Cumprir a lei "é um caminho sem retorno"

O almirante Autoridade Marítima Nacional afirmou esta sexta-feira que "é um caminho sem retorno" cumprir-se a lei no que respeita à separação entre a Armada e o Sistema da Autoridade Marítima (SAM).
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"Foi a minha principal intenção, durante o meu mandato", fazer com que "a pouco e pouco, com segurança, firmeza e determinação, tudo aquilo que faltava fazer para que a legislação [do SAM], que existe basicamente desde 2002, pudesse ser posta em prática", sublinhou o almirante Saldanha Lopes, que também é chefe do Estado-Maior da Armada (CEMA).

Saldanha Lopes intervinha na cerimónia desta manhã, na Capitania do Porto de Lisboa, que assinalou o seu último dia como militar no ativo e coincide com o fim do mandato de CEMA e de AMN.

"O facto de estarem representadas aqui todas as áreas da Autoridade Marítima [...] foi justamente para que todos aqueles que servem na AMN pudessem estar cientes do trabalho que foi tentado desenvolver, se desenvolveu e que ainda não está terminado", referiu Saldanha Lopes.

"Quero deixar bem patente que este é um caminho sem retorno, que o meu substituto, quando for nomeado, tem de ter isto bem presente, que é a importância da AMN dentro do SAM que está consignado na lei", adiantou Saldanha Lopes.

O pacote legislativo do SAM foi criado em 2002 porque a Armada, enquanto ramo das Forças Armadas e à luz da Constituição e da lei, não podia exercer competências nem poderes de autoridade sobre civis em território nacional (a exemplo do que sucede na generalidade das democracias ocidentais) - exceto se decretado o estado de sítio pelos órgãos de soberania políticos.

O SAM é "o quadro institucional formado pelas entidades, órgãos ou serviços de nível central, regional ou local que, com funções de coordenação, executivas, consultivas ou policiais, exercem poderes de autoridade marítima".

A lei diz ainda que autoridade marítima é "o poder público a exercer nos espaços marítimos sob soberania ou jurisdição nacional, traduzido na execução dos actos do Estado, de procedimentos administrativos e de registo marítimo, que contribuam para a segurança da navegação, bem como no exercício de fiscalização e de polícia, tendentes ao cumprimento das leis e regulamentos aplicáveis nos espaços marítimos sob jurisdição nacional".

Esse poder de autoridade marítima, "no quadro do SAM e no âmbito das respectivas competências", só pode ser exercido pela AMN, Polícia Marítima, GNR, PSP, PJ, SEF, Direção-Geral das Pescas, Instituto da Água, Autoridade Nacional de Controlo do Tráfego Marítimo, Instituto Portuário e dos Transportes Marítimos ou Direcção-Geral da Saúde.

Daqui decorre que a Marinha - como qualquer ramo das Forças Armadas - atua em apoio das forças e serviços de segurança ou outras autoridades civis em razão da matéria e do espaço (como faz quando participa em ações de fiscalização das pescas no Atântico norte).

Reside aqui a fratura interna entre quem, na Marinha, advoga o cumprimento da lei (invocando com rigor o modelo francês) e quem pretende manter inalterada uma realidade secular que o poder político - apesar das leis aprovadas e das sentenças judiciais - só começou a clarificar em finais de 2012.

Em finais de 2011, o então sub-CEMA escreveu no órgão oficial da Armada que a lei pode ter "efeitos corrosivos no espírito, provocar desvios comportamentais e perverter a vontade" dos membros das organizações públicas e privadas.

"A observação dos factos mostra que, em qualquer organização pública ou privada, a estratégia e a lei podem ter efeitos corrosivos no espírito, provocar desvios comportamentais e perverter a vontade dos seus membros, quando desligadas de uma doutrina que exprima, com verdade, a consciência pública e a tradição histórica sobre como deve cumprir a sua missão", escreveu então o contra-almirante Silva Ribeiro, agora diretor-geral do Instituto Hidrográfico.

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