Um café custava 80 escudos e uma sandes pouco mais de cem. Para almoçar fora eram precisos quase dois contos e para ir ao cinema uma nota de 500 não era suficiente. Até que a 1 de janeiro de 2002 o dinheiro mudou de nome e de valor e uma ida ao supermercado passou a implicar muitas contas de cabeça..Com a entrada em circulação do euro foram muitos os comerciantes que adotaram a técnica de arredondamento dos preços. "Alertámos para o aumento brusco do custo de vida devido aos arredondamentos. Embora não se tenha verificado esse fenómeno nas grandes superfícies, nas lojas mais pequenas notou-se muito e era comum transformar cem escudos num euro. Claro que teve impacto na vida dos consumidores", lembra Paulo Fonseca, coordenador do departamento jurídico da Deco..Na realidade, o custo de vida aumentou mais do que os salários desde então. Por exemplo, o preço da bica subiu 50% em 15 anos, um bilhete de Metro aumentou 130% e um maço de tabaco 138%; o salário mínimo cresceu 52%, mas o rendimento médio disponível das famílias subiu pouco mais de 7 % (ver infografia)..Quinze anos e uma dolorosa crise financeira depois, o euro chega ao pico da adolescência debaixo de fogo cruzado e com traumas por resolver. "O euro foi um fator de destruição para a economia portuguesa, que deixou de ter instrumentos próprios para resolver as suas crises", considera Francisco Louçã, professor universitário. Para o ex-líder do Bloco de Esquerda, o euro foi benéfico para economias fortes, como a alemã, mas se mantiver o modelo atual, "é insustentável e não sobreviverá a outro crash financeiro"..Francisco Veloso prefere ver o copo meio cheio. "O euro veio trazer previsibilidade nas transações e em toda a circulação de moeda, pessoas e bens. Trouxe um nível significativo de conforto tanto para as famílias como para as empresas", destaca o diretor da Católica Lisbon School of Business and Economics. Ainda assim, reconhece as fragilidades que marcaram o processo de transição. "Deveriam ter sido logo introduzidos elementos complementares de coordenação económica, que não aconteceram à velocidade desejada, como se verificou mais tarde em países como Portugal e a Grécia." O economista diverge das vozes que proclamam que o fim da moeda está próximo. "É natural que haja forças políticas que defendam isso, mas estamos muito longe disso. Para mim não é claro que nos próximos dez anos uma economia como a grega não venha a equacionar de forma mais séria se quer ou não estar no euro, mas de forma geral acho que até vão existir outros países interessados em fazer parte da moeda única"..Também a Deco acredita que em 2032 estaremos a assinalar os 30 anos da zona euro. "Apesar de todas as tempestades, o que verificámos ao longo destes anos é que o euro foi muito positivo para a economia nacional. Estamos a falar de um poder de compra que não teríamos sem uma moeda tão forte", conclui Paulo Fonseca..Atualmente, segundo o Banco de Portugal, os portugueses ainda guardam em casa 155,8 milhões de euros em notas de escudo, quase 16 euros por cada português. A troca pode ser feita até 31 de dezembro de 2022, mas o mais provável é que fiquem guardadas para sempre na gaveta como recordação.