ministro-chefe da Casa Civil e, por consequência, no coração de Lula.
Até junho de 2005, quando foi acusado de ser o mentor do esquema do Mensalão e se demitiu, Dirceu era considerado o sucessor natural do ex-metalúrgico. Dessa data até 2013, ano da condenação, foi obrigado a viver à distância a reeleição de Lula e as duas vitórias presidenciais de Dilma.
Para um homem habituado aos holofotes não foi fácil. José Dirceu de Oliveira e Silva foi um destacado líder estudantil no final dos anos 60, em plena ditadura militar. Em 1969 foi solto, juntamente com outros 13 presos, em troca da libertação do embaixador americano no Brasil Charles Elbrick. Deportado para Cuba, só voltou ao país com nome falso, Carlos de Mello, e aparência diferente, após se submeter a uma cirurgia plástica.
Viveu na clandestinidade, escondendo a verdadeira identidade até da primeira mulher. Com a abertura do regime militar, em 1979, ajudou a fundar o PT, de que seria presidente, sob o patrocínio de Lula, de 1995 a 2002. A partir desse ano, com a chegada de Lula ao Planalto, assumiu a Casa Civil. Perdeu, no entanto, a autoridade e o romantismo do preso político que conseguiu pela via democrática chegar ao poder ao tornar-se, nos anos que se seguiram, um político preso.
São Paulo
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