Da Bauhaus à Baukultur

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Ultimamente tem-se falado de novo muito da Bauhaus. Não exatamente a escola de referência, mas sim da new European Bauhaus, a nova Bauhaus que a Comissão Europeia vem associando às propostas de uma nova política e novos modos de vida que se pretendem mais inclusivos e sustentáveis, e a 8 e 9 deste mês foi este o tema de uma conferência organizada pela Ordem dos Arquitetos.

Apesar das muitas diferenças, tenta-se assim ligar a atualidade às preocupações dos que no início do século XX fundaram a Bauhaus com vontade de que ela fosse a génese de um outro tipo de sociedade.

Acontece, como todos bem sabemos, que ao longo destes pouco mais de cem anos o mundo mudou muito, e muitos dos problemas e das situações com que hoje nos confrontamos pouco têm que ver com aquela a que estes homens tiveram de responder.

E no entanto havia na sua abordagem, em 1919, numa Alemanha que saía de uma fase crítica, sem saber ainda que ia em breve entrar noutra ainda muito mais crítica, muito que podemos aproveitar para os dias de hoje, sobretudo naquilo que era a sua perspetiva e abordagem global dos assuntos, e da complexidade do que os preocupava.

Tratava-se então de uma proposta muito centrada na situação alemã e no ensino, ainda que a sua origem fosse muito mais remota e fortemente ligada à indústria, enquanto agora estamos confrontados com uma situação de dimensão global e repercussões planetárias.

É por isso que, na busca de uma referência capaz de sintetizar a situação com que hoje nos deparamos, o uso do termo Baukultur tem também sido adotado e aceite, ao longo das últimas décadas, como referência àquilo que é o entendimento holístico das múltiplas atividades envolvidas na mudança do ambiente natural.

Um termo que me parece adequado porque mais abrangente para referir toda uma visão dos especialistas ou do senso comum, das identidades e das diversidades culturais, do que o agora recuperado Bauhaus, mesmo que rebatizada como nova.

Isto apesar das limitações deste termo virtualmente intraduzível em qualquer outra língua, para além do germânico, apesar das várias tentativas e aproximações já feitas.

Não sendo um problema de semântica, todos sabemos a importância que têm as palavras e as referências simples, sobretudo quando a mensagem a transmitir é tão complexa como esta.

Será numa abordagem em termos de uma Baukultur, ou seja, numa visão necessariamente alargada, abrangente e holística de problemas que sabemos serem técnicos mas económicos; sociais, mas também políticos; culturais no mais amplo sentido deste conceito de cultura. Só num entendimento global destes processos é que poderemos encontrar respostas para as questões com que estamos confrontados.

Em 1919, tentou-se entender essa globalidade no campo das artes, explorando as relações entre as várias formas de expressão, construindo um ambiente de vida que foi politicamente esmagado. Compete-nos agora repensar simultaneamente passado, presente e futuro e pôr em causa grande parte das estruturas e das políticas do planeta onde vivemos e nos modos como continuamos a intervir e a consumir o ambiente natural.

Um planeta que sabemos não poder continuar a usar da mesma forma, numa altura em que já tomámos consciência de que não há planeta B.

Ex-presidente da Ordem dos Arquitetos

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