Depois da experiência de Gold, a peça criada em 2011 com a companhia moçambicana, o coreógrafo Rui Lopes Graça volta a África, novamente com a ajuda do músico João Lucas, desta vez para mergulhar na obra de Ruy Duarte Carvalho com a Companhia de Dança Contemporânea de Angola. Paisagens Propícias estreia-se hoje no Teatro Camões, Lisboa..A ideia para o espetáculo partiu de um desafio de Rute Magalhães, viúva do escritor, antropólogo, realizador e pintor angolano (1941-2001), ao grupo de dança que, por sua vez, convidou Lopes Graça. Em agosto, o coreógrafo e o músico viajaram até ao Namibe: "Estivemos a respirar o mesmo ar do Ruy, a seguir os mesmos trajetos, falámos com amigos dele. Foi lá que tudo começou." .Veja o vídeo sobre a criação do espetáculo:.[youtube:_5PbAs5bYYk].Finalmente, o trabalho com os intérpretes: "Os rapazes", como lhes chama Ana Clara Guerra Marques, a diretora da companhia, são sete e têm experiências distintas. Vêm de grupos de dança tradicional, são percussionistas, faziam "dança recreativa". Fizeram audições e juntaram-se a Ana Clara em 2008 para o projeto Oratura... dos Ogros e do Fantástico. "Para essa performance eu só precisava de rapazes e depois quando decidimos continuar acabaram por ficar só rapazes", explica a coreógrafa. ."Os rapazes" começaram a dançar já homens mas aprenderam depressa. "Eles não tinham formação nenhuma." Tiveram aulas de dança clássica e contemporânea, história da dança, ética, música, teatro, composição coreográfica. Veem tudo o que é possível ver em Angola e quando não é possível veem vídeos. "Insisto muito para que eles deem muito de si. O trabalho é muito baseado no que eles têm para dar e eles são surpreendentes", assegura Ana Clara. "São todos muito diferentes mas têm um corpo muito disponível e uma mente aberta, neste momento são capazes de trabalhar com criadores muito diferentes.".Rui Lopes Graça confirma: "Ninguém ensina a dançar em África". O coreógrafo explica que Paisagens Propícias não é um espetáculo "sobre" Ruy Duarte Carvalho mas "a partir" da sua vida e da sua obra e também "a partir" de tudo o resto, da experiência dos intérpretes e do olhar assumido de quem vem de fora: "Luanda tem o seu encanto mas é uma cidade cheia de contradições, é um estaleiro onde as pessoas podem facilmente levar três horas a chegar a um sítio. E nessa cidade vivem estas pessoas que dançam, isso é outra realidade." Ana Clara assegura que está lá tudo: "Está lá a forma de estar do Ruy, que era um a pessoa muito especial, o deserto, os pastores, os bois. Estão lá todos os elementos que identificam aquela região, mas com uma abordagem contemporânea.".Veja um excerto do espetáculo:.[youtube:j5uMYmna0No].Estão lá as contradições de um país, cuja economia está a crescer mais rapidamente do que a atenção dada à cultura: a estreia do espetáculo deveria ter acontecido em dezembro, em Luanda, mas teve que ser adiada devido ao risco de ruína de parte do edifício do teatro. Paisagens Propícias está então em Lisboa entre hoje e domingo, e irá depois a Cuba, Polónia, Israel, e "entretanto" há de ser apresentado em Angola, assim que terminem as pequenas obras no teatro. "Tem de ser apresentado lá", diz Ana Clara.