DAVID DINIS: O último cromo

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A festa está a acabar. E deixará as saudades de sempre. Durante um mês, o futebol voltou a mostrar porque é a melhor imagem do mundo que temos. Vamos por partes?

Primeiro facto: os artistas brilharam pouco. A alma, a vontade do espírito, pode dar motivação, mas não dá vitórias. Em África, ganhou o futebol organizado - onde cada um sabe rigorosamente o seu papel. Podia aplicar-se a qualquer selecção, mas não foi o caso, por exemplo, da Argentina, a grande candidata à vitória. Resultado: caiu o mito. Ficará para a histó- ria da alma, como Ché Guevara.

Segundo facto: o capitalismo resistiu à crise. As selecções mais fortes são europeias, onde está o dinheiro, mas sobretudo a profissionalização do futebol. Alemanha, Espanha, Holanda, todas elas fizeram caminho até às meias. Espanha, de resto, é exemplarmente "capitalista": apostou tudo na organização e no sofrimento que colocou em campo. É a fórmula liberal desde Locke, com raízes em Darwin: a mão invisível premeia os mais fortes.

Terceiro facto: mesmo os mais fortes também perdem - sobretudo quando as lideranças falham. Veja-se o que aconteceu a Portugal, Inglaterra, Itália. Mas sobretudo de França. Noutros tempos, com outra voz de comando, seriam candidatos ao triunfo. Sem ela, acabaram embrulhados em greves, ameaças, comunicados, justificações, até revoltas.

Por fim, hoje, teremos a final. Verei o jogo com redobrado prazer, para colar o último e mais importante cromo na caderneta. Entre Xavi (bem pedi a Deus que nos tirasse o Xavi dos oitavos) e Sneijder teremos o homem-chave do mundial. Ali não há génios. Mas há trabalho do melhor. O prémio será sempre justo.

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